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Ungulani para Agualusa: "Não pises os nossos calos!"

29 de outubro de 2024

Escritor Ungulani Ba Ka Khosa qualifica artigo de Agualusa como "insulto aos moçambicanos". Ungulani irrita-se por análise "sem profundidade" da realidade de Moçambique, país que o colega usa às vezes como "dormitório".

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José Eduardo Agualusa, Ungulani Ba Ka Khosa e Venâncio Mondlane
Foto: JUAN BOITES/Privat/Paul Alexandrian/IMAGO

Em causa está o candidato presidencial Venâncio Mondlane, o fenómeno político que está a revolucionar Moçambique no contexto eleitoral. O escritor luso-angolano José Eduardo Agualusa escreveu recentemente um artigo para um órgão de imprensa brasileiro intitulado "Um bolsonarista africano" em que, entre outras coisas, conecta o candidato às igrejas evangélicas e ao polémico ex-Presidente do Brasil, Jair Bolsonaro.

A entendida desqualificação do político mais badalado de Moçambique revoltou Ungulani Ba Ka Khosa, um dos maiores escritores moçambicanos e um dos maiores autores africanos do século XX. Para Ungulani não há dúvidas que se trata de uma tentativa de assassinato de caráter de Mondlane e de uma desvalorização de todo o trabalho do candidato enquanto deputado no Parlamento.

Indigna também ao escritor moçambicano o facto de Agualusa "falar do país mais para fora do que para dentro". Depois da resposta "Basta, Agualusa!" na sua página no Facebook ao colega de escrita angolano, Ungulani rematou: "Já não me preocupo com ele".

DW África: O que o revoltou no "Um bolsonarista africano" de Agualusa?

Ungulani Ba Ka Khosa (UK): O que me revoltou não é tanto uma pessoa estrangeira a fazer análise do país onde eu vivo, aqui não há xenofobia nenhuma, mas é o facto dessa mesma pessoa, que tem estado aqui em Moçambique e que faz deste país por vezes um dormitório, falar do país mais para fora do que para dentro, e muitas das vezes em análises precipitadas.

Este é um país onde estamos num processo eleitoral, onde as crises se vêm arrastando há tempos e, de repente, chama [a Venâncio Mondlane] "populista" e de outra vez chama "bolsonarista", quer dizer, epítetos que levam ao extremo numa altura em que 63% da população de Moçambique tem menos de 35 anos de idade, e essa população desempregada - com grandes problemas de trabalho, de se reencontrar na vida - encontra em alguém [Mondlane] algo que possa levar a mudança.

[Mas Agualusa] faz uma análise que seria precipitada e sem saber com profundidade a realidade em que a gente vive, isso é que me irritou.

Venâncio Mondlane, candidato presidencial nas eleições de outubro de 2024
Há duas semanas, Agualusa acusou também Venâncio Mondlane (foto) de "pouca maturidade democrática" por proclamar a vitória antes de se conhecerem os resultados definitivosFoto: Cristiane Vieira Teixeira/DW

DW África: Vê um esforço do Agualusa em "assassinar o caráter" a Venâncio Mondlane ao casá-lo com Jair Bolsonaro e igrejas evangélicas?

UK: Por um lado, a leitura que eu faço é nesse sentido, pois ele [cita] o facto de ele ser religioso, e isso não tem nada a ver, muito mais num país como este onde os campos ideológicos praticamente se esbateram. Já tivemos uma experiência de orientação marxista que falhou, temos esta experiência neoliberal que está aqui e está a falhar redondamente, e as pessoas querem se reencontrar nalguma mudança.

Eu acho que, mais do que o assassínio de carácter de Mondlane, é um insulto a inteligência de todos nós moçambicanos, aos analistas políticos e a todos outros que têm falado de Mondlane como alguém da oposição, que tem feito o seu trabalho, já esteve no Parlamento e teve intervenções brilhantes e bem estudadas ao nível parlamentar. [Mas] vem alguém e derruba tudo o que analistas, politólogos, académicos, sociólogos têm analisado [em relação] a situação deste país, e avança com epítetos. Mais do que assassinar o caratér dessa pessoa, isso é insultar a todos nós moçambicanos que estamos atentos a nossa realidade. 

DW África: Agualusa está a ser repudiado nas redes sociais pelo seu artigo e até acusado de seguir uma agenda "estranha". A seu ver, é apenas uma visão fora da corrente que deve ser aceite ou denuncia, de facto, agendas que não vão de encontro ao bem estar de Moçambique?

UK: Eu pura e simplesmente vejo o meu trabalho, o ato de revolta em relação a isso, já não estou preocupado com as agendas dele, nem no que ele está a pensar, pura e simplesmente. É o que digo no meu trabalho, "por favor, não pises os nossos calos". Deixem que nós os moçambicanos [resolvamos] e temos [gente] madura o suficiente, nesses mais de 40 anos, que tem analisado esta realidade, que eu tenho acompanhado com muita atenção. Eu acho que ele saiu da linha e eu já não me preocupo mais com ele.

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Nádia Issufo
Nádia Issufo Jornalista da DW África
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