Rússia alarga cooperação militar com países africanos
5 de junho de 2018A República Democrática do Congo (RDC), que durante muito tempo foi vista como aliada do Ocidente, está à procura de novos parceiros. Em 1999, foi acordado que a Rússia forneceria armas e equipamentos ao exército congolês, que também deveria treinar, de acordo com a emissora internacional francesa RFI. Mas, pelos vistos, o acordo nunca foi implementado. Agora, segundo a emissora, a RDC quer aconselhar o Parlamento a avançar com a implementação do acordo.
Em andamento está já a cooperação com a República Centro-Africana, para onde a Rússia deverá enviar armas, munições e instrutores militares. O Conselho de Segurança da ONU aprovou o acordo em dezembro.
Os dois países foram escolhidos deliberadamente, diz o especialista francês Roland Marchal. "As relações entre esses países e o ocidente são tensas. E talvez a Rússia tenha oportunidade de se estabelecer no terreno, ganhar influência e desenvolver algumas relações económicas", explica.
E a cooperação militar poderá ser apenas o começo. Especialistas acreditam que a Rússia quer fortalecer a sua própria indústria de armamento. De acordo com um estudo realizado pelo instituto de pesquisa britânico Chatham House, apesar de apenas 3% das exportações de armas russas serem para África, o continente é um mercado em crescimento.
Cooperação Maputo-Moscovo
Na semana passada, o ministro dos Negócios Estrangeiros de Moçambique, José Pacheco, encontrou-se com o seu homólogo russo, Sergei Lavrov. E anunciou que planeia assinar, no final do ano, um acordo com a petrolífera russa Rosneft para exploração de gás natural no norte de Moçambique.
"O projeto para desenvolvimento de campos [de exploração] de gás no Norte de Moçambique está agora sob discussão. O plano passa por assinar um acordo este ano e lançar o projeto de desenvolvimento de campos em Moçambique com a participação da Rosneft e da ExxonMobil", referiu o governante moçambicano durante uma visita oficial à Rússia, citado pela agência de informação russa TASS.
Maputo também está a discutir com Moscovo sobre o tipo de armas que irá receber, no âmbito de um acordo entre os dois países. A Rússia e Moçambique assinaram a 22 de dezembro de 2015 um acordo de cooperação na área da defesa para cinco anos - o documento abrange, em particular, o fornecimento e manutenção de armas.
Das armas aos recursos naturais?
A Rússia é o fornecedor mais importante de alguns países, lembra o especialista Paul Stronski, do centro de pesquisa norte-americano Carnegie Endowment for International Peace. "Para alguns países em África, é muito difícil obter armas ocidentais. Mas a Rússia não tem os mesmos critérios de alguns países ocidentais - não relaciona a venda de armas com a situação dos direitos humanos ou com os vários conflitos regionais nos quais os Estados estão envolvidos. E vê nisso uma oportunidade de alargar o mercado", lembra.
Mas os interesses russos deverão ir além das armas. A República Democrática do Congo tem muitos recursos naturais, como cobalto, ouro e diamantes. E a vizinha República Centro-Africana também exporta diamantes.
À luz dos acordos existentes, a Rússia está a explorar a possibilidade de usar os recursos naturais para benefício comum, disse em março o vice-diretor de Informação da Rússia, Artyom Kozhin. Para Moscovo, que tem algum conhecimento na área da mineração e na produção de petróleo, trata-se também de uma oportunidade de expandir o seu próprio setor.
"Seguro de vida" para regimes autoritários
Os acordos foram muito bem acolhidos localmente. A República Centro-Africana, um dos países mais pobres do mundo, está em crise desde 2013. Os conflitos entre milícias cristãs e muçulmanas continuam e o Governo do Presidente Faustin Archange Touadera tem pouca influência.
O Presidente congolês, Joseph Kabila, também pode estar interessado numa parceria com a Rússia. Kabila insiste em permanecer no poder e o Governo adia repetidamente a realização de eleições.
"Para os regimes que estão sob pressão, o relacionamento com a Rússia poderá ser uma espécie de seguro de vida. Ao darem as boas-vindas aos russos, a República Democrática do Congo e a República Centro-Africana aumentam o preço e podem negociar com os países ocidentais, para que sejam mais generosos se quiserem que a presença ou influência da Rússia diminua."
A estratégia vem dos tempos da Guerra Fria, embora muitos países africanos tenham já mudado de lado várias vezes, dependendo do apoio recebido.
Ninguém arrisca dizer se a presença da Rússia em África será a longo prazo. Mas de uma coisa os observadores estão certos: Moscovo quer aumentar a sua influência em África. Sinal claro disso foi a visita ao continente do chefe da diplomacia russa. Em março, Sergei Lavrov visitou seis países africanos: Angola, Etiópia, Moçambique, Namíbia e Zimbabué - todos antigos aliados da era soviética. E em breve deverá também visitar Cabo Verde, anunciou na semana passada o Governo da Praia.