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Moçambique: Apoio da Total pode levar a ingerência francesa?

9 de outubro de 2020

A francesa Total está a financiar as tropas de Moçambique na luta contra o terrorismo em Cabo Delgado, o que causa algum desconforto nos moçambicanos. Analistas advertem para a hipótese de ingerência do Governo em Paris.

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Frankreich Energie Firma Total
Foto: dapd

A petrolífera francesa Total assinou, em agosto, um acordo com o Governo moçambicano para dar apoio logístico às autoridades no combate aos insurgentes armados que atacam o norte de Moçambique. O facto está a ser criticado pela sociedade civil, que acusa os governantes em Maputo de estarem a privatizar o Estado e a segurança do país, o que pode pôr em causa a soberania nacional. 

"A Total primeiro comprometeu-se a responsabilizar-se pelos salários de um batalhão de fuzileiros navais em Cabo Delgado, o que é muito importante porque uma parte dessas forças queriam entrar em greve porque não tinham recebido os seus salários... Assim, a Total assumiu a responsabilidade dos seus salários e de ajudar com a logística, com o equipamento e com a formação desse pessoal", explica André Thomashausen, académico alemão.

Prof. Dr. Andre Thomashausen
André Thomashausen, académico alemãoFoto: Arquivo Pessoal

A ajuda da petrolífera francesa representa um alívio financeiro para as autoridades centrais. Já em julho, Moçambique procurou o apoio militar de França para dar resposta ao terrorismo em Cabo Delgado, província onde a Total detém negócios de exploração de gás. 

Segundo André Thomashausen, a França e as suas multinacionais mantêm uma relação quase "siamesa", o que significa que a atuação destas empresas se pode traduzir numa tentativa de ingerência política. Um exemplo disso é o caso do Gabão, onde Paris terá garantido a permanência dos Bongo no poder durante décadas, em troca de "facilidades" na exploração do petróleo. 

Será que Moçambique pode escapar a uma ação semelhante? 

Moçambique: Apoio da Total pode levar a ingerência francesa?

Calton Cadeado, especialista em paz e segurança, destaca que Moçambique goza de "uma diferença" face a outros estados na região: "Não dá o monopólio a ninguém em matéria de exploração de recursos estratégicos", assevera. "Hoje, a Total está aqui, mas é uma presença que não é monopolista, então isto pode eventualmente diminuir o engajamento da força francesa na zona", acrescenta.

"Não temos forças francesas estacionadas aqui, há uma força mínima na zona do Oceano Índico. Há elementos para acreditar que sim, que pode existir essa ingerência, mas também não", duvida o especialista.

Calton Cadeado recorda ainda que Moçambique, por não ter sido uma colónia francesa, escapa à sua influência, embora este país africano esteja na zona de interesse de França, que tem domínio sobre algumas ilhas no Índico. "Se amanhã acontecerem mais atrocidades e gente espancada até à morte e terrivelmente humilhada, a Total, que está a pagar os salários, poderá ser obrigada a explicar-se", adverte o analista.

Mosambik Calton Cadeado
Calton Cadeado, especialista em paz e segurançaFoto: Privat

O facto de França ter as suas ilhas mesmo em frente a Moçambique é uma vantagem muito grande para esse país europeu, na eventualidade de uma intervenção militar em Cabo Delgado. França poderia atuar a partir de Mayote, usando as suas bases militares aéreas, frisa o analista André Thomashausen. 

Já Calton Cadeado acredita que em caso de irregularidades numa eventual relação com França, Moçambique terá sempre o apoio dos "irmãos regionais" da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral  (SADC). "Não nos esqueçamos que a SADC está aqui e é muito contra essa ingerência de potências externas", salvaguarda o analista.

"Mesmo dividida ou com desentendimentos, quando se trata de uma entrada externa com muita força, a SADC pode unir-se e fazer diminuir o entusiasmo da intervenção de França. Não nos esqueçamos que na zona Ocidental de África, onde França tem esse protagonismo, também sofreu a pressão de países como a Nigéria e até de antigas colónias como o Senegal, que não viram com bons olhos" a ingerência desse país, conclui.

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Nádia Issufo
Nádia Issufo Jornalista da DW África
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