Investimentos mal feitos impedem fim da dependência do petróleo em Angola
10 de novembro de 2014Por causa da queda do preço do petróleo, o Orçamento Geral do Estado (OGE) será discutido no Parlamento angolano já na próxima semana. O objetivo é fazer contenções nas contas públicas.
António Sapalo é economista angolano e também secretário nacional para economia e finanças no Partido da Renovação Social (PRS). A DW África entrevistou-o sobre essa relação de dependência.
DW África: Em 2008 o mercado internacional registou baixas históricas no preço de petróleo, facto que deixou Angola na "corda bamba". De lá até hoje que medidas concretas foram tomadas pelo Governo?
António Sapalo (AS): As políticas e as medidas não têm sido tomadas com uma visão estratégica e numa base sustentável, mas sim numa base pontual tendo em conta as visões político-partidárias simplesmente visando a manutenção do poder. O dinheiro que vem das receitas do petróleo deveria ser usado em políticas de investimento, de modo a que a economia do país se diversifique e produza o suficiente, mas não é isso que tem acontecido.
DW África: Um país com um potencial agrícola e hidríco muito grande como Angola tem estratégias e políticas financeiras direcionadas para este setor ou pelo menos nos últimos anos o país traçou alguma coisa nesse sentido?
AS: Tem traçado, mas não numa visão sustentável. É que o desenvolvimento de um país tem a ver com fortes investimentos. Para além do desenvolvimento do próprio país isso contribui para a redução do desemprego, mas não é isso o que acontece. O que acontece é que há muitas pessoas que querem investir, mas apesar das suas capacidades, competências intelectuais e experiência, não conseguem obter financiamento do Estado. Só são financiadas determinadas pessoas simplesmente ligadas ao regime do MPLA [Movimento Popular de Libertação de Angola, no poder] e ao próprio Presidente José Eduardo dos Santos.
São aqueles que recebem dinheiro e cuja missão é o branqueamento da imagem do MPLA e de José Eduardo dos Santos. Esses conseguem financiamento. E mesmo conseguindo financiamento não conseguem realizar projetos que visam tirar, de facto, Angola da situação de dependência exclusiva do petróleo. Esse é que é o problema grave. Então, com a queda do preço do petróleo no mercado internacional, Angola vai viver várias dificuldades, porque há programas e projetos no OGE cuja materialização estará em causa porque as receitas do Estado simplesmente têm a ver com o petróleo.
DW África: O OGE vai ser discutido pelo Parlamento na próxima semana, tendo em conta a racionalidade das despesas públicas por causa da queda do preço do petróleo. Este é um indício de que, realmente, não houve até agora o devido esforço para se diminuir a dependência do petróleo?
AS: Certamente. O problema que acontece aqui em Angola é mais político-partidário. O OGE também contém rubricas invisíveis, há determinados beneficiários durante esses anos do dinheiro do Estado e que não são revelados. São entidades que não investem no desenvolvimento económico do país.
DW África: Caso o Governo insista nesta linha, quais são as consequências a longo prazo para o país?
AS: São consequências políticas e sociais que vão resultar numa crise política nacional. Neste momento Angola é um país com um índice de desemprego muito elevado e esse índice de desemprego simplesmente é omitido pela força política e administrativa do próprio regime. Nós temos um elevado número de angolanos sem emprego e com esta situação o problema ainda se agrava mais. O regime neste momento vai usar medidas coercivas para manter a situação estável - medidas administrativas coercivas, preventivas, intolerância política. Se os cidadãos se tentam manifestar, o regime põe outros serviços secretos na rua a raptar pessoas, a matar e a pô-las na cadeia. Por enquanto, ele vai usando esses mecanismos ditatoriais, mas a longo prazo a situação será incontrolável e vamos ver uma crise económica, social e política grave que terá consequências políticas também graves.