Hospital Central de Quelimane quer acabar com medos
19 de outubro de 2021Vários cidadãos dizem que tentam evitar o Hospital Central de Quelimane e somente buscam tratamento na unidade de saúde quando são mesmo forçados a um internamento.
Prestes a completar cinco anos, a fama do principal hospital da capital da Zambézia não é nada boa. Um dos cidadãos, sob condição de anonimato, disse à DW África que tem medo de ir ao hospital quando está doente por causa do que se fala sobre a instituição.
"Há informações de que havia máquinas [a ser usadas] sem a presença de profissionais especializados. Isto assustou muito em Quelimane. As pessoas têm medo de ir ao hospital, sabendo que não há profissionais qualificados para áreas disponíveis aos utentes", critica o morador da capital da Zambézia.
Boatos abalam reputação
Nos primeiros meses de funcionamento da instituição, surgiram boatos de que o número de óbitos no hospital era elevado. Isto acabou por assustar os populares, que preferiam evitar consultas e tratamentos.
Hoje, os receios quanto ao hospital também chegam ao nível da superstição. "Dizem que naquela área havia um cemitério, e os espíritos continuam a fazer o abate. O receio da morte ainda prevalece", relata Elísio Armando, outro morador de Quelimane.
Armando, entretanto, defende a existência do hospital e crê que é necessário que os utentes quebrem esta resistência. "A saúde, não se engana. Temos que ter coragem para irmos ao hospital", diz.
Jolito Paulino é outro morador de Quelimane que evita a unidade de saúde. Na sua opinião, o hospital tem mesmo problemas que levam insegurança à população.
"Você leva um doente em estado grave à noite. [Eles] obrigam o acompanhante a sair da sala. O doente fica lá a gritar, pedindo socorro, sem o agente de serviço ir lá saber o que está a acontecer. O doente acaba morrendo sem ter aquela assistência, é complicado", opina Paulino.
O utente diz que já testemunhou a situação de um paciente a sangrar e gritar sem ninguém para atendê-lo. "Vale a pena ir ao Hospital Geral, onde o acompanhante fica ao lado do doente, mas ao Hospital Central…", reclama.
O que é que diz o hospital?
Para o diretor do Hospital Central de Quelimane, Ladino Súade, a unidade hospitalar enfrenta vários desafios, entre os quais sensibilizar a população para interagir com a instituição.
Para Suade, a má fama é resultado de desinformação. O diretor diz que o hospital desenhou uma estratégia de interação com a comunidade.
"Nós fomos a vários bairros e povoados da província da Zambezia para explicar à população aquilo que são os objetivos e as funções do Hospital Central de Quelimane. Hoje sentimos que os doentes estão a afluir, estamos a ver populações que vieram aceder aos nossos serviços”, eplica Súade.
Para o historiador Bruno Mendia, o hospital enfrenta também um obstáculo cultural. Procurar serviços de saúde convencionais em caráter emergencial faz parte da cultura da população moçambicana. No entanto, nem todos buscam fazer consultas médicas preventivas e muitos sentem-se bem atendidos por médicos tradicionais.
"Um pouco de carinho"
Mendia acrescenta que a educação sanitária em Moçambique não leva a isso. "As pessoas sentem-se melhor atendidas por um curandeiro do que por um médico convencional. Isso deve-se a forma particularizada que o médico tradicional atende o paciente", diz.
Mendia lembra que o curandeiro prepara psicologicamente a pessoa. "Conversam contigo e dão um pouco de carinho, o que muitas vezes não acontece nas nossas unidades sanitárias", salienta.
No ano passado, um debate na Assembleia Autárquica abordou a alegada sobrelotação das morgues em Quelimane. Havia corpos não reclamados no local, e a maioria seria oriunda do Hospital Central de Quelimane. Em média, eram recolhidos 10 corpos por semana, provenientes da instituição de saúde, segundo as autoridades na autarquia de Quelimane.