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MédiaÁfrica

Como pode África libertar-se dos estereótipos negativos?

2 de novembro de 2024

A comunicação social destaca frequentemente o conflito, a pobreza e a corrupção em África. Mas há muito mais do que isto no continente africano. Uma ONG está a trabalhar para transformar essa narrativa.

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"Dancing in the Streets", uma foto do fotógrafo Brian Otieno
A foto de Brian Otieno "Dancing in the Streets" revela um lado diferente, poético e belo do quotidiano em Kibera, a maior favela de NairobiFoto: Brian Otieno/storitellah.com

Organizações de média internacionais muitas vezes perpetuam estereótipos ultrapassados sobre África, como corrupção, doenças, liderança deficiente, violência e pobreza, segundo Abimbola Ogundairo, responsável pela advocacia e campanhas da Africa No Filter, uma organização não governamental (ONG) que analisa as narrativas prejudiciais sobre o continente. 

Um estudo da Africa No Filter e da consultora Africa Practice revelou que estes retratos negativos criam uma visão monolítica do continente, deturpando as realidades diversificadas. 

Esta cobertura enviesada amplifica os riscos percebidos, aumentando os custos de empréstimos e desencorajando o investimento — especialmente durante as eleições, quando a ênfase em questões negativas, como violência e fraude eleitoral, é desproporcionalmente alta em comparação com riscos políticos semelhantes em países não africanos. 

A imagem de África e o risco económico 

"Quando uma história singular é contada ao longo do tempo, começa a reduzir a identidade de um lugar a apenas essa coisa", disse Ogundairo à DW. 

Por exemplo, 88% dos artigos de média sobre o Quénia durante os períodos eleitorais eram negativos, em comparação com apenas 48% sobre a Malásia durante as suas eleições. Como resultado, os investidores internacionais veem os países africanos como mais arriscados do que realmente são. 

Segundo o estudo, os mutuários africanos perdem até 4,2 mil milhões de dólares (3,9 mil milhões de euros) anualmente em pagamentos de juros dos seus empréstimos, principalmente devido a narrativas estereotipadas. 

Kristalina Georgieva em entrevista à DW em outubro de 2019
Kristalina Georgieva: "Acreditamos que África merece ser representada de forma mais justa"Foto: DW

O sentimento positivo dos média está correlacionado com um perfil de risco mais baixo e uma redução nos rendimentos das obrigações, enquanto a cobertura negativa aumenta o risco percebido de um país, levando a custos de empréstimos mais elevados. 

Ogundairo observou que os estereótiposfazem os credores acreditar que lidar com países africanos envolve um certo nível de risco. 

"Uma ênfase desproporcional nesses tipos de histórias leva à narrativa contínua de que, se quiser fazer negócios em África, precisa de estar preparado para perder dinheiro e, portanto, provavelmente, no momento em que empresta dinheiro, deve considerar isso para obter mais lucro", disse Ogundairo. 

A diretora-geral do Fundo Monetário Internacional (FMI), Kristalina Georgieva, disse recentemente à DW que África precisa de uma representação maior na entidade global de crédito. Nesse sentido, sugeriu acrescentar mais um membro do conselho da África subsaariana à direção do FMI. 

"Estamos a fazer isso exatamente porque acreditamos que África merece ser representada de forma mais justa", disse Georgieva. 

Combater os estereótipos 

A ousada campanha de turismo do Ruanda, "Visit Rwanda", tem utilizado o futebol para atrair investidores e turistas ao país. 

Campanha "Visit Rwanda" apoia o clube desportivo inglês Arsenal FC
Paul Kagame quer fazer do Ruanda um peso pesado africanoFoto: Jakub Porzycki/NurPhoto/picture alliance

A campanha fez parceria com o clube de futebol inglês Arsenal, o Paris Saint-Germain de França e a equipa alemã Bayern de Munique para divulgar as atrações e a herança cultural únicas do país. 

Embora o Presidente ruandês, Paul Kagame, tenha sido acusado de sportswashing — a prática de usar o desporto para melhorar a imagem de um país ou organização, investindo em eventos ou equipas desportivas de alto perfil para desviar a atenção de problemas internos — a campanha "Visit Rwanda" tem sido bem-sucedida em mudar a narrativa sobre o país da África Oriental. 

Chrispin Mwakideu, editor sénior da DW, afirmou que o Ruanda conseguiu vender o que é "real e tangível" através da campanha. 

A indústria cinematográfica da Nigéria, Nollywood, lidera a missão de contar histórias africanas autênticas, quebrando estereótipos. 

A Netflix juntou-se ao movimento, trazendo originais africanos como "Blood & Water” e "Queen Sono” para o palco mundial, contando "histórias locais com apelo global".

Fatima Alimohamed, CEO da agência de marketing e comunicação Africa Brand Warrior, disse à DW que é necessário ter a intenção de liderar a narração de histórias "para mostrar como realmente vivemos, como realmente pensamos". 

"A primeira responsabilidade é nossa, como africanos", defende. "Temos de contar a nossa história; só então, quando a contarmos, alguém poderá, sabe, acrescentar a essa história. Mas se deixarmos a narrativa para outra pessoa, é aí que surge o problema".

Soluções para o futuro 

Ogundairo destacou a importância de uma colaboração mais forte entre correspondentes locais e internacionais, sublinhando a necessidade de mais recursos, formação e parcerias no espaço mediático para impulsionar um desenvolvimento significativo. 

Ela instou os jornalistas a repensarem a forma como contam as suas histórias. 

"Quais são as vozes que enfatizo sempre que falo sobre África? Estou verdadeiramente a incluir os 54 países? Estou realmente a garantir que as vozes das várias demografias estão a ser representadas para que a imagem que as pessoas veem na minha história seja suficientemente completa?", afirmou, acrescentando que os líderes africanos devem exigir responsabilidade sobre como os seus países e povos são retratados. 

Alimohamed referiu ainda que é importante adotar uma abordagem de "resolução positiva de problemas" ao envolver-se com especialistas, destacando a importância de usar uma linguagem inclusiva. 

"Envolva pessoas que possam oferecer soluções em vez de continuar a insistir apenas nos problemas e na negatividade", terminou.