Área só para mulheres em trens divide opiniões na Alemanha
19 de abril de 2016Apesar da gentileza de muitos passageiros, o clima nem sempre é cordial e seguro nos trens alemães. Com a hashtag #imzugpassiert ("aconteceu no trem"), que ganhou força no Twitter nas últimas semanas, usuárias alemãs compartilham suas experiências de assédio em trens – de olhares e comentários impróprios ao assédio físico.
O clamor na mídia social veio em resposta aos compartimentos só para mulheres introduzidos pela companhia ferroviária privada alemã Mitteldeutsche Regiobahn (MRB), na linha entre as cidades de Leipzig e Chemnitz.
A MRB diz que o objetivo dessas cabines é aumentar a sensação de segurança entre as mulheres que viajam sozinhas ou com crianças pequenas. Idosos também estão autorizados a viajar nos dois compartimentos localizados no meio do trem, vizinhos à área de serviço. Segundo a MRB, "essa proximidade foi escolhida deliberadamente".
"Tolerância implícita"
No início deste ano, a segurança das mulheres alemãs ganhou as manchetes depois de a polícia ter recebido queixas de ataques sexuais a até 500 vítimas na noite de Ano Novo em Colônia.
A MRB afirma, no entanto, que a introdução dos compartimentos não é uma reação aos assédios sexuais na cidade, mas sim aos pedidos feitos por clientes no início de dezembro do ano passado, antes de os ataques acontecerem.
A medida polarizou opiniões. Políticos, o público em geral, especialistas em questões de gênero e associações de transporte têm diferentes pontos de vista sobre o assunto. Enquanto alguns elogiam a iniciativa, outros questionam a eficácia dos compartimentos separados.
Kristina Lunz, assessora da seção alemã da UN Women, Entidade das Nações Unidas para a Igualdade de Gêneros e o Empoderamento das Mulheres, censura a medida, afirmando que "em vez de punir os autores, o assédio a mulheres por homens estaria sendo implicitamente tolerado".
"Não precisamos de um compartimento para mulheres, mas somente da sensação de segurança, não importa onde estivermos", justifica Lunz.
O porta-voz da associação de transportes Verkehrsclub Deutschland, Simon Hüther, afirma que os compartimentos são tudo menos uma boa ideia. "Esta é a direção completamente errada a se tomar", disse à DW. "Separar os gêneros agora? Isso é algo do passado, de outro século. Não podemos simplesmente separar as mulheres."
Marco Böhme, deputado estadual na Assembleia Legislativa da Saxônia, também vê um compartimento para mulheres como "um passo em direção à Idade Média".
Medo após o anoitecer
Dentro dos trens, a história é diferente. A maioria das pessoas com quem a DW conversou apoia a ideia, mesmo que muitas das passageiras que ocupavam os compartimentos femininos tivessem entrado por acaso nas cabines separadas. Marcada somente por um adesivo azul que mostra uma mulher usando um vestido e as palavras "compartimento feminino", a área especifica é fácil de ignorar.
Entre as passageiras num dos compartimentos estava Leah, estudante de Comunicação Intercultural da cidade de Fulda. "Para ser honesta, só escolhi este assento porque estava vazio", disse à DW. "Sabia que tais cabines existiam nesta rota, mas não me dei conta de que estava numa delas."
A jovem de 21 anos afirmou apoiar a ideia, mas disse que, embora estivesse acompanhada naquele dia, sua decisão poderia ter sido diferente se ela estivesse viajando sozinha – "particularmente à noite".
"Estes vagões podem ser muito assustadores, especialmente quando se está sozinha", disse Leah. No entanto, ela admitiu que a ideia de separar-la de outros passageiros para aumentar a segurança seria uma "solução um pouco antiquada".
"Problema maior" a enfrentar
Jasmin, uma enfermeira de 35 anos que estava viajando com o filho de um ano e meio, também saudou a introdução de compartimentos só para mulheres.
"Acho que é uma boa ideia, especialmente em vagões antigos somente com cabines, sem compartimento aberto", disse. "É fácil dizer: 'relate qualquer assédio para o pessoal do trem'. Mas e se eles não estão lá quando você precisa? É um pouco antiquado, mas se me faz sentir mais segura, então, acho bom."
Na viagem de regresso a Leipzig, Bernd, de 62 anos, disse à DW que compreende a medida, mas que ela seria apenas uma solução de curto prazo.
"Se isso faz as passageiras se sentirem mais seguras, então, é claro que já se trata de um resultado positivo", afirmou Bernd. A existência de tais compartimentos o faria se sentir mais tranquilo se suas filhas estivessem viajando sozinhas, particularmente tarde da noite.
"Mas se há problemas reais em relação à segurança das mulheres ou de qualquer pessoas nos trens, estes precisam ser enfrentados", afirmou Bernd. "Não podemos colocar as mulheres num compartimento separado e esperar que o problema maior desapareça."