Zeitgeist: As polêmicas amizades de Gerhard Schröder
2 de novembro de 2017As recentes negociações para a libertação do ativista Peter Steudtner, que estava detido na Turquia sob a acusação de apoiar uma organização terrorista, chamaram a atenção da opinião pública alemã para mais uma relação pessoal dúbia do ex-chanceler federal Gerhard Schröder: a com o líder turco, Recep Tayyip Erdogan.
Segundo a imprensa alemã, Schröder teria viajado para a Turquia, onde se encontrou com Erdogan e intercedeu a favor de Steudtner, que surpreendentemente foi solto dias depois.
O encontro foi confirmado pelo ministro alemão do Exterior, Sigmar Gabriel, que agradeceu ao ex-chanceler. O governo turco negou qualquer influência, mas é presumível que esteja apenas interessado em manter as aparências em relação à combalida imagem de independência da Justiça do país.
Erdogan, que tem uma relação no mínimo complicada com a chanceler federal Angela Merkel, considera Schröder o último político alemão decente – se, vindo dele, isso é mesmo um elogio, é outra história. A boa imagem do ex-chanceler alemão junto ao líder turco vem dos tempos em que Schröder se empenhou pelo ingresso da Turquia na União Europeia. Merkel, no fundo, sempre foi contra.
A relação de Schröder e Erdogan é uma amizade que se pode chamar de problemática, mas ainda não é nada perto da relação de Schröder com Vladimir Putin e os russos. Há anos que o ex-chanceler federal alemão cultiva uma relação próxima com o chefe do Kremlin. Ele, que uma vez se referiu a Putin como um "democrata impecável”, já trabalhava para a gigante do gás Gazprom. Agora vai comandar também o conselho de administração da petrolífera Rosneft.
A petrolífera cresceu muito nas últimas décadas, principalmente depois da aquisição da falida rival Yukos, em meados dos anos 2000. Até falir, em circunstâncias suspeitas, a Yukos era controlada pelo então homem mais rico da Rússia, Mikhail Khodorkovsky, rival de Putin e que foi preso em 2003 (acabou solto em 2013, quando deixou o país).
A Rosneft atua também como braço da política externa do Kremlin, por exemplo na Venezuela, onde emprestou bilhões de dólares para a estatal petrolífera PDVSA, ou fechando acordos com os curdos iraquianos. Quando esteve em Moscou, há algumas semanas, em busca de mais dinheiro, o presidente Nicolás Maduro agradeceu a Putin pelo apoio "político e diplomático". O dinheiro que ele recebeu pode fazer a diferença para a sobrevivência do seu governo.
E, desde a crise na Ucrânia, a Rosneft está na lista de sanções dos Estados Unidos e da União Europeia, o que torna a eleição de Schröder para a chefia do conselho de administração da empresa ainda mais problemática e constrangedora para os alemães.
A petrolífera é comandada por Igor Setchin, um dos homens mais próximos de Putin e apontado por muitos observadores como o número 2 na Rússia. Setchin também é alvo de sanções econômicas, porém apenas pelos Estados Unidos.
O comportamento e as amizades de Schröder são sem igual entre os políticos de alto escalão na Alemanha. Muitos alemães se sentem constrangidos por um ex-chanceler federal estar a serviço de empresas russas.
Para o seu partido, o social-democrata SPD, ele é um incômodo constante. Durante a recente campanha eleitoral, quando sua indicação para a Rosneft foi anunciada, o então candidato Martin Schulz, disse que um chanceler federal emérito só pode se comportar como uma pessoa comum sob certas condições.
Schröder, claro, encara a questão de uma maneira totalmente diferente. "Trata-se da minha vida, e quem decide sobre ela sou eu e não a imprensa alemã", declarou.
A coluna Zeitgeist oferece informações de fundo com o objetivo de contextualizar temas da atualidade, permitindo ao leitor uma compreensão mais aprofundada das notícias que recebe no dia a dia.
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