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Um teste para a democracia espanhola

2 de outubro de 2017

Espanha enfrenta uma das maiores crises políticas das últimas décadas após referendo independentista na Catalunha. Governos em Madri e Barcelona avaliam próximos passos, em meio a temor de escalada de tensões.

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Protesto pela independência no dia seguinte ao referendo em Barcelona
Protesto pela independência no dia seguinte ao referendo em BarcelonaFoto: Reuters/A. Gea

A Espanha enfrenta uma de suas maiores crises políticas em décadas após Madri ter dado uma resposta desastrosa ao referendo separatista organizado pelo governo regional da Catalunha. Um dia após policiais enviados pelo governo federal terem tentado interromper com violência o pleito, que havia sido declarado ilegal pela Justiça, tanto Madri quanto Barcelona avaliam quais devem ser seus próximos passos.

Segundo o governo separatista da Catalunha, 90% dos eleitores que compareceram votaram pelo "sim". O número, porém, não representa a visão da maioria da população local, já que apenas 42% dos eleitores compareceram. Na prática, o referendo foi apenas uma ferramenta de propaganda.

Ainda assim, Barcelona está considerando os resultados suficientes e estuda enviá-los ao parlamento local nas próximas 48 horas e declarar independência de Madri de maneira unilateral na quarta-feira (02/10). O presidente da Catalunha, Carles Puigdemont, também pediu a retirada da região dos milhares de policiais enviados por Madri.

Último recurso

Como o governo espanhol não considerou nem mesmo o referendo como legal, é certo que a declaração de independência não será reconhecida. A fragilidade do total de votos do referendo, a falta de regras claras e de uma comissão eleitoral, além das suspeitas de que eleitores podem ter votado várias vezes, também torna improvável que os políticos catalães consigam apoio internacional para a sua causa.

Para conter os catalães, o governo federal de Mariano Rajoy também pode escolher uma ferramenta radical. É um último recurso: acionar o artigo 155 da Constituição espanhola. Jamais usado, o artigo permite que Madri determine a intervenção em regiões que "não cumprem as obrigações impostas pela Constituição e palas leis ou que aja de maneira seriamente prejudicial aos interesses da Espanha".

O artigo determina, entre outras coisas, que a polícia de uma região será colocada sob o controle do Ministério do Interior da Espanha. Mas há ainda espaço até para mecanismos mais radicais, como a prisão de políticos.

Por enquanto, o governo espanhol continua a justificar a sua posição apontando que a Constituição veda qualquer iniciativa separatista e que o Judiciário vem dando razão para seus argumentos. Pelo raciocínio, a invocação do artigo 155 seria plenamente justificada. Mas é improvável que isso coloque fim à crise.

Segundo a imprensa espanhola, o resultado da invocação de tal artigo pode fazer com que a situação se radicalize ainda mais na Catalunha. Até mesmo setores moderados da sociedade catalã, que não são simpáticos à independência, condenaram a violência de domingo. O governo catalão interpretou a repressão como um fator de fortalecimento da sua causa, mesmo que pesquisas indiquem o apoio à independência não seja tão forte na sociedade catalã como Barcelona divulga.

Negociação

A possibilidade de colocar os dois lados em uma mesa de negociação também parece remota por enquanto. Nos últimos cinco anos, ambos os lados saíram de negociações ainda mais radicais. Também não há previsão de que a União Europeia resolva intervir ou mediar o tema. O presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, disse que considera a disputa um assunto interno da Espanha e que Bruxelas vai acompanhar as decisões da Justiça local.

Oferecer mais autonomia aos catalães também está fora de questão por enquanto. Uma legislação espanhola em 2006 chegou a garantir mais poder ao governo da Catalunha, e a região recebeu o status de "nação". Mas outras regiões contestaram o tratamento especial dado aos catalães e contestaram a legislação, que acabou sendo derrubada em 2010 pela Corte Constitucional espanhola. Desde então, o ímpeto dos separatistas catalães só aumentou.

Ainda sem ter anunciado quais serão seus próximos passos, a classe política espanhola tenta passar uma imagem de unidade. Nesta segunda-feira, Rajoy se encontrou com seu adversário e líder dos socialistas espanhóis, Pedro Sánchez, para discutir a crise.

Reações 

Líderes europeus reagiram aos acontecimentos de domingo. O presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, pediu para que o governo espanhol "evite uma escalada maior e o uso da força". 

O presidente da Franca, Emmanuel Macron, salientou seu apreço pela "unidade constitucional da Espanha" e evitou fazer comentários sobre a violência. 

O governo da Polônia, por sua vez, disse esperar por uma "rápida estabilização da situação" por meio de "dialogo e comprometimento". Varsóvia também afirmou que considera o tema uma questão interna da Espanha.

Já o ministro das Relações Exteriores da Alemanha, Sigmar Gabriel, pediu que as duas partes dialogassem. "As imagens que chegaram da Espanha mostram como é importante parar essa escalada em espiral". Gabriel também pediu que as partes permaneçam calmas e encontrem uma "solução política sustentável". 

JPS/ots