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PolíticaPolônia

Ultradireitista impede palestra sobre Holocausto na Polônia

Jacek Lepiarz
2 de junho de 2023

Deputado polonês se enfureceu com fala de historiador no Instituto Histórico Alemão em Varsóvia, invadiu o palco e danificou equipamento de som. Polícia não convenceu o político a se retirar e evento foi cancelado.

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Policiais conversam com Braun. Pessoas ao redor filmam a cena
A polícia não conseguiu persuadir Braun (à direita) a deixar a sala onde Grabowski estava dando a palestraFoto: Jacek Lepiarz/DW

O Instituto Histórico Alemão em Varsóvia geralmente é um lugar de debates acadêmicos equilibrados baseados em fatos e argumentos pertinentes. Na noite de terça-feira (30/05), porém, o local foi palco de uma explosão política que se tornou violenta. Felizmente, ninguém ficou ferido – mas o equipamento técnico sofreu danos.

O incidente ocorreu durante uma palestra de Jan Grabowski, um renomado professor polonês-canadense de história e pesquisador do Holocausto.

Apenas alguns minutos após Grabowski ter começado a falar sobre o tópico anunciado, "Os problemas (crescentes) da Polônia com a história do Holocausto", o parlamentar de extrema direita Grzegorz Braun se levantou, gritou "basta" e invadiu o palco, tomando o microfone do palestrante e batendo com o aparelho várias vezes no púlpito.

O parlamentar, então, arrancou os cabos, derrubou o alto-falante e, dirigindo-se ao público chocado, disse que o evento havia terminado.

Nem o segurança da sala nem os policiais que foram chamados ao local conseguiram retirar Braun e seus apoiadores do recinto. O deputado evocou sua imunidade e alegou que a situação era de emergência.

Quando o diretor do instituto, Milos Reznik, censurou Braun por danificar a propriedade do instituto, o deputado assumiu um tom ainda mais agressivo:

"Um alemão em Varsóvia não vai me dizer que eu não devo danificar alguma coisa. Saia de Varsóvia, agora!", gritou.

Jan Grabowski de óculos
Grabowski conduzia palestra com o tema "Problemas (crescentes) da Polônia com a história do Holocausto"Foto: Jan Grabowski/picture alliance/dpa/

Palestra cancelada

Apesar de ser vaiado pelo público e chamado, entre outras coisas, de "fascista" e "capacho russo", Braun se recusou a ceder. 

"Estou defendendo a nação polonesa contra um ataque provocado à sensibilidade histórica", disse aos policiais.

Após tentativas sem sucesso dos agentes em acalmar os ânimos, a polícia pediu que os presentes no evento se retirassem da sala.

Somente após o cancelamento do evento é que Braun deixou o prédio, gabando-se de sua "vitória".

Braun pertence à Confederação Liberdade e Independência, um pequeno grupo parlamentar composto por nove deputados e que tem ligações com o partido de extrema direita Alternativa para a Alemanha (AfD).

Três homens sentados atrás de uma mesa
Braun (centro) em visita a membros da AfD em setembro de 2022Foto: Wojciech Szymanski/DW

Protestos provocativos são uma característica de Braun. Nos últimos anos, ele se declarou contra as restrições impostas em razão da covid-19 e ameaçou o ministro da saúde no Parlamento.

Braun também considera a mídia independente como sua inimiga. Em 2012, disse que um em cada 10 jornalistas do periódico Gazeta Wyborcza e do canal de televisão TVN deveria ser baleado.

Oposição antes da palestra

Mesmo antes do evento, a palestra de Grabowski causou revolta entre membros da direita polonesa. Em 25 de maio, Jakub Kumoch, ex-assessor-chefe de política externa do presidente Andrzej Duda, criticou no Twitter o fato de a palestra estar sendo realizada no Instituto Histórico Alemão em Varsóvia. Kumoch é apontado pela mídia como provável próximo embaixador da Polônia na China.

Para ele, os alemães não têm o direito de ensinar nada aos poloneses sobre o Holocausto. Kumoch também acusou o instituto de "provocar um escândalo" para que os jornais alemães tivessem o que escrever.

Regresso à década de 1930?

"Estamos alcançando um novo nível de violência contra os acadêmicos", disse Grabowski ao portal Wirtualna Polska. Para ele, a situação atual lembra o ocorrido entre 1937-1939, quando acadêmicos foram atacados e tiveram suas palestras interrompidas na Polônia.

A opinião de Grabowski é compartilhada pelo historiador Szymon Rudnicki, autor de numerosas publicações sobre a direita radical polonesa no período entre guerras de 1918 a 1939. 

"Sinto como se tivesse sido transportado de volta à década de 1930", disse à DW.

"O que posso dizer?", questionou o diretor do Instituto Histórico Alemão em Varsóvia. "A situação fala por si. Vimos quem tem medo do debate sobre importantes problemas atuais", destacou, prometendo que o instituto retomaria o tema da palestra posteriormente.

Questionado se a decisão de cancelar o evento não teria sido como uma "capitulação", Reznik respondeu:

"Se o acadêmico disser que não vê como continuar a palestra, temos que aceitar".

Críticas da direita

Grabowski leciona na Universidade de Ottawa, no Canadá – e duas publicações o renderam muitos inimigos na Polônia, especialmente dentro do atual governo de direita. 

Entre outras coisas, seu livro Noite Sem Fim: o Destino dos Judeus na Polônia Ocupada, publicado pela primeira vez em polonês em 2018 e coescrito por Barbara Engelking, desencadeou uma onda de protestos.

A obra destaca o problema da violência perpetrada por cristãos poloneses contra judeus, em especial após a liquidação dos guetos pelos alemães em 1942, quando os sobreviventes buscaram ajuda de famílias polonesas no país.

A pesquisa foi criticada pelo Instituto de Memória Nacional da Polônia. Mas Grabowski foi apoiado pelo memorial do Holocausto Yad Vashem e pelo Instituto de História da Academia de Ciências da Polônia.

Nos últimos tempos, o governo polonês aumentou sua pressão sobre acadêmicos independentes que investigam aspectos críticos das relações polonesas-judaicas durante a Segunda Guerra Mundial.

"Não financiarei nenhum trabalho de pesquisa que vise difamar o bom nome do Estado polonês", disse o ministro da Educação e Ciência, Przemyslaw Czarnek, em uma reunião com uma delegação do Parlamento Europeu em Varsóvia, em meados de maio. 

A declaração levou a relações tensas com o governo israelense e pesquisadores do Holocausto em todo o mundo.