Quem paga?
9 de julho de 2010Houve um tempo em que Sepp Blatter vinha logo atrás de Nelson Mandela na lista de popularidade na África do Sul. O presidente da Fifa atraiu simpatia quando ajudou a trazer a Copa de 2010 para o país. Pela primeira vez, um Mundial de futebol seria realizado em solo africano.
Com o tempo, os sul-africanos passaram a olhar para "Blatter & Cia" com tanto desdém quanto para os cartéis de drogas nigerianos em Johanesburgo. Pois os dirigentes da entidade voltarão para a Suíça, e restará aos contribuintes sul-africanos a conta da festa da Copa.
Eddie Cottle é o encarregado para a Copa do Labour Research Service, um grupo lobbysta ligado a sindicatos. Cottle é um dos maiores críticos do Mundial – mas de forma alguma o único – e fica furioso quando fala no assunto.
"A Fifa é a principal beneficiária da Copa do Mundo. Até agora, a Fifa arrecadou na África do Sul mais do que em qualquer outro país sede de Copa. A grande pergunta cabível que se faz na África do Sul é para onde vai este dinheiro e quem realmente lucra com a Copa. Nossa resposta é: as empreiteiras e a Fifa com seus parceiros", reclamou Cottle.
Os custos
Segundo os organizadores, os 400 mil visitantes devem deixar no país 15 bilhões de rands – aproximadamente 1,5 bilhão de euros. Em contrapartida, os custos apenas com a ampliação da infraestrutura atingem 1,7 bilhão de euros.
No fim, o contribuinte sul-africano terá uma conta de cerca de 33 bilhões de rands – 3,3 bilhões de euros – para pagar. Isto corresponde ao montante que a Fifa terá contabilizado como lucro líquido na noite do dia 11/07, quando terminar a Copa mais lucrativa de todos os tempos.
Nkosinathi Jigega é membro da organização não governamental Street Vendors (vendedores de rua), de Port Elizabeth, uma das sedes da Copa. Ele viu de perto como a Fifa usou sua política de direitos descompromissadamente para expulsar os tradicionais pequenos negociantes dos estádios e arredores. Há décadas, eles vendem cachecóis e milho assado para os torcedores sul-africanos, mas os patrocinadores McDonald's e Coca-Cola tinham exclusividade nos locais dos jogos – cuja construção foi financiada pelos contribuintes.
"O slogan 'Copa do Mundo africana' é na verdade só uma jogada de marketing. A realidade é que empresas europeias e a Fifa ficam com o dinheiro, em detrimento da sociedade sul-africana. E tudo o que se está vendo (na televisão) foi bancado pelo governo sul-africano", disse Jigega.
Aos custos se acrescem os efeitos colaterais da Fifa. Muitos sul-africanos também responsabilizam "Blatter & Cia" pelos preços exagerados da indústria hoteleira e dos voos domésticos. A procura interna nestes setores caiu muito em junho e julho, a África do Sul agora é tida pelos turistas como um destino caro, o que pode incidir sobre o número de visitantes nos próximos anos.
O futuro dos estádios
Se isso não bastasse, os contribuintes sul-africanos ainda vão arcar com a manutenção dos estádios durante anos. Depois que o circo do futebol passou por Coreia do Sul e no Japão em 2002, estádios tiveram de ser reduzidos porque não tinham mais tanta utilidade. Um destino parecido ameaça alguns dos estádios desta Copa.
O local para jogos na Cidade do Cabo não foi construído no bairro de Athlone, como o governo sugeriu, para integrá-lo à cidade. Em vez disto, pelo desejo de Blatter, o templo do futebol surge como um corpo estranho na grama verde de Green Point, onde sua utilização futura se limitará a poucos jogos da equipe local. Apropriadamente fulminante é a conclusão dos críticos.
"Todos os recursos vêm dos cofres públicos, são portanto dinheiro dos impostos. Mas a população não recebe nada de volta com todos estes gastos", conclui Eddie Cottle, sobre a construção dos estádios.
Nos bares da África do Sul, desde a eliminação do time da casa, tudo gira em torno da questão de quem paga o banquete – e se o esforço valeu a pena.
Kenneth é garçom do Mozzi's Jazz Cabin, um bar de fundo de quintal em Soweto. Para ele, o espetáculo valeu a pena. "Para mim, pessoalmente, a Copa se paga. É que agora eu tenho um emprego, o que eu não tinha antes. A Copa trouxe muitas oportunidades e acima de tudo vagas de trabalho – e vai continuar assim", argumentou.
Innocent, filho do dono do bar, se expressa contra esta ideia, que é a mais comum na África do Sul nestes dias. "A Fifa é quem mais lucra, pelo menos mais do que nós, sul-africanos normais. O dinheiro continua indo para lá, onde já há dinheiro", disse.
Autor: Ludger Schadomsky (tm)
Revisão: Roselaine Wandscheer