Som de Istambul na Alemanha
15 de junho de 2005O diretor turco-alemão Fatih Akin rodou 150 horas de material e levou sete meses para montar Crossing the Bridge – The Sound of Istanbul (Atravessando a Ponte – O Som de Istambul). Para compor a dramaturgia de sua viagem pelo universo musical da metrópole turca, Akin começou com gêneros aos quais o ouvido ocidental já está acostumado: eletrônicos, rock e hip hop, por exemplo, para chegar no fim do percurso ao que se pode chamar de "música de raiz".
Ponte entre Oriente e Ocidente
Rastrear a cena musical de Istambul serviu como ferramenta para expor o melting pot que é a única cidade do mundo situada em dois continentes. Para simbolizar a metrópole onde vivem 20 milhões de habitantes, Akin optou pela ponte que dá nome ao filme: mediadora entre Ocidente e Ocidente e metáfora da simbiose de identidades.
Num contexto em que não se destaca a alteridade, mas a indiferença, um "tanto faz" em relação a conceitos étnicos ou a diferenças culturais. Uma busca de signos do "outro lado do Bósforo", resgatando os lados da própria biografia de Akin: filho de pais turcos, criado em Hamburgo, atual estrela do cinema alemão que busca no universo imigrante material para seus filmes.
"Ouvir música como se vai à padaria"
Em Crossing the Bridge, a viagem é longa: de rock e house, passando pelo performático Baba Zula, até chegar no representante de música cigana Selim Sessler, no interior do país. "Na Turquia ouve-se música como se vai à padaria comprar pão, é algo existencial", observa Akin em entrevista a uma TV alemã.
Conflitos sociais ou étnicos presentes no país, como o em relação aos curdos, são apenas pincelados. O que chegou a provocar comentários venenosos de parte da mídia alemã, como se o propósito de um documentário de viés essencialmente musical fosse abarcar todo o caldeirão de problemas de um país.
Olhar de detetive
Sendo que para Akin o que importa é a "polifonia de sons", a metrópole como ponto de fusão musical, dando de ombros para qualquer teoria que insista em bater na tecla do "choque de civilizações". Como assinala o semanário Die Zeit, Akin "se apaixona por Istambul". E com este olhar apaixonado conduz ninguém menos que Alexander Hacke pelas ruas da cidade.
Hacke, o baixista do lendário Einstürzende Neubauten, um ouvido "ocidental" por excelência, que já havia trabalhado na trilha sonora de Contra a Parede – o longa com o qual Akin levou o Urso de Ouro em Berlim em 2004. O olhar de Hacke é quase de um detetive. "Por isso rodei algumas cenas um pouco como filme noir", conta Akin em entrevista ao diário taz.
Trilogia: Amor, Morte, Diabo
No fim da sessão, "o ar quente e empoeirado de Istambul não termina como uma abstração, mas o espectador acaba acreditando, no fim, que ele mesmo conhece aquelas ruelas gastas e cantos mal falados que estiveram na rota de Akin em Istambul", comenta o diário Frankfurter Rundschau. Uma viagem que, certamente, vale a pena.
Servindo de "sala de espera" para a continuação da trilogia de ficção Amor, Morte, Diabo, que Akin anunciou ter iniciado em Contra a Parede e que promete continuar. Uma trilogia, conta o diretor ao Süddetusche Zeitung, na qual "não vejo a morte como algo destrutivo ou finalizador, mas como uma mudança, uma metamorfose. A palavra diabo está para a reflexão sobre o mal. Será que Lúcifer era mesmo o mal? Ou será que era apenas um rebelde, que se engajou pelos direitos humanos e por isso foi banido?". Perguntas que ficam no ar até que os próximos filmes de Fatih Akin cheguem às telas.