Soldadas sofreram abuso em quartel da Bundeswehr
16 de fevereiro de 2017No quartel Staufer, em Pfullendorf, pequena cidade no sul da Alemanha, funciona um centro de treinamento para operações especiais da Bundeswehr, as Forças Armadas da Alemanha. Mas certos acontecimentos no local não têm nada que ver com a formação de soldados.
Um relatório do Ministério alemão da Defesa detalha etapas humilhantes pelas quais uma mulher em treinamento teve que passar como parte de um "exame de admissão" de tons sadistas. Nicole E. relatou ter sido forçada por seus superiores a fazer uma apresentação de pole dance no quartel.
Além de um poste para dança, semelhante aos que existem em strip clubs, o quartel também contava com um bar repleto de bebidas destiladas. Festas regadas a muito álcool eram frequentes no local.
Nicole E. também relatou que os supervisores forçavam as mulheres em treinamento a se despirem completamente e então as revistavam, tocando-as nos seios e na genitália. Os instrutores fotografavam todas as etapas, argumentando que isso poderia ser útil para "propósitos de treinamento".
Série de incidentes
O relatório – discutido pelo Comitê de Defesa do Parlamento alemão nesta quarta-feira (15/02) – detalha o mais recente de uma lista de comportamentos abomináveis em Pfullendorf. Em janeiro deste ano, investigações internas revelaram que instrutores frequentemente forçaram os recrutas a tirar a roupa e depois os filmaram. Absorventes íntimos foram introduzidos no ânus dos recrutas.
Gisela Manderla, representante do partido governista União Democrata Cristã (CDU) no Comitê de Defesa do Bundestag (Parlamento), disse ser importante o reconhecimento de que os homens envolvidos foram os culpados, e não as próprias mulheres. "O problema está nos homens, e não nas mulheres", diz.
Gabi Weber, que representa o SPD, parceiro de coalizão da CDU, no comitê, concorda. "São os homens que têm que mudar. A Bundeswehr precisa colocar muito mais ênfase na educação e no treinamento, de modo que, no longo prazo, uma cultura de liderança diferente seja estabelecida."
Trotes extremos também eram parte da rotina do quartel. Segundo relatos, soldados amarravam seus companheiros a cadeiras, os forçavam a permanecer nessa posição durante horas e os molhavam com jatos de água gelada.
Cinco supervisores foram transferidos para outras posições, alguns deles permanecendo no quartel. Dois foram realocados no Comando de Forças Especiais (KSK), esquadrão de elite do Forças Armadas alemãs. O comandante da base, coronel Thomas Heinrich Schmidt, foi transferido. Ele estava à frente do quartel desde 2013.
"Atos abomináveis"
A ministra alemã da Defesa, Ursula von der Leyen, condenou fortemente os atos de supervisores e soldados na base militar. "Os atos em Pfullendorf são repugnantes e abomináveis", disse, adicionando que faria de tudo para esclarecer os incidentes no quartel.
Agnieszka Brugger, especialista em defesa do Partido Verde, da oposição, criticou Von der Leyen por falar abertamente sobre o escândalo somente agora. Nicole E., que relatou os incidentes, o fez em outubro do ano passado, mas o Parlamento só foi informado em janeiro deste ano. Brugger afirmou que o único motivo para isso foi evitar que o caso chegasse à imprensa.
"Eles [funcionários do Ministério da Defesa] disseram que estavam esperando para nos contar até que as investigações estivessem mais avançadas. Mas não é assim que se trata o Parlamento", afirmou. Ela disse acreditar que é sincera a condenação que Von der Leyen e outros funcionários do ministérios fizeram dos crimes, mas criticou as prioridades do ministério. "É lamentável que, para a ministra, o estilo de liderança interna [na Bundeswehr] tenha sido apenas uma nota de rodapé até agora", critica.
Um ponto em que os políticos de todos os partidos concordam é que mudanças são necessárias imediatamente. O novo relatório apresentado nesta quarta-feira pede uma "mudança fundamental na mentalidade" de todos os soldados em Pfullendorf.
Num encontro do Comitê de Defesa, Weber sugeriu controles de surpresa nos quartéis das Forças Armadas para ver soldados e supervisores em ação, em vez de esperar até que uma queixa seja feita. Weber, Brugger e Manderla também pediram consequências para os que sabiam sobre o comportamento abominável em Pfullendorf.
"Provavelmente será impossível acabar completamente com rituais de trote entre os soldados", afirmou Manderla. "Mas as pessoas que violam os direitos individuais e a privacidade de alguém deveriam ser demitidas das Forças Armadas imediatamente."