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Sem competição, consórcio liderado pela Petrobras vence leilão do pré-sal

Fernando Caulyt / Jan D. Walter 21 de outubro de 2013

Em dia marcado por protestos e confrontos com a polícia no Rio, licitação do campo de Libra tem só um concorrente e termina sem ágio para governo. Com apenas 20%, baixa participação chinesa no grupo vencedor surpreende.

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Foto: Tânia Rêgo/ABr

Se do lado de fora o clima era quase de guerra, com confrontos entre a Força Nacional e manifestantes, dentro do hotel Windsor, na Barra da Tijuca, no Rio, era o oposto – tranquilo até demais. O leilão do megacampo de petróleo Libra, o primeiro do pré-sal e maior licitação da história do Brasil, terminou sem ágio e com a apresentação de proposta por apenas um consórcio, que ganhou o direito de explorar por 35 anos a área.

O consórcio vencedor do leilão é formado pela anglo-holandesa Shell; pela francesa Total (20% cada); pelas chinesas CNPC e CNOOC (10% cada) e pela Petrobras (10%). A fatia da estatal brasileira sobe para 40%, contabilizando-se a participação de 30%, já exigida pelas regras do leilão.

"Pelo barulho que fizeram, fiquei surpreso com a baixa participação dos chineses. A minha impressão é que eles buscavam uma fatia maior, já que o mercado chinês demanda muita commodities, principalmente petróleo", diz Marcos Antônio de Andrade, professor de administração e comércio internacional da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

No novo modelo de partilha realizado pelo governo federal, não houve ágio. O consórcio vencedor vai pagar a oferta mínima de 41,65% de retorno para o governo do petróleo produzido. O consórcio formado pela Petrobras vai pagar 15 bilhões de reais de bônus ao governo federal, que precisa do dinheiro para fechar as contas de 2013 e se comprometeu a usar um mínimo nacional de bens e serviços referentes à exploração.

Por ter 40% do consórcio, a Petrobras terá que desembolsar 6 bilhões de reais somente no pagamento do bônus – o que, para Andrade, vai comprometer parte dos projetos de investimentos já anunciados para 2014 pela estatal.

Proteste gegen Versteigerung des Ölfelds Libra in Brasilien
O governo federal mobilizou cerca de 1.100 homens da Força Nacional e do ExércitoFoto: Tânia Rêgo/ABr

“Como vantagem, com os novos recursos existe a possibilidade de a companhia atingir novas metas de produção de petróleo e refino. Isso provavelmente permitirá que a empresa, até 2017, reduza a sua alta alavancagem apresentada no Plano de Negócios. Ou seja, a curto prazo, é ruim, mas a médio e longo prazo as expectativas são boas”, afirma.

300 bilhões de reais em royalties

A previsão é que o consórcio vencedor produza até 1,4 milhão de barris por dia. O campo de Libra, localizado na Bacia de Santos, teria, de acordo com o governo, entre 8 e 12 bilhões de barris. Hoje, as reservas brasileiras comprovadas são de 15 bilhões de barris.

A diretora-geral da Agência Nacional de Petróleo (ANP), Magda Chambriard, afirmou que a licitação é uma excelente oportunidade de aceleração do desenvolvimento industrial do país e do crescimento dos níveis de emprego e renda no país.

“Serão aplicados 75% dos royalties do pré-sal na Educação e 25% na Saúde. E estimamos que apenas Libra seja capaz de gerar cerca de 300 bilhões de reais em royalties ao longo de 30 anos de produção”, disse Chambriard.

Fraca participação de investidores

Onze empresas haviam se habilitado para participar do leilão, sendo que, entre elas, três estatais chinesas: CNOOC International Limited, China National Petroleum Corporation (CNPC) e Sinopec. Esta última entraria num consórcio juntamente com a espanhola Repsol, que anunciou já nesta segunda-feira sua desistência.

As outras inscritas eram Ecopetrol (Colômbia), Mitsui&CO (Japão), ONGC Videsh (Índia), Petrogal (Portugal), Petronas (Malásia), Shell (Anglo-Holandesa), Total (França) e Petrobras.

Brasilien Ölplattform P-26 Petrobras
Plataforma P-26, da Petrobras: campo de Libra deverá gerar cerca de 300 bilhões de reais em royalties ao longo de 30 anos de produçãoFoto: picture-alliance/dpa

A fraca participação das empresas inscritas no leilão foi considerada uma surpresa. Entre os motivos que teriam desanimado parte das multinacionais estariam a parcela obrigatória da Petrobras, de no mínimo 30% do consórcio vencedor, além dos problemas de caixa da estatal.

"O momento da Petrobras não é bom. O endividamento é muito alto e está, inclusive, sofrendo pressão das agências de classificação de risco de sofrer mais um downgrading", afirma Andrade. "Para investidores externos, pesa muito também o fato de a interferência estatal na Petrobras. O governo inibe o reajuste da gasolina e do diesel, o que prejudica mais ainda o caixa da estatal."

Confrontos no Rio e greve de petroleiros

Cerca de 1.100 homens da Força Nacional e do Exército fizeram bloqueios nos arredores do hotel Windsor, na Barra da Tijuca. Eles estavam posicionados em frente às grades colocadas para impedir a chegada de manifestantes ao local do leilão. Cerca de 300 pessoas protestaram, entre sindicalistas, petroleiros e os chamados Black Blocs.

Houve tumulto durante quase todo o dia. Forças de segurança usaram bombas de gás lacrimogêneo e balas de borracha para dispersar os manifestantes – pelo menos quatro ficaram feridos. Um carro da emissora de televisão Record foi virado e incendiado por alguns dos manifestantes.

O Sindicato dos Petroleiros do Litoral Paulista (Sindipetro-LP) convocou uma greve contra o leilão de Libra para esta segunda-feira. Cerca de quatro mil trabalhadores terceirizados da Refinaria Presidente Bernardes, em Cubatão, paralisaram as atividades.

Proteste gegen Versteigerung des Ölfelds Libra in Brasilien
Quatro manifestantes saíram feridos após dia de confrontos entre forças de segurança e manifestantesFoto: Tânia Rêgo/ABr

"A maior privatização da história do Brasil está com a presidente Dilma, que hoje usou de muita violência e o Exército para fazer valer o leilão. Isso significa que, quem usa o Exército e exerce a força, é porque renuncia ou não tem mais capacidade de diálogo com a população para convencê-la que a medida teria alguma validade", opina Ildo Luís Sauer, ex-diretor de Gás e Energia da Petrobras e coautor de várias ações contra o leilão.

"Acredito que a Justiça ainda vai se fazer, mas o dia de hoje, se o leilão não for anulado, 21 de outubro será reconhecido como o dia do crime de lesa-pátria", completa Sauer, diretor do Instituto de Energia e Ambiente (IEE) da USP.

Na quinta-feira passada, petroleiros entraram em greve em protesto contra a realização do leilão, que também já tentou ser impedido por 24 ações judiciais. Delas, 18 já foram derrubadas pela Justiça, e outras seis ainda aguardavam decisão.