Seleção de reator nuclear causa impasse em prêmio ambiental
30 de agosto de 2013Nesta sexta-feira (30/08), serão entregues em Berlim os prêmios ambientais GreenTec Awards, concedidos a inovações que protegem o meio ambiente e são economicamente viáveis. A seleção do público para a categoria "Prêmio de Ciência Galileu" causou um embate. Os organizadores da premiação entraram com um recurso para tentar impedir a participação dos físicos do Instituto para Física Nuclear Sólida de Berlim escolhidos pelo voto popular como finalistas.
Os físicos inscreveram seu conceito de reator com fluído duplo, ou seja, um reator nuclear que funciona com combustível de fluído de sal e é resfriado com chumbo líquido. Seu diferencial em relação aos modelos atuais é a diminuição do tempo de estoque do lixo atômico.
Apesar de o reator de fluído líquido apresentar uma série de vantagens, para a organização do GreenTec Awards, energia atômica e proteção ambiental não combinam. Após o público ter votado pela internet e escolhido o reator, ela comunicou aos participantes que o projeto não corresponde às aspirações do prêmio e, por isso, fora eliminado da disputa.
Mas no dia 4 de julho, o Tribunal Superior de Berlim (Kammergericht) concedeu uma liminar ao projeto, determinando sua indicação para a fase final do concurso. Contudo, essa ainda não é a decisão final. Às vésperas da cerimônia de entrega do prêmio, ainda não se sabia se o projeto dos físicos está concorrendo.
Em um segundo julgamento, no último dia 22 de agosto, os físicos perderam na primeira instância. Mas eles recorreram da decisão e aguardam uma nova sentença.
Reator de fluído duplo
O reator com fluído duplo poderia resolver vários problemas do atual sistema de energia nuclear. No novo reator, um combustível líquido – mistura composta por cloreto de plutônio, cloreto de urânio ou sais de nuclídeos – é utilizado para a produção de energia.
Essa mistura flui através do núcleo do reator, onde acontecem as reações em cadeia. Nesse processo, os combustíveis sólidos não são mais necessários. Atualmente, barras de combustível são colocadas com uma distância regular dentro dos reatores e retiradas no fim do ciclo.
O combustível líquido, ao contrário, flui sempre em um ciclo, depois de ser queimado no núcleo do reator, vai para uma unidade de processamento interna, que retira os componentes residuais e enriquece novamente o líquido com radionuclídeos. Após esse processo, o líquido retorna ao núcleo do reator.
Lixo menos nocivo
Mas a grande vantagem desse modelo é a diminuição do tempo de atividade do lixo radioativo gerado. Ele precisa ser armazenado entre 100 e 300 anos e, depois, pode ser reciclado e transformado em metais preciosos. Além disso, os nuclídeos não utilizados voltam para o reator.
O reator com fluído duplo auxilia também na diminuição do atual lixo nuclear, utilizando-o como base para a produção do combustível líquido. Os componentes mais duráveis desses resíduos são plutônio e os chamados actinídeos. Esses elementos atingem a radiotoxicidade do urânio natural somente cerca de 100 mil anos depois e, por isso, precisam ser armazenados com segurança durante esse período, em locais longe da população.
Nos chamados reatores de partida rápida, como o de fluído duplo, esses componentes podem continuar queimando, e a radiotoxicidade de seus resíduos diminui mais rápido. Alguns voltam ao estágio de urânio natural após 300 anos, outros, após 600 anos. Esse processo chama-se transmutação.
Há ainda uma diferença importante desse processo em relação a outros reatores de partida rápida ou unidades de transmutação de combustíveis sólidos. Para obter combustível nuclear, a produção do sal líquido não exige separar os componentes da mistura quimicamente através do dispendioso processo Purex. Os elementos podem ser simplesmente misturados nessa sopa.
Processo de resfriamento mais seguro
Além disso, no reator com fluído duplo, o núcleo devolve o calor gerado para o circuito de refrigeração, onde chumbo líquido é usado para o resfriamento. Nos atuais reatores de partida rápida, é utilizado sódio, elemento menos corrosivo que o chumbo.
A temperatura dos reatores resfriados com chumbo também é bem maior. Por isso, o material da tubulação precisa ser mais resistente ao calor. Mas a vantagem é que, ao entrar em contato com água ou ar, o chumbo não reage tão agressivamente como o sódio e não entra em combustão. Esse elemento também é capaz de segurar os nêutrons, necessários nos processos de queima de combustível, fazendo com que eles não se percam rapidamente no processo.
Outro ponto positivo no uso do chumbo é sua rápida capacidade de resfriamento. Se o sistema estiver danificado e o chumbo vazar, ele não queima, mas se esfria e congela. Assim, o vazamento se resolve por si só.
Mais um aspecto importante é que os reatores possuem um coeficiente de temperatura negativo. Ou seja, são concebidos para que uma reação em cadeia não saia do controle, como em Chernobyl. Se o circuito de queima de combustível parar por algum motivo, a reação em cadeia continua, mas vai diminuindo com o tempo. Assim, pouco a pouco o reator resfria-se.
Como as usinas que usam esse sistema são bem menores e podem ser construídas embaixo da terra, elas ficam protegidas de influências externas, como atentados terroristas e terremotos.
Pouco antes da entrega do prêmio, o conceito do reator com fluído duplo ainda estava no site do concurso entre os participantes. E, apesar da confusão, seus criadores receberam dois convites como indicados para a cerimônia de premiação.