Schöneberg: familiar, mas cosmopolita
14 de outubro de 2006O primeiro registro histórico de Schöneberg data de 1246, quando o nome "villa sconenberch" foi mencionado em uma escritura de Otto III, margrave da província de Brandemburgo. E seu nome, que em alemão significa "bela montanha", até hoje surpreende, já que o bairro é tão plano quanto o resto da cidade.
Foi em 1920 que as províncias de Schöneberg e Friedenau (hoje integrada a Schöneberg) perderam sua autonomia e foram definitivamente incorporadas a Berlim. E talvez o fato de este ser hoje um dos bairros mais urbanos e internacionais da capital se explique pelas diversas metamorfoses por que passou.
Centro do poder
Desde o final da Segunda Guerra, durante todo o período em que a cidade esteve dividida pelo Muro de Berlim, Schöneberg foi o centro das decisões políticas da antiga Berlim Ocidental. A Rathaus Schöneberg, a subprefeitura do bairro, permaneceu a sede da prefeitura de Berlim até 1991 e da Assembléia Legislativa da cidade até 1993.
O edifício é também um dos símbolos da presença dos Estados Unidos na capital. Não só devido ao Sino da Liberdade (Freiheitsglocke), um presente financiado com doações de cidadãos norte-americanos, instalado na torre central do prédio em 1950.
Mas também foi lá que o então presidente dos Estados Unidos, John F. Kennedy, proferiu a lendária frase "Ich bin ein Berliner" (eu sou um berlinense) ao discursar para a população da cidade. Sem imaginar, claro, que Berliner no resto do país quer dizer "donut".
Entre Kreuzberg e Charlottenburg
Geograficamente, Schöneberg se situa entre os bairros de Kreuzberg e Charlottenburg. Mas há quem diga que o bairro misture elementos dos dois vizinhos também quanto ao perfil e à atmosfera. Antes da reunificação, Schöneberg reunia os bares e clubes chiques da cidade.
Não havia Mitte, nem Prenzlauer Berg e a chiqueria berlinense se reunia ali. Nos anos áureos, até personalidades internacionais, como David Bowie e Iggy Pop, escolheram Schöneberg para morar.
Mas o recente pedido de concordata do clube Goya cerca de um ano após sua inauguração é um indício da mudança de perfil do bairro. Embora seus idealizadores tenham investido quase 10 milhões de euros na reforma do antigo teatro Metropol para transformá-lo em um templo de dança e degustação para um público abastado, a fórmula acabou não dando certo.
Mesmo assim, a noite em Schöneberg pode ser tão agitada quanto em outros bairros mais alternativos – ao menos para o público gay. A região em torno da praça Nollendorfplatz e da rua Motzstrasse concentra inúmeros bares gays, sex shops e lojas especializadas em todo tipo de fetiche sexual. A maioria dos moradores não pensa duas vezes ao pendurar uma bandeira do arco-íris na janela.
Também foi nesta rua que viveu durante 20 anos o criador da antroposofia e da pedagogia Waldorf, Rudolph Steiner.
Compras, família e infra-estrutura
Durante o dia, Schöneberg é um dos lugares preferidos de turistas de todo o mundo. A rua Tauentzienstrasse, continuação do famoso bulevar Kurfürstendamm, é um dos principais centros de compras da capital. É lá que fica a maior loja de departamentos da Europa continental, a KaDeWe (lê-se "cadevê"), um paraíso de compras que se estende por 60 mil metros quadrados e completa seu primeiro centenário em abril de 2007.
Aos sábados, a praça Winterfeldplatz torna-se um dos pontos de encontro prediletos dos moradores da região, que aproveitam para degustar as iguarias à venda na feirinha de rua. Hoje uma das áreas mais requisitadas de Berlim, foi lá que viveu o escritor inglês Christopher Isherwood, cujas narrações da vida berlinense durante a República de Weimar deram origem ao musical Cabaré, que depois virou filme.
Infelizmente, também foi ali na vizinhança, no extinto Sportpalast, que o Ministro da Propaganda nazista, Joseph Goebbels, incitou a população à guerra total em um discurso de 1944. Em seu lugar, foi construído um bloco de apartamentos populares, apelidado de Sozialpalast. Lá podem ser vistos os restos de um bunker nazista que os engenheiros não foram capazes de destruir.
Hoje, Schöneberg é um dos bairros mais internacionais da cidade. Lá vive gente das mais variadas etnias e é possível que o bairro concentre tantos moradores de origem turca quanto Kreuzberg, porém de modo mais integrado.
Porém, embora conhecido como uma região sossegada, familiar, especialmente procurada por pessoas de situação financeira estável e com uma excelente infra-estrutura para crianças, o bairro de Schöneberg possui áreas de alta criminalidade, principalmente ao norte, nas proximidades da rua Potsdamer Strasse, que um dia já foi uma das principais vitrines de Berlim.
Leia mais sobre as várias caras de Schöneberg e seus diversos distritos com caráter próprio.
As várias caras de Schöneberg
Diferente de muitos outros bairros de Berlim, Schöneberg possui regiões muito diferentes entre si que, não raramente, recebem dos moradores nomes próprios. Um deles é a Schöneberger Insel (Ilha de Schöneberg), que ganhou o nome por estar cercada pelos trilhos de três linhas ferroviárias.
A região é também conhecida como Rote Insel (Ilha Vermelha) devido à orientação política de seus moradores – na época, de maioria proletária, e que fizeram forte resistência ao regime nazista nas décadas de 30 e 40.
No mercado imobiliário, a área hoje é sinônimo de apartamentos de bom tamanho em prédios antigos, mas a preços baixos por serem longe do metrô.
Como se uma não bastasse, logo duas divas alemãs nasceram na ilha – Marlene Dietrich e Hildegard Knef. Também é aí que jazem os irmãos Grimm.
Para situá-la na paisagem da cidade, basta procurar pelo antigo gasômetro, uma dos marcos arquitetônicos da região que, embora desativado, foi tombado por ser um ótimo exemplo da cultura industrial.
Com a reformulação do sistema ferroviário da capital, que substitui o antigo eixo leste-oeste por um norte-sul, a região ganhou uma nova estação regional, que pode acabar mudando seu perfil. E se os planos de inaugurar uma nova estação de metrô for mesmo executado, o título de ilha poderá ser em breve apenas uma designação histórica.
A "suíça judaica"
Outra região de caráter próprio é o chamado Bayerisches Viertel, cujo nome se deve ao estilo das casas, que procurava imitar o estilo arquitetônico de pequenas cidades da Baviera.Na década de 20, o bairro – que esbanjava riqueza, com casas de fachada opulenta e jardins internos, guarnecido até com uma linha própria de metrô – foi ocupado por profissionais liberais e funcionários públicos de alto escalão.
Aí se instalaram muitos judeus abastados, tanto que a região era conhecida popularmente como a "suíça judaica". Um deles era Albert Einstein. Em frente à casa onde morou de 1918 a 1933 e que foi totalmente destruída após a guerra, apenas uma placa de metal presta homenagem ao cientista.
Durante a guerra, aproximadamente a maior parte dos moradores da região foi deportada ou exilada. Hoje, plaquinhas como as de rua pregadas nos postes do Bayerisches Viertel evitam que leis e decretos anti-semitas criados pelos nazistas caiam no esquecimento. Muito da opulência do bairro se perdeu no pós-guerra, quando foram erguidos prédios populares para encobrir as lacunas deixadas.
A paz de Friedenau
Outra região que conquistou um caráter próprio dentro de Schöneberg é Friedenau, cujo nome contém a palavra paz em celebração ao fim da guerra entre França e Alemanha em 1871.
Seu plano arquitetônico original previa apenas a construção de grandes mansões em estilo inglês. No entanto, devido à escassez de moradia em Berlim a partir do final da década de 1880, muitas casas foram derrubadas para dar lugar a edifícios de apartamentos e mais tarde novas diretrizes permitiram a construção de prédios de apartamentos de até quatro andares.
Hoje, Friedenau é uma calma zona residencial que conecta Schöneberg ao abastado bairro de Steglitz ao sul. Não é à toa que muitos escritores e intelectuais optaram por se instalar aí. Günter Grass, por exemplo, viveu de 1963 a 1996 em Friedenau. E é no famosos cemitério de Friedenau que estão enterradas diversas celebridades berlinenses, como Marlene Dietrich e o fotógrafo Helmut Newton.