Quando menos se espera, aparece Roberto Jefferson para estragar a festa. Lembrei do ano de 2005, quando o primeiro governo Lula estava indo bem. Aí apareceu o então deputado Jefferson, do nada, para denunciar o escândalo do Mensalão, que por pouco não acabou com a presidência de Lula. Agora, me parece, o ex-deputado e ex-presidente nacional do PTB apareceu para garantir a vitória do petista no domingo. E para frustrar o campo bolsonarista: justamente no melhor momento de Bolsonaro das últimas semanas, Jefferson resolve meter 50 balas e três granadas na campanha eleitoral do presidente.
O candidato à reeleição vinha subindo nas pesquisas, até, na semana passada, empatar tecnicamente com Lula pela primeira vez. Senti um ar de desespero nos amigos petistas. Ainda mais quando o TSE concedeu a Lula o direito de resposta na rádio Jovem Pan, a qual logo se fez de vítima e se disse censurada. Apesar de o campo da extrema direita posar de machão, também gosta de uma boa vitimização. Quem não chora, não mama. Vitimização sempre traz voto.
Assim, a narrativa – falsa, é claro – de que o TSE e, principalmente, o magistrado Alexandre de Moraes teriam censurado a mídia poderia ter dado um forte impulso a Bolsonaro. Aí aparece Roberto Jefferson, primeiro xingando a magistrada Carmen Lúcia com palavras de baixíssimo calão. E depois, atirando contra policiais federais e jogando granadas.
Sorte dele que é amigo de muita gente poderosa, como o próprio presidente da República. Pois sabemos que, normalmente, atirar num policial é assinar o próprio atestado de morte. Mas peraê: tem gente que aposta que Jefferson queria provocar justamente isso, a própria morte, para virar mártir entre os bolsonaristas. Será? Ele sempre teve ar de kamikaze, admito.
A filha de Jefferson disse, em vídeo, que Alexandre de Moraes queria matar o pai: "Xandão vai matar meu pai hoje." E mais: "Eu tenho certeza que a Polícia Federal, os agentes que estão na porta do meu pai são da Gestapo do Xandão, a polícia política do Xandão." Os bolsonaristas acham que agem em nome do cristianismo e contra o nazismo? Parece que sim. Talvez seja esse o legado de Bolsonaro para o Brasil: deixar que essa galera tosca se empodere.
Lembrei que o próprio Bolsonaro vinha dizendo que não cumpriria mais ordens de Moraes. E Roberto Jefferson parece ter levado isso ao pé da letra e recebido os mensageiros do magistrado a bala. As falas de Bolsonaro deveriam vir acompanhadas de um alerta: "Atenção, frase de efeito, não é para levar a sério!" Mas o Jefferson parece não ter entendido isso. Achou que Bolsonaro fosse salvá-lo?
O presidente até mandou o ministro da Justiça para se intrometer no caso, mas perceberam a tempo que não pegaria bem com a opinião pública – e recuaram. O Jefferson merece ser tratado como bandido, disse Bolsonaro. Um alerta para aqueles que acham que tem o aval presidencial para fazer besteira.
Será que tudo isso foi um grande teste para um possível golpe no domingo, caso Lula vença? Para testar o clima, de como a opinião pública reagiria a um levante armado? Aí me lembrei da famosa frase de Robert A. Heinlein: "Nunca atribua à malícia o que pode ser adequadamente explicado pela burrice." Frase sensata.
Seja como for, Jefferson acabou matando o bom momento de Bolsonaro na campanha. Em vez de entrar na última semana antes do segundo turno de vento em popa, estão gastando tempo precioso para explicar as loucuras do Jefferson. Em cima disso ainda receberam a pesquisa Ipec, que mostra Lula com oito pontos de vantagem quando considerados apenas os votos válidos. Aí nem adianta falar em fraude de rádios ou falsificar fotos do Casimiro Miguel. O estrago está feito.
Agora restam cinco dias para Bolsonaro correr atrás do prejuízo. Ainda tem o debate na Globo. Como será o resultado no domingo? Ninguém sabe, pois tivemos que aprender, no primeiro turno, que as pesquisas também falham. Só resta esperar que todas as partes envolvidas respeitem o resultado. Nada de resistência armada, nada de mandar bala ou jogar granada. Avisem o Jefferson, porfa!
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Thomas Milz saiu da casa de seus pais protestantes há quase 20 anos e se mudou para o país mais católico do mundo. Tem mestrado em Ciências Políticas e História da América Latina e, há 15 anos, trabalha como jornalista e fotógrafo para veículos como a agência de notícias KNA e o jornal Neue Zürcher Zeitung. É pai de uma menina nascida em 2012 em Salvador. Depois de uma década em São Paulo, mora no Rio de Janeiro há quatro anos.
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