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CatástrofeBrasil

Retorno das chuvas reacende medo de novas enchentes no RS

Gustavo Basso de Estrela
13 de maio de 2024

Defesa Civil pede que população busque áreas seguras após temporais do fim de semana, avisando para o risco de novos alagamentos em Porto Alegre e nos vales do Taquari e do Caí, entre outros.

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Rua alagada durante a noite
Em Estrela, nível do Rio Taquari volta a subir depois das chuvas no fim de semanaFoto: Gustavo Basso

A família Bartholdy nem terminou de limpar o segundo andar do imóvel onde moram, em Estrela, Rio Grande do Sul, e as águas do rio Taquari já ameaçam invadir novamente a casa de onde fugiram no dia 1º de maio. "Medo eu nem tenho mais, porque praticamente já perdi tudo. Agora é tentar só ter um telhado para morar um mês, meio ano, um ano, e tentar conseguir um outro terreno, para construir uma outra casa, para poder sair fora desse ambiente difícil", diz Elton Bartholdy, de 59 anos. 

Entre o fim de abril e começo de maio as águas atingiram o telhado do imóvel de aproximadamente 10 metros de altura, algo jamais visto. "Antigamente vinha a um metro, meio metro, nem chegava aqui; agora já cobre a casa, dois, três metros acima", comenta Michele, de 29 anos, que aposta no esvaziamento do município. "Essas cidades vão acabar sendo abandonadas, as pessoas não podem perder tudo e ficar o tempo só reconstruindo. Uma vez ou outra na vida é uma coisa, mas agora é a cada seis, sete meses". 

Pela quarta vez em oito meses, Estrela lida com a cheia do rio que banha a cidade. Na manhã deste sábado (11/05), o nível do rio era de 14 metros, longe da cota de inundação, de 19 metros. Pouco mais de um dia depois, segundo o Serviço Geológico Brasileiro (SGB), as águas já passam de 24 metros, e continuavam subindo rapidamente. Segundo a Defesa Civil de Lajeado, cidade vizinha, o nível deve chegar a 29 metros até esta segunda-feira, superando a enchente de setembro passado que, antes de maio de 2024, havia sido a maior tragédia climática da região.

Mulher em meio a sala alagada com móveis afetados por enchente
Família Bartholdy passou dias tentando limpar o segundo andar de seu imóvel em EstrelaFoto: Gustavo Basso

Há quase duas semanas, 75% dos imóveis de Estrela foram tomados pela água, que arrasou inteiramente quatro bairros, deixando centenas de famílias sem uma casa para voltar quando o nível baixar e toda a lama acumulada for limpa. Um trabalho que deve custar R$ 50 milhões, de acordo com a prefeitura.

Bar destruído

"Saiam daqui gente, saiam, que a água já está subindo de novo e vai até 27 metros", alertava assustado um vizinho enquanto a família, após mais dois dias de trabalho intenso, ainda lavava aparelhos de som e outros eletrodomésticos na tentativa de salvá-los. "Vou deixar uma canoa amarrada no poste para vocês se precisarem ", avisa, preocupado com o ritmo da subida da água, que já tomava metade da rua vizinha.

Foi este pequeno barco que Sergio Roberto da Silva, 67 anos, usou para tentar diminuir o prejuízo já instalado em seu bar. O "bailão", como são chamados os espaços de música e dança comuns no interior do Rio Grande do Sul, funcionava há vários anos no local e tinha resistido a outras inundações do Taquari. Não resistiu, porém, à maior tragédia socioambiental do estado.

"Perdi cinco geladeiras, três freezers e todo o equipamento do salão, que está arrasado. Caiu o telhado inteiro e uma parede", conta ele, enquanto amarra as cadeiras que sobraram no espaço para que não desapareçam com a nova enxurrada.

"Estrela vai levar um ano para se erguer de novo, eu mesmo não sei como, mas vou tentar de novo", desabafa antes de retornar a canoa para voltar para a terra firme e molhada apenas pela água da chuva.

Homem em canoa usa tábua como remo improvisado durante inundação
Sergio Roberto da Silva não perdeu a casa, mas seu bar foi totalmente destruídoFoto: Gustavo Basso

A situação no Rio Grande do Sul não é preocupante somente em Estrela. A Defesa Civil gaúcha emitiu neste domingo (12/05) novos alertas sobre riscos de alagamentos em Porto Alegre, capital do estado, e redondezas, pedindo para que a população busque por áreas seguras com as chuvas intensas que voltaram a cair em diversos municípios na noite sexta-feira e não parou durante o fim de semana. Há previsão de que a situação se agrave. 

Segundo o boletim da Defesa Civil divulgado na noite deste domingo, foram registradas 145 mortes devido às chuvas e inundações no estado. Há 132 pessoas desaparecidas e 806 feridos.

Com a volta das chuvas, o número de pessoas fora de suas casas aumentou de cerca de 441 mil, registrado no sábado, para mais de 618 mil, enquanto 81,2 mil estão em abrigos e mais de 538 mil estão desalojados (em casa de amigos e parentes).

Ao todo, 447 municípios foram afetados pelas enchentes deste ano, o que representa quase 90% de todas as cidades do estado.

"Risco de inundação severa"

Entre as regiões com "risco de inundação severa" estão os vales do Taquari e do Caí, de acordo com os alertas mais recentes da Defesa Civil. "Quem mora em regiões próximas, ou em áreas com histórico de alagamentos ou inundações deve sair com antecedência, de forma ordenada, buscando um local seguro para permanecer", orienta o órgão.

Na noite de sábado, o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, alertou que os rios Taquari, Jacuí, dos Sinos e Caí devem voltar a ter elevação de nível, após leve recuo nos últimos dias. "Espalhem essa informação", pediu Leite em vídeo publicado nas contas oficiais do governo nas redes sociais.

Na região metropolitana de Porto Alegre, o prefeito de Canoas, Jairo Jorge, também fez um apelo, neste domingo, para que quem voltou para casa após o recuo das águas volte a deixar os locais suscetíveis a alagamentos.

Segundo o balanço mais recente do governo estadual, até o momento76.399 pessoas foram resgatadas depois de ficarem ilhadas em diferentes pontos de alagamento, em algum dos 446 municípios afetados. Foram salvos também 10.555 animais.

Na capital gaúcha, o Lago Guaíba voltou a apresentar elevação de nível neste domingo, com expectativa de superar marcas acima de 5 metros, podendo mesmo bater novo recorde de cheia, conforme a chegada da vazão pelos rios contribuintes e a atuação dos ventos.