Regime de Assad balança em várias frentes
19 de maio de 2015Os números divergem: enquanto fontes oficiais sírias falam de até 130 mortos entre os milicianos da organização terrorista "Estado Islâmico" (EI), o Observatório Sírio de Direitos Humanos, independente e sediado em Londres, registra menos de 30 vítimas.
Num ponto, porém, ambas as instâncias são unânimes: inicialmente conseguiu-se defender do EI a antiga cidade de Palmira – um dos sítios histórico-culturais mais relevantes da Síria, situado no deserto central. Pelo menos no momento, as construções de importância universal parecem estar a salvo da destruição pelos jihadistas.
Para o regime de Bashar al-Assad, o rechaço militar do EI é tanto um êxito estratégico como de publicidade. Ele pode agora se autopromover como vanguarda na luta contra o terrorismo jihadista, que há mais de quatro anos assola não só o país, como vastas áreas do Oriente Médio.
No entanto, é questionável se esse sucesso trará benefícios de longo prazo para o governo Assad. No momento acumulam-se os indícios de que o regime do ditador está prestes a entrar em colapso.
Numa entrevista à revista alemã Der Spiegel, o ministro iraniano do Exterior, Javad Zarif, revelou o quão decisivo é o respaldo de seu país para a subsistência política de Assad. "Nós apoiamos o governo legítimo da Síria. Se não o fizéssemos, o 'Estado Islâmico' regeria agora em Damasco", afirmou.
O próprio Assad descreveu pela primeira vez, num discurso público numa escola da capital síria, no início de maio, a guerra como uma soma de inúmeras batalhas. "Faz parte da natureza das batalhas que haja avanços e retiradas, vitórias e derrotas. Nas batalhas muita coisa pode mudar, menos uma: a fé dos combatentes e sua fé na vitória." Diversos veículos de imprensa interpretaram essa declaração como sinal de que a certeza da vitória vai diminuindo.
Fim do "Carniceiro de Damasco"
De fato, as tropas de Assad tiveram que engolir derrotas consideráveis no norte da Síria. Na cidade de Jisr al-Shughur, por exemplo, entre 100 e 200 soldados fiéis ao ditador estão sitiados por jihadistas. Até agora têm sido inúteis as tentativas de tropas de elite para libertar seus colegas.
Paralelamente, no noroeste do país, o Exército nacional se confronta com tropas compostas por forças seculares e fundamentalistas e presumivelmente apoiadas por Arábia Saudita, Turquia e Catar. Essas tropas também registraram significativas conquistas de terreno nas últimas semanas.
O jornal francês Libération interpreta tais vitórias como uma antecipação do resultado da guerra, que já dura mais de quatro anos. "Caso esse 'exército da conquista' consiga o controle sobre Lattakia, cidadela da minoria religiosa alauita à qual Assad pertence, isso significaria o fim, em breve, do 'Carniceiro de Damasco'", avalia o periódico.
Na linha de fogo internacional
Assad se encontra sob pressão jurídica internacional. A Comissão pela Justiça e Responsabilização Internacional (Cija) – grupo formado por juristas, em parte ex-funcionários do Tribunal Penal Internacional de Haia – documentou detalhadamente os crimes do regime.
Para tal, nos últimos três anos, mais de 30 investigadores recolheram provas, em atuação secreta na Síria, e as levaram para a Europa. O material apresentado demonstra que o regime fez intencionalmente escalar a violência contra manifestantes políticos.
O diário inglês The Guardian cita, por exemplo, uma diretiva do departamento de segurança sírio, de agosto de 2011, para que as unidades de Dar ez-Zor prendessem em especial os organizadores de protestos contra o regime, assim como aqueles "que se comunicam com pessoas no exterior, sujando a reputação da Síria na mídia estrangeira e em organizações internacionais.
Estão igualmente documentados os métodos de tortura empregados pelo regime contra os oposicionistas. O presidente da Cija, o jurista canadense William Wiley, estima que a comissão tenha "reunido provas suficientes para poder apresentar queixa contra Assad na Corte Penal Internacional".
Violência estatal
Os métodos empregados pelo regime sírio contra os insurgentes contribuíram, por um lado, para que ele se mantenha até agora em vantagem militar. Por outro, porém, esses métodos também levaram vários cidadãos a se revoltarem contra Assad.
"A pior consequência do procedimento do regime para si mesmo é o fato de também sírios que, em princípio, não compartilham as metas dos rebeldes, tenham se unido a eles", observa a revista internacional online Al-Monitor, especializada em política do Oriente Médio, citando um antigo líder da revolta estudantil de 2011 em Aleppo.
Ao mesmo tempo, porém, o oposicionista reconhece que só se trata de uma colaboração por prazo limitado. "Talvez essas pessoas achem que seja necessário derrubar o regime, mas elas não vão concordar com as nossas outras ideias."
Ele se refere às noções divergentes quanto à formação e estrutura da sociedade síria depois de uma eventual queda de Assad. Por enquanto, contudo, ele se mantém no poder – não se sabe por quanto tempo ainda.