Quem vai construir o muro na fronteira entre EUA e México?
5 de março de 2017"Ninguém constrói muros melhor do que eu", gabou-se Donald Trump em sua campanha eleitoral. "E vou construí-los muito baratos", prometeu o ex-guru imobiliário. Como presidente dos Estados Unidos, ele parte agora para transformar em ação suas tiradas de efeito.
Nesta segunda-feira (06/03) será aberta a corrida: no site do Departamento de Segurança Interna, empreiteiras podem apresentar suas propostas de protótipos. Em abril se decide a licitação, e dois anos mais tarde as obras deverão estar concluídas. Em momentos diferentes, Trump fala de dez ou de 30 metros de altura. Só uma coisa é certa: "Vai ser um muro, nada de cerca."
Não faltam concorrentes para o projeto-mamute. Segundo a emissora de TV CNN, 300 construtoras já manifestaram interesse. Especialmente os grandes conglomerados multinacionais, contudo, são reticentes em se comprometer de forma vinculativa com a empreitada, temendo que a associação com a política trumpista de isolamento prejudique sua imagem.
Segundo vários veículos de imprensa, o presidente da alemã Heidelberg Cement, Bernd Scheifele, por exemplo, já sinalizara um dia após a eleição de Trump que sua firma, "com fábricas de cimento no Texas e no Arizona", estava muito bem preparada para a possível construção de um muro.
Interpelado pela DW, um porta-voz da empresa objetou que a declaração teria sido citada fora do contexto: como a organização da firma é descentralizada, "a análise e a decisão cabem à gerência americana".
Multinacionais reticentes
Na maior produtora mundial de materiais de construção, a suíça Lafarge-Holcim, a reação é semelhante. Falando sobre o polêmico muro ao jornal Handelsblatt, seu presidente, Eric Olsen, afirmou que a empresa estava disposta a participar de todo tipo de projeto de infraestrutura nos EUA.
No entanto, a central empresarial se recusa a se manifestar concretamente sobre a questão. "Neste momento uma entrevista não é possível", foi a resposta à DW. No entanto, a gigante do cimento confere constantemente a viabilidade de possíveis projetos, e "o governo americano, inclusive o Departamento de Segurança, é um cliente fiel da Lafarge-Holcim", diz o e-mail de resposta enviado pela empresa.
Até agora, a única a descartar inequivocamente uma eventual concorrência foi a empresa Hochtief. Paradoxalmente, a global player mexicana Cemex declara abertamente interesse: "Se alguém nos pedir um orçamento, o faremos com prazer", assegurou o presidente da empresa, Rogelio Zambrano, ao diário mexicano Reforma.
Nos passos de Clinton e Bush
Torres de vigilância, refletores, sensores de movimento, arame farpado, câmera infravermelhas, drones: a lista de equipamentos de um muro desses é longa. Na licitação os custos terão um papel central. Segundo as estimativas citadas pelo chefe de Estado americano, eles deverão girar em torno de 10 bilhões de dólares.
Num estudo realizado em julho de 2016, analistas do instituto financeiro Bernstein, por sua vez, projetam custos de construção entre 15 bilhões e 25 bilhões de dólares, para uma barreira de 12 metros de altura, sem incluir manutenção ou despesas administrativas. Devido às altas temperaturas no deserto, os analistas aconselham o uso de módulos de cimento, como os empregados pelo Estado israelense nos territórios palestinos.
No planejamento de seu megaprojeto, o governo Trump não precisará começar do zero. Já em 1994 o presidente Bill Clinton mandou erguer as primeiras cercas no sudoeste do país, cuja ampliação George W. Bush impôs, após os atentados de 11 de setembro de 2001. Desde então, a linha fronteiriça de quase 1.110 quilômetros está pontuada por muros de concreto, vigas de aço ou outros obstáculos.
O muro já existente consumiu quase 7 bilhões de dólares, segundo o instituto Bernstein, porém os custos do de Trump deverão ser mais elevados, também porque as novas seções se localizam em zonas de difícil acesso. Além disso, o atual governo pretende aumentar o pessoal, com 5 mil novos vigias se unindo aos 21 mil agentes de segurança que já patrulham a fronteira.
Ou será mesmo uma cerca?
Se depender do presidente dos EUA, os próprios mexicanos é que arcarão com os custos da fronteira – uma exigência que o governo de Enrique Peña Nieto já rechaçou. Por isso, Trump considera a introdução de impostos extras – por exemplo, sobre transferências bancárias para o exterior – com que os mexicanos acabariam pagando pela obra.
Mas pelo menos de início deverá ser o contribuinte americano a pagar pelo projeto faraônico. No fim de janeiro, o presidente da Câmara dos Representantes, Paul Ryan, confirmou que o Congresso assumirá por enquanto os custos.
Por via das dúvidas, falando ao Congresso, até mesmo o secretário de Segurança Interna, John Kelly, evitou se referir a um muro, falando de uma "barreira física". Assim, o "muro bonito, grande e poderoso" de Trump poderá em breve se transformar numa cerca. E o presidente certamente não teria dificuldade em encontrar uma justificativa para a mudança de planos. Afinal, ele também prometeu ao setor metalúrgico americano milhares de novos postos de trabalho.