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Pé na Praia: Schumacher versus Senna

Thomas Fischermann1 de junho de 2016

Thomas Fischermann deixou o Rio de Janeiro por alguns dias e viajou para a Amazônia. Ele já sabe que chegar até o destino pela Transamazônica não é exatamente como dirigir pelas autobahns da Alemanha.

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Jornalista alemão Thomas Fischermann, autor da coluna Pé na praia
Foto: Dario de Dominicis

O navegador GPS já se acostumou com minhas viagens pela Amazônia. "Siga em frente pelos próximos 600 quilômetros", uma voz alemã ordena energicamente. Faz isso toda vez que aterrisso em algum lugar como Manaus, Porto Velho ou Santarém, alugo um carro e digito as coordenadas do meu destino. "Então, vire à direita".

Quem não se acostuma é Marcos Aurélio Ferreira: um antigo garimpeiro que hoje se tornou um bom amigo. Marcos sente falta da floresta, por isso me acompanha em algumas de minhas viagens. Só que, para ele, nada é rápido o suficiente. "Se o alemão continuar dirigindo assim, só chegaremos no ano que vem!" Resmunga no assento ao lado. "Esse alemão tem um baixo espírito Schumacher, não?"

Aí eu já sei. Tenho que entregar o volante. Pelos próximos 600 quilômetros, e então à direita.

Desta vez seguimos pela Transamazônica rumo ao leste. Essa estrada, também chamada BR-320, corta a selva tropical de leste a oeste. Na disputa pelo volante, infelizmente tenho que reconhecer, Marcos Aurélio tem os argumentos mais fortes. Primeiro, porque ele já dirige pela região há décadas. Segundo, porque no meio tempo se tornou beato. Substituiu as bebedeiras, a mulherada e as farras da vida de garimpeiro por uma confiança suicida em Deus.

Por isso, de vez em quando, Marcos Aurélio pega embalo demais para passar por uma subida enlameada na Transamazônica. Aí os pneus derrapam. Nosso veículo de tração nas quatro rodas dança fora de controle para trás e quase cai em um abismo. Risadas histéricas. Brilho estranho nos olhos de nosso Ayrton-Senna-da-Mata. Somente lá pelo segundo ou terceiro embalo dá certo.

Estou contando isso, sobretudo, por me sentir insultado. Por mim, Marcos Aurélio pode dirigir tão perigosamente quanto quiser. Mas, em minha mentalidade alemã de eficiência e segurança, sempre me pergunto: pra que ele faz isso? Na Transamazônica, a gente sempre tem que sair do carro e esperar horas, algumas vezes até durante a noite. Lá quebram as pontes de madeira, que todos consertam em mutirão. Ônibus cheios de crianças indígenas atolam na lama e bloqueiam a passagem. Transportadores de gado ficam com o eixo quebrado, as vacas saem e batem nos carros. O único jeito, na minha opinião, é viajar relaxado e aproveitar a paisagem.

"Meu sonho é que um dia isso tudo seja asfaltado", diz Marcos Aurélio numa dessas paradas. Ele bate no meu ombro animadamente. Compreendo: primeiro vem o asfalto, depois o alemão volta ao volante.

Thomas Fischermann é correspondente do jornal alemão Die Zeit na América do Sul. Na coluna Pé na praia, publicada às quartas-feira na DW Brasil, faz relatos sobre encontros, acontecimentos e mal-entendidos - no Rio de Janeiro e durante suas viagens pelo Brasil. Pode-se segui-lo no Twitter e Instagram: @strandreporter.