Provocadores da arte roubam a cena
9 de setembro de 2005Recentemente, na inauguração da exposição que reúne obras dos artistas nomeados para o novo Prêmio da Galeria Nacional para Arte Jovem, no museu Hamburger Bahnhof em Berlim, o curador Joachim Jäger comparou a instalação de Mônica Bonvicini com uma cela da prisão de Abu Ghraib, enquanto seu concorrente John Bock fez uma performance que incluía ser empurrado para fora da janela por um "espectador" nervoso, guiar a platéia incrédula para fora da galeria e pular de uma ponta em um barco que esperava logo abaixo.
As roupas novas do rei?
Os quatro finalistas para o prêmio, que deve ser anunciado em fins de setembro, certamente não são o que se chamaria de convencionais. Quanto a isso, o novo prêmio se inspirou obviamente no Turner Prize, que já conta com bons 20 anos de existência e, segundo seus críticos, tem o hábito de priorizar a controvérsia em detrimento do conteúdo.
Com uma lista de célebres candidatos que vão de Damien Hirst e sua vaca cortada ao meio, Tracey Emin e sua cama desfeita, a Grayson Perry, a lista de candidatos do Turner vem gerando uma boa dose de escândalo, dando à Grã-Bretanha e ao mundo o que falar.
Mas o que tende a irritar a opinião pública é menos o contéudo chocante que a intencional falta de conteúdo. Pode-se contar com isso para chamar a atenção da mídia, geralmente preocupada com a velha questão: será que isso é arte?
Agressivo, porém educacional
Já chamado de "Turner alemão" e com um prêmio à altura em dinheiro (50 mil euros), o Prêmio da Galeria Nacional para Arte Jovem pode estar tentando o mesmo caminho em seu objetivo de levar a arte a um público maior. Mas, ao nomear artistas como Bonvicini, Bock, Anri Sala e Angela Bulloch, o prêmio está dando uma chance para quatro artistas de reputação internacional estabelecida – mesmo que eles não ofereçam diversão para a família toda.
"A arte contemporânea chama muito menos a atenção do grande público do que a arte moderna do século 20, por exemplo", reclama Jäger. "Ela é geralmente agressiva, provocadora e, por isso, nem sempre popular. A natureza competitiva do prêmio e sua conseqüente publicidade são uma maneira de aumentar a percepção da arte contemporânea e atiçar a curiosidade do público."
Mas ela também tem um valor educacional. "Ela pode ser incompreensível até que você se esforce para compreendê-la", disse Peter Raue, da associação Amigos da Galeria Nacional. "Aí tudo se torna muito esclarecedor. E, no final das contas, este deveria ser um prêmio popular."
A arte como servente
Em todo caso, segundo Ursula Prinz, vice-diretora da apreciada Berlinische Galerie na capital alemã, toda arte contemporânea pode ser descrita como chocante. "A provocação é uma parte integrante da arte de hoje", explica. "Vivemos em uma cultura de grandes eventos, tudo tem que gerar rebuliço."
Para muitos, essa é uma tendência que potencializa museus medíocres e deixa o público entediado diante de tudo que não seja transgressor. "Isso significa, claro, que muito da arte menos espetacular passa pela peneira, o que é um pouco lastimável", admite Prinz. "Projetos menos high-profile acabam nem tendo chance. A arte como evento está na ordem do dia, em detrimento da arte menos extravagante."
O que não significa que a arte que chame atenção seja necessariamente ruim. "Eventos como esse prêmio são, antes de mais nada, um meio de levar as pessoas aos museus", admite. "Nesse sentido, eles não podem fazer mal."
Antes conceitual que figurativo
O ponto forte do novo prêmio alemão certamente não está na velha escola. Priorizando performances, vídeos e instalações, o dinheiro será usado para incentivar experimentos – outro vínculo inconfundível com o Turner, que sempre foi mais conceitual que figurativo. E, mesmo que os organizadores critiquem a histeria da mídia, a arte alemã só tem a lucrar com isso.
"Todo mundo quer saber quem ganhou o Turner", argumenta Ursula Prinz. "Se conseguirmos atingir o mesmo efeito na Alemanha, será uma bênção para todos."
Individual, internacional
Mas embora o Turner sempre tenha gerado opiniões extremas, boa parte da atenção que ele recebe é desfavorável. A arte bizarra é ótima na teoria, mas será que ela não acaba alienando o público? Segundo os organizadores do prêmio alemão, eles cobriram todas as facetas.
"Táticas de choque têm a vantagem do apelo de massa, mas a desvantagem de refletir apenas um lado da arte contemporânea", disse Jäger. "O Prêmio da Galeria Nacional almeja atrair multidões, mas também se preocupa em analisar com seriedade o estado da arte hoje em dia. A seleção do júri representa quatro posições bem diferentes."
E também representa diferentes nacionalidades. Ao contrário do Turner, que é focado em artistas que vivem e trabalham na Grã-Bretanha, porém freqüentemente só nomeiam artistas britânicos, o Prêmio da Galeria Nacional possui uma lista bem internacional de nomeados. Em verdade, a participação de artistas alemães é visivelmente menor.
Assim como é menor a presença da pintura tradicional – quem esperar uma boa amostra da atualmente tão falada Nova Escola de Leipzig, por exemplo, ficará decepcionado.
Mas isso só mostra como a cena artística alemã tem a mente aberta. "O prêmio procura focar-se em desenvolvimentos artísticos internacionais na Alemanha, e não apenas na arte alemã", conclui Jäger.
A exposição do Prêmio da Galeria Nacional para Arte Jovem vai até 16 de outubro no museu Hamburger Bahnhof.