Fim do sigilo bancário?
22 de fevereiro de 2009Os danos do banco UBS à estabilidade da Suíça podem ser maiores do que se imaginava na semana passada, quando se tornou público na quarta-feira (18/01) o acerto entre a maior instituição bancária do país alpino e autoridades fiscais dos Estados Unidos.
Pelo acordo, o banco se comprometeu a repassar a investigadores dos EUA informações bancárias de 300 correntistas americanos e a pagar uma multa de 780 milhões de dólares. No último sábado, a Justiça suíça proibiu o UBS de quebrar o sigilo bancário dos correntistas, mas o banco informou que as informações já haviam sido repassadas na quarta-feira.
O UBS admitiu ter ajudado clientes americanos a sonegar impostos. "Em determinados setores da empresa tolerou-se uma cultura de não cumprir com rigor certas leis estrangeiras. E lamentavelmente isso fez com que certos funcionários ajudassem cidadãos americanos a lograr seu governo", assumiu o presidente do UBS, Peter Kurer.
Segundo o fisco americano, entre 2002 e 2007 foram desviados cerca de 20 bilhões de dólares, sobre os quais incidiriam 300 milhões de dólares em impostos.
Se não fornecesse as informações, o UBS estaria sujeito a uma ação penal, além de ficar ameaçado de não poder mais operar nos Estados Unidos. Um porta-voz do banco disse que o processo judicial significaria uma séria ameaça à existência da instituição. O ministro suíço das Finanças, Hans-Rudolf Merz, defendeu a atitude do banco e disse que se trata de um caso de sonegação fiscal que também é passível de punição na Suíça.
Na opinião de muitos analistas, a capitulação do UBS ante o governo americano é o fim do famoso sigilo bancário suíço, base da economia local e que foi instituído em 1934. "Trata-se de uma verdadeira catástrofe para a principal indústria do país" afirmou à emissora Radio Suisse Romande o ex-parlamentar Charles Poncet.
A imprensa suíça fala em "bomba" e "capitulação" e diz que o sistema bancário foi atingido num ponto fundamental. Já Merz diz que o sigilo bancário suíço permanece intacto.
Na sexta, a situação no meio político suíço piorou ainda mais com a notícia de que o governo americano também está exigindo, por meio de uma ação civil num tribunal da Flórida, o repasse de informações de mais 52 mil contas bancárias de cidadãos americanos.
Pilar da economia suíça
Na Suíça estão depositados mais de 2,6 trilhões de francos suíços (1,7 trilhão de euros) em capital estrangeiro. A maior parte desse dinheiro está nos cofres do UBS, maior instituição daquele que é o principal segmento da economia do país: o setor bancário e financeiro.
O setor representa cerca de 15% do Produto Interno Bruto (PIB) e contribui com 16% dos impostos recolhidos pelo governo suíço. Somados, os ativos do UBS e do segundo maior banco suíço, o Credit Suisse, equivalem a sete vezes o PIB do país.
Bancos e financeiras geram em torno de 200 mil empregos, o que corresponde a mais ou menos 5% de todos os postos de trabalho do país. Críticos como o sociólogo Jean Ziegler, antigo relator da ONU para o Direito à Alimentação, alertam há anos que essa situação significa uma dependência muito grande do setor financeiro.
Na sexta ainda não estava claro se o Credit Suisse poderia estar envolvido em negócios semelhantes com clientes americanos. Mas especialistas dizem que não há perigo para a maioria dos 300 maiores bancos do país.
Já o UBS, afirma a autoridade suíça de controle financeiro Finma num relatório, cometeu graves infrações a determinações da legislação bancária suíça e apresentou "graves deficiências no tratamento dos riscos legais de seus negócios com clientes americanos".
Brecha para outros países
A situação também se complicou para o ministro Merz. Ele é acusado de não ter reconhecido em tempo o risco envolvido nas investigações do fisco americano, que já duram mais de um ano. O presidente da Finma, Eugen Haltiner, disse à emissora Schweizer Radio DRS que os políticos falharam no cumprimento de suas tarefas.
Outro temor que se alastra nos meios econômicos e políticos suíços é o de que a atitude americana sirva de exemplo para outros países, principalmente para a União Europeia. A Comissão Europeia saudou a notícia do acordo entre o UBS e os Estados Unidos. Uma porta-voz disse esperar que países-membros recebam o mesmo tratamento caso apresentem queixas.
Há anos que a Alemanha e a França atacam o sigilo bancário suíço na Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). O ministro alemão das Finanças, Peer Steinbrück, já chegou a afirmar que, com países como a Suíça, deve-se usar também o chicote.