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Portugueses temem fim do Estado social

Tilo Wagner (rc)13 de abril de 2013

Em meio a protestos, Portugal precisa cortar gastos públicos. Nos próximos dias a troica chegará a Lisboa com o objetivo de, juntamente com o governo, buscar soluções para a delicada situação econômica do país.

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Foto: picture-alliance/dpa

Mais de 800 pessoas chegam todos os dias ao maior centro de atendimento de emergência de Portugal, no Hospital Santa Maria, em Lisboa. No prédio de oito andares, construído na década de 1950, há quase 7 mil funcionários. Entre eles, a estudante de medicina Beatriz Dias, que se preocupa com as consequências dos novos cortes no sistema de saúde.

"Nosso país está em crise há muitos anos, e agora a situação piorou ainda mais. Até mesmo equipamentos básicos estão em falta. O setor de oncologia não tem como garantir o tratamento de todos os pacientes", conta Beatriz.

No último domingo (07/04), o primeiro-ministro Pedro Passos Coelho anunciou cortes nos orçamentos da Saúde e de programas sociais. O governo conservador precisa levantar 1,2 bilhão de euros para cobrir o rombo nas contas do país, depois de o Tribunal Constitucional ter decidido que os cortes nos salários dos aposentados e funcionários públicos – uma parte das medidas de austeridade acertadas com os credores internacionais – seriam inconstitucionais.

Passos Coelho quer adiantar a implementação de uma ampla "reforma do Estado" que estava planejada apenas para o ano que vem. Além disso, a troica de credores internacionais – Comissão Europeia, Banco Central Europeu (BCE) e Fundo Monetário Internacional (FMI) – já preparou uma proposta para reduzir os gastos do governo em até 4 bilhões de euros.

Krankenhaus Santa Maria Lissabon Portugal
Hospital Santa Maria em Lisboa: maior centro de atendimento a emergências do paísFoto: DW/T.Wagner

O setor da educação também terá que se adaptar aos novos cortes. O orçamento das universidades foi reduzido em 10%. O estudante Daniel Bonga da Universidade de Lisboa não concorda com a atitude do governo. "Se o aperto às universidades continuar, a qualidade dos cursos será afetada. Com um sistema educacional ruim, não haverá mais saída para a crise."

Apesar dos protestos

As principais organizações populares do país já anunciaram a realização de protestos em massa, no intuito de mobilizar a população contra o que consideram um desmantelamento do Estado de bem-estar social.

Daniel Bonga Masterstudent Universität Lissabon Portugal
O estudante Daniel Bonga reclama dos cortes na educaçãoFoto: DW/T.Wagner

A "reforma do Estado" já vem sendo discutida há meses em Portugal. João César das Neves, professor de economia da Universidade Católica de Lisboa, acredita que a decisão do Tribunal Constitucional pode até ajudar o governo.

"Em vez de reduções temporárias nos salários, que podem ser implementadas com relativa facilidade, o governo tem agora que se impor contra os poderosos grupos de interesse com o objetivo de renovar o sistema", opina.

Por sorte, afirma Neves, a intenção do governo não é aumentar os impostos, o que poderia ser fatal na situação atual. "Se os cortes forem feitos onde realmente são necessários, Portugal só poderá lucrar", completa.

Socialistas exigem eleições antecipadas 

Mas o atual momento pode não ser o melhor para uma reforma ousada do Estado. A coalizão governista de centro-direita tem uma maioria confortável no Parlamento, além de contar com o apoio do ex-presidente Cavaco Silva. Mas, ainda assim, enfrenta a resistência dos sindicatos, dos partidos de esquerda, de organizações populares, além de entrar em confronto direto com os socialistas moderados, que formam o maior partido de oposição no Legislativo e já exigem a convocação de novas eleições. 

Wirtschaftsprofessor Joao Cesar das Neves von der Katholischen Universität Lissabon
João César das Neves acredita que decisão constitucional pode ajudar governoFoto: DW/T.Wagner

Essa situação levou à ruptura da aliança não oficial dos partidos moderados, que até agora estavam comprometidos com o programa de austeridade da troica. Na visão do cientista político Pedro Adão e Silva, isso se deve principalmente à coalizão de centro-direita.

"Desde o início, o governo se manteve distante dos socialistas, o que foi um erro. Eles deveriam ter sido incluídos, principalmente, nas negociações com a troica", analisou o cientista político.

Demissões em massa

A Comissão Europeia e o governo alemão já afirmaram que Portugal deve ter como prioridade angariar fundos para cobrir o rombo nos cofres públicos. Apenas a partir daí o país estará apto a receber a próxima parcela dos 78 bilhões de euros do pacote de ajuda que os portugueses haviam negociado já há dois anos.

Pedro Passos Coelho Portugal Premierminister
Primeiro-ministro Pedro Passos Coelho deverá enfrentar novos protestosFoto: picture alliance/AP Photo

Nos próximos dias, a troica chegará a Lisboa com o objetivo de, juntamente com o governo, buscar soluções para essa complicada situação.

Mais de 100 mil funcionários públicos poderão perder seus empregos em consequência da "reforma do Estado". As mudanças deverão ser aprovadas pelo Tribunal Constitucional, que recentemente decidiram contra o orçamento do governo.

"Uma vez que as reformas estejam em progresso, novas queixas serão encaminhadas ao Tribunal Constitucional", observa o economista João Neves. "Se a corte decidir contra algumas partes da reforma, a crise poderá se agravar ainda mais. Espero que os juízes se deem conta de que nosso país precisa de mudanças profundas, para que possamos viver livres mais uma vez".