Portugal diz não ter planos de indenizar ex-colônias
28 de abril de 2024Após o presidente português Marcelo Rebelo de Sousa defender medidas de compensação a ex-colônias e ser procurado pelo Brasil para conversas, o governo português anunciou neste sábado (27/04) que não planeja pagar reparações pela escravidão e pelo colonialismo.
No início da semana, falando a jornalistas estrangeiros, Rebelo de Sousa disse que Portugal "assume total responsabilidade" por erros do passado e que crimes cometidos durante a era colonial tiveram "custos". "Temos que pagar os custos", declarou, defendendo ainda que o país tinha a "obrigação" de liderar esse processo de reparação. "Há ações que não foram punidas e os responsáveis não foram presos? Há bens que foram saqueados e não foram devolvidos? Vamos ver como podemos reparar isso."
Na época, o presidente sugeriu que essas reparações poderiam se dar mediante o cancelamento de dívidas de ex-colônias, desenvolvimento de programas especiais de cooperação ou por meio da oferta de financiamento.
Após a declaração do presidente, a ministra brasileira de Igualdade Racial, Anielle Franco, disse ter procurado o governo português para conversar sobre "ações concretas".
Lisboa fala em "reconciliação"
Em pronunciamento neste sábado, o governo português disse que busca "aprofundar relações mútuas, respeito pela verdade histórica e uma cooperação cada vez mais intensa e estreita, baseada na reconciliação de povos irmãos", e que não há nenhum "processo ou programa de ações específicas" para o pagamento de reparações.
Lisboa disse ainda manter relações "verdadeiramente excelentes" com suas ex-colônias, o que inclui cooperações financeiras e econômicas.
Desde março, Portugal é governado por uma coalizão de centro-direita, a Aliança Democrática. A mudança se deu após a convocação de eleições na esteira da renúncia do primeiro-ministro, o socialista Antonio Costa, suspeito de corrupção.
Portugal traficou quase 6 milhões de africanos
Pelo menos 12,5 milhões de africanos foram sequestrados e transportados à força por navios europeus e vendidos como escravos nos séculos 15 a 19, embora algumas estimativas citem 20 ou 30 milhões. Aqueles que sobreviveram à viagem brutal acabaram trabalhando em condições desumanas nas Américas, principalmente no Brasil e no Caribe, garantindo enormes lucros para seus proprietários.
O comércio de escravizados era dominado pela Grã-Bretanha e por Portugal, embora os EUA, a Holanda, a Espanha, a França, a Dinamarca e a Suécia também estivessem bastante envolvidos.
Portugal traficou quase 6 milhões de africanos, mas até agora não confrontou seu passado e pouco se ensina sobre seu papel na escravidão transatlântica nas escolas. Em vez disso, a era colonial de Portugal, durante a qual países como Angola, Moçambique, Brasil, Cabo Verde e Timor Leste, bem como partes da Índia, foram submetidos ao domínio português, é frequentemente vista como uma fonte de orgulho – muito embora a emancipação de alguns países africanos só tenha vindo em 1974, com a queda da ditadura salazarista.
Ativistas de direitos humanos defendem a definição de reparações e de políticas públicas para combater desigualdades relacionadas ao período colonial, incluindo o racismo sistêmico.
ra (Reuters, Lusa)