Por que as tensões entre China e Taiwan estão aumentando?
9 de outubro de 2021Nos primeiros dias de outubro, dezenas de caças chineses sobrevoaram até 149 vezes nos arredores de Taiwan, no que parece ser a mais recente tentativa de pressionar a ilha autônoma através da exibição do poderio militar de Pequim.
Ainda que ocorram em espaço aéreo internacional, os voos levaram as forças de defesa taiwanesas a responder rapidamente com o lançamento de jatos, aumentando o temor de que qualquer erro de cálculo pudesse levar a uma escalada inesperada.
O ministro da Defesa de Taiwan descreveu a situação atual como a mais grave em 40 anos.
"Essa tem sido a situação mais difícil nos meus 40 anos de carreira militar", disse a parlamentares na quarta-feira (06/10) o ministro da Defesa, Chiu Kuo-cheng.
O comentário foi feito um dia após o presidente de Taiwan, Tsai Ing-Wen, alertar sobre "consequências catastróficas" caso a ilha autônoma caia nas mãos de Pequim, enfatizando que Taiwan fará de tudo para se defender se sua democracia e seu modo de vida forem ameaçados.
As investidas acontecem num momento em que a China enfrenta maior resistência dos países da região e uma presença naval crescente dos Estados Unidos e de outras democracias ocidentais na Ásia, enquanto Taiwan clama por mais apoio e reconhecimento global.
Pressionando Taipei
Pequim vê Taiwan como uma província que se separou da China continental em meio à guerra civil de 1949. Com o objetivo de minar o governo de Tsai, inclinado à independência, a China tem mobilizado cada vez mais pressão militar, diplomática e econômica, enquanto ameaça colocar a ilha sob o controle do Partido Comunista Chinês (PCC).
O número recorde de voos militares chineses perto de Taiwan na semana passada mostra que Pequim está preparada para aumentar a pressão sobre a liderança taiwanesa.
Para Song Yu-Ning, editor sênior da revista Defense International, as atividades militares da China têm como objetivo pressionar Taipei.
"Não sabemos a razão por trás disso, mas a intensidade dos exercícios militares pode aumentar as chances de incidentes capazes de desencadear uma guerra", disse ele à DW, alertando que Taiwan deve ter cautela em sua resposta às provocações de Pequim.
Ainda assim, alguns especialistas avaliam como baixo o risco de as recentes tensões saírem do controle.
"Não devemos nos concentrar apenas no número de aeronaves, mas no tipo de caças", disse à DW Lin Ying-yu, professor assistente de assuntos da região Ásia-Pacífico na Universidade Sun Yat-sen.
Por exemplo, se o Exército de Libertação Popular enviar modelos KJ-500 (aeronaves de controle e alerta antecipado de terceira geração) para a zona de identificação de defesa aérea de Taiwan, poderia ser "alarmante, mas ainda é muito arbitrário dizer, a partir desses sinais, que a China invadirá Taiwan", avalia Lin.
Taiwan não é assunto urgente para Pequim
Wen-Ti Sung, professor de Estudos de Taiwan na Universidade Nacional da Austrália, disse à DW que a China, atualmente, não tem capacidade militar e nem vontade política para lançar um ataque militar em grande escala contra Taiwan.
Ele afirma que embora seja uma questão importante, Taiwan não é assunto urgente para a China.
De acordo com Sung, a liderança chinesa está mais focada em lidar com questões internas, como o sexto plenário do 19º Comitê Central do PCC, que está por vir, e o 20º congresso do partido, que deve selar o acordo nos termos do presidente Xi Jinping e o lugar que seu governo ocupará na história do PCC.
"Além disso, o objetivo econômico de 'prosperidade comum' é uma prioridade", disse Sung.
Estrategicamente, faz mais sentido que a China permaneça paciente e espere até que o equilíbrio militar esteja mais favorável para Pequim antes de considerar a opção de unificação pela força, ressaltou o especialista.
Lin, o professor assistente da Universidade Sun Yat-sen, também acredita que começar uma guerra é a última opção para a China. Ele enfatiza que moldar a visão de Taiwan sobre a China e o PCC, além de unificar a ilha pacificamente com o continente, seria a escolha preferida de Pequim.
'Já virou rotina'
Apesar dos temores de uma escalada militar entre os dois lados, o povo taiwanês não parece muito preocupado com a situação.
"As provocações da China são óbvias. É como se o meu vizinho estivesse atirando em meu quintal – não estou com medo, mas com raiva", disse Joyce Huang, de 36 anos, à DW. Quanto mais caças a China enviar, acrescenta, mais hostilidade os taiwaneses vão sentir.
Desde que Tsai Ing-wen assumiu o cargo em 2016, as pessoas em Taiwan estão acostumadas com a China realizando exercícios militares nas proximidades da ilha.
"Já virou rotina. A 'performance' geralmente acontece em dias importantes. Não tenho medo, pois acontece com muita frequência", disse Huang.
Uma taiwanesa de meia-idade entrevistada pela DW gostaria que Taiwan e China se relacionassem pacificamente. "Não precisamos buscar a independência, apenas manter o status quo", disse ela.
Sung, o especialista em relações entre China eTaiwan, disse que o povo taiwanês está acostumado a esse tipo de sutis provocações militares chinesas. "Eles têm vivido na presença quase constante de pressão militar e diplomática chinesa por mais de um quarto de século, desde que Taiwan realizou sua primeira eleição presidencial direta, em 1996", aponta.