Extremismo na África
12 de agosto de 2010Raptos na região do Sahel vitimam geralmente cidadãos ocidentais – ao menos é o que as manchetes da mídia europeia dão a entender. O último caso ocorreu no final de julho, quando foi encontrado o cadáver do francês Michel Germaneau, de 78 anos.
Mas também os moradores da região são vítimas do terrorismo, que afeta os seus meios de subsistência. Muitos deles dependem há séculos do comércio e, desde há algumas décadas, também do turismo.
Os tuaregues, por exempo, são um orgulhoso povo do deserto. Com seus grandes e brilhantes lenços azuis e brancos na cabeça, eles são um símbolo para o turismo no Saara, região onde moram.
Ou ao menos eram, até alguns anos atrás – nesse meio tempo o turismo no Saara praticamente desapareceu. A falta de segurança, os sequestros, os assassinatos de visitantes ocidentais geraram manchetes e alertas contra viagens à região.
Turistas ficam longe
O terrorismo teve consequências devastadoras para o seu povo, afirma o tuaregue Mano Aghali. Ele descreve como o terrorismo roubou o sustento das pessoas na região de Agadez, no norte do Níger:
"Muitos de nós viviam do turismo: os vendedores e principalmente os guias turísticos. A assim chamada rebelião de 2007 e as suas consequências foram um verdadeiro choque para essas pessoas, pois há poucas opções para elas fazerem outras coisas. A maioria nem mesmo participou da rebelião, nunca lutou. E hoje não têm ocupação."
O que Aghali chama de "segunda rebelião" começou em 2007: ataques violentos a policiais e militares e combates entre rebeldes e soldados elevaram a insegurança no norte do Níger.
Tráfico de drogas e armas
Mas essa revolta, descrita pelo governo como uma rebelião dos tuaregues, foi diferente da anterior, na qual os tuaregues haviam lutado por melhorias na região e por maior participação política. A nova onda de violência iniciada em 2007 não tinha nada a ver com causas políticas dos tuaregues, como Aghali aponta.
"A verdadeira força motriz do conflito não eram os tuaregues, mas pessoas que queriam lucrar com o tráfico de drogas e de armas na região. Elas usaram as causas dos tuaregues como escudo protetor das suas ações, escondendo-se atrás da afirmação: 'Deixem-nos lutar pelas causas dos tuaregues! Deixem-nos lutar pelas causas da região de Agadez!'"
Como deputado, Aghali se empenha exatamente por essas causas. Como fundador da ONG Hedtamat, ele quer aumentar as chances de educação e formação profissional e trazer desenvolvimento para os tuaregues do Níger, sua terra natal.
Aghali luta há anos por uma melhor representação do seu povo no Parlamento, em partidos políticos e em instituições. E isso – melhores condições para o seu povo – não estava em questão em 2007, explica.
Para ele, desde o início o conflito foi uma grande derrota para o seu povo e para todo o país, pois destruiu os meios de subsistência numa região já marcada pela pobreza extrema e contribuiu para a disseminação do terrorismo. "Toda a região é uma área de insegurança. Os antigos rebeldes continuam por lá, toda região está cheia de minas. E novos atores estão se espalhando."
Terroristas em diversas regiões africanas
Mas que "novos atores" são esses? Em todo o continente africano há hoje uma série de grupos extremistas islâmicos ativos. E muitos deles cometeram atos terroristas nas últimas semanas.
Já há cinco anos que o grupo autointitulado Boko Haram (algo como "Educação é Pecado") aterroriza regiões do norte da Nigéria. Entre o estado de Bauchi e a região de Agadez encontram-se cerca de mil quilômetros de terra de ninguém. E em toda a área do Sahel, do sul da Argélia até o Níger, pequenos grupos da Al-Qaeda de Magreb espalham insegurança desde 2006.
No leste do continente, o estado fracassado da Somália é o ponto de partida de terroristas islâmicos para as regiões vizinhas: recentemente houve atos terroristas sangrentos em Uganda.
Entre os grupos terroristas ativos no Níger há muitos integrantes que não falam os idiomas locais: eles devem vir da Ásia ou de outras regiões da África, diz Aghali. Mas a eles se unem militantes locais, que são mais uma vez instrumentalizados.
"As pessoas na minha região correm o risco de serem manipuladas pela segunda vez. A primeira foi em 2007, com a onda de violência chamada de rebelião dos tuaregues. 'Venham, venham!', diziam na época, 'nós lutamos pelas causas dos tuaregues!". Na verdade tratava-se apenas de tráfico de drogas e de armas. E hoje dizem às mesmas pessoas, na mesma região, no mesmo país: "Vamos lutar em nome do Islã!"
Espaço para a proliferação do terrorismo
A África é um espaço ideal para o terrorismo internacional. Na Somália, assim como no Afeganistão, no Paquistão e no Iêmen, a Al Qaeda usa o vácuo criado pela fraqueza do Estado. Outras áreas do continente estão totalmente fora de controle, desconectadas dos centros políticos, sem polícia ou forças armadas.
É assim que a África se torna uma área de refúgio e proteção para o terrorismo internacional. É sintomático que os atos terroristas proliferem onde a pobreza e o subdesenvolvimento predominam, como no norte da Nigéria. Lá é fácil conquistar seguidores. E as poucas chances de desenvolvimento nessas regiões correm o risco de desaparecer, como consequência do terrorismo.
Ajuda ao desenvolvimento em risco
No Níger, a cooperação oficial para o desenvolvimento está suspensa desde o recente golpe militar. E também o trabalho desenvolvido pela Hedtamat estará ameaçado caso não haja apoio externo. Isso elevaria ainda mais a pobreza e o perigo do extremismo.
Os tuaregues recebem ajuda dos escritórios da organização humanitária Care na Alemanha e em Luxemburgo, que há muitos anos trabalham em conjunto com a Hedtamat. O apoio necessita ser mantido neste momento, afirma coordenadora de projetos Christine Harth, da Care. Ela conhece bem a região e trabalha com os tuaregues da Hedtamat.
"Nós gostaríamos que fosse garantido mais espaço para as ONGs nos países em que a ajuda ao desenvolvimento oficial é cancelada. Gostaríamos de continuar nosso trabalho com parceiros como a Hedtamat, também para poder transmitir às pessoas a certeza de que elas não serão abandonadas."
Autora: Ute Schaeffer (jd)
Revisão: Alexandre Schossler