Países europeus se recusam a acolher objetores russos
10 de outubro de 2022Longas filas de carros nas fronteiras russas com Geórgia, Finlândia e Cazaquistão, voos cheios para Sérvia, Dubai e até Belarus. Russos fogem do país em massa nos últimos dias para evitar a assim chamada "mobilização militar parcial" decretada pelo presidente russo, Vladimir Putin, a fim de reforçar suas tropas na Ucrânia, pressionadas pelos avanços ucranianos.
Mas na Europa, muitos países estão batendo a porta na cara dos que fogem do recrutamento militar russo. A Finlândia fechou recentemente suas fronteiras, e outros países não estão emitindo vistos para refugiados russos. Correspondentes da DW relatam sobre a situação em Estados como República Tcheca, Polônia e Grécia.
República Tcheca: medo de espiões russos
O presidente tcheco, Milos Zeman, se diz a favor da acolhida dos russos que não querem combater: "Acho que devemos dar vistos a eles, assim como aos refugiados ucranianos." Zeman era defensor de Putin até 2021, mas desde então se tornou um ferrenho oponente do presidente russo. Contudo os argumentos do chefe de Estado não convenceram o governo em Praga.
Apenas dissidentes são acolhidos, mas não a objetores. O ministro tcheco do Exterior, Jan Lipavsky, afirma que russos que fogem da mobilização não são elegíveis para vistos humanitários. "Quem foge do país porque não quer cumprir a obrigação imposta pelo seu próprio Estado não cumpre os requisitos para um visto humanitário", disse ao site de notícias CT24.
Lipavsky se justifica com considerações de segurança do país, entre outros aspectos. "Não pode ser nosso objetivo ter desertores circulando pelo nosso país. Isso também traria um risco de segurança. Pode haver agentes russos entre eles."
O chefe da diplomacia tcheca afirma que vem trabalhando há muito tempo para enfraquecer a influência dos serviços secretos russos na Europa. Em 2021, a República Tcheca expulsou 81 diplomatas russos suspeitos de espionagem, responsabilizados por um ataque a um depósito de munição em 2014.
Desde o início da guerra de agressão russa em fevereiro de 2022, a República Tcheca parou de emitir vistos de turista para russos. Numa cúpula informal de ministros do Exterior da União Europeia, em 31 de agosto na capital tcheca, Praga propôs, sem sucesso, uma suspensão de vistos para cidadãos russos em toda a UE. No final, os países-membros chegaram a um acordo: os vistos não devem ser recusados, mas sua emissão deve ser mais cara e complicada. "É um bom passo, mas não o suficiente", disse Lipavsky na época.
Polônia: dissidentes sim, desertores não
Varsóvia também levanta preocupações de segurança. O ministro do Exterior polonês, Zbigniew Rau, disse ser "altamente desaconselhável" acolher um grande número de russos, tanto do ponto de vista da política de segurança quanto do ponto de vista moral. E o vice-ministro do Interior, Marcin Wasik, alertou que funcionários dos serviços secretos russos poderiam se infiltrar sob o pretexto de fugir do serviço militar.
"Não queremos receber cidadãos russos que até agora apoiaram o regime de Putin e agora se tornam grandes democratas, porque provavelmente terão que ir para o front e planejam deixar a Rússia", disse em entrevista de rádio Michal Dworczyk, chefe de gabinete do primeiro-ministro polonês, Mateusz Morawiecki. Entretanto, ele garantiu que seu país não fechará as fronteiras para ativistas dos direitos humanos perseguidos por suas convicções políticas.
O tema é discutido de forma controversa na mídia. O jornal liberal-conservador Rzeczpospolita se diz contra a admissão de fugitivos da mobilização militar russa. "As estatísticas russas mostram que quase 80% da população apoia Putin e sua agressão contra a Ucrânia", lembra o comentarista, assegurando que o fechamento da fronteira polonesa não é "retaliação cega" ou "responsabilização coletiva", mas "um golpe contra a base silenciosa desse poder na sociedade".
Já o publicitário conservador Lukasz Warzecha defende uma "atitude pragmática": "Encorajar soldados a desertar é um dos melhores e mais antigos métodos de sabotagem. Putin nos deu essa oportunidade de bandeja", escreve no portal online Onet. "Nosso objetivo continua sendo o enfraquecimento da Rússia"
A Polônia já havia restringido drasticamente a entrada de cidadãos russos em 19 de setembro: turistas, empresários, atletas e artistas russos estão barrados desde então. No entanto, as fronteiras polonesas não são hermeticamente fechadas, mesmo para desertores do serviço militar. O portal Wirtualna Polska noticiou sobre o russo Alexander, de 32 anos, que chegou facilmente à capital polonesa de avião vindo de Moscou, através de Turquia e Hungria.
Grécia não dá refúgio a desertores
Até agora, nenhum russo em idade de serviço militar pediu refúgio na fronteira da Grécia. Ele teria que ter passado através da Turquia, cuja fronteira está fechada para todos os refugiados. Se os russos que fogem do serviço militar chegassem à Grécia, de qualquer maneira, provavelmente não seriam bem-vindos.
A legislação grega não prevê concessão de refúgio para quem objeta servir o exército de seu país. A deserção é considerada crime, e delinquentes não têm direito a asilo na Grécia.
O direito de refúgio só é concedido a russos que possam provar que foram perseguidos por motivos políticos, religiosos ou outros. Mesmo no debate público, não há disposição para considerar como dissidentes políticos aqueles que fogem da "mobilização parcial" russa.
Em vez disso, a expectativa de grande parte da opinião pública grega é que eles permaneçam em seu país e lutem, contra o inimigo ou contra o ditador. No caso da Rússia, além disso, acredita-se que os homens que agora estão tentando desertar ou fugir não tenham se oposto a Putin e a sua guerra de agressão.
Entretanto a opinião pública grega vê de forma bastante diferente os membros da minoria grega na Ucrânia, cuja maioria vive em torno de Mariupol, em áreas ocupadas pela Rússia. Estes seriam bem-vindos se pedissem refúgio, mesmo os pró-russos.