Parceria franco-germânica lança livro de História para estudantes
10 de julho de 2006Com duas sangrentas guerras mundiais e a constituição da União Européia em seu histórico, as relações franco-germânicas tiveram seus altos e baixos durante o decorrer do século 20. O que seria impensável há 60 anos tornou-se realidade: França e Alemanha se uniram para criar o primeiro livro de História escrito em parceria por dois países.
Publicado em junho, na França, o livro Histoire/Geschichte: Europa und die Welt seit 1945 (História a europa e o mundo após 1945), da editora alemã Klett Verlag e da francesa Éditions Nathan, estará disponível nas livrarias da Alemanha a partir desta segunda-feira (10/07).
"O livro oferece sempre, no mínimo, dois pontos de vista, o que permite que os jovens desenvolvam a sua própria forma de olhar a História. Isso é muito útil dentro de um ensino liberal e democrático", diz Peter Geiss, um dos organizadores.
Efeito psicológico
Dez historiadores, cinco de cada país, trabalharam no projeto do livro bilateral, que foi editado nas duas línguas e será usado nas aulas de História para o segundo grau já no próximo semestre. A publicação não é só um marco nas relações franco-germânicas, mas também dentro da Alemanha, onde, pela primeira vez, um livro foi aprovado para ser utilizado nas escolas dos 16 Estados federados.
O livro tem significado educacional, mas seu efeito psicológico não é menos importante, anunciou o Ministério alemão de Relações Exteriores: do mesmo livro, jovens alemães e franceses irão aprender sobre suas próprias histórias e sobre sua história conjunta enquanto europeus.
Iniciativa estudantil
Naturalmente, os estudantes são o público-alvo do livro, mas eles também foram seu impulso inicial. Participantes do Parlamento Jovem França-Alemanha propuseram o projeto, em 2003, durante o encontro pelo 40º aniversário do Tratado de Amizade Franco-germânico, e a demanda foi acatada pelo Ministério alemão de Relações Exteriores e pelo Ministério francês de Educação.
Como é evidente também na forma como foi concebido, o projeto é resultado de compreensão bilateral, assim como uma ferramenta para que se estabeleçam relações ainda melhores entre os países, no futuro.
Duas culturas, duas visões
"Na Alemanha, nós procuramos dar bastante espaço para que os jovens encontrem suas próprias fontes de informação. Nos empenhamos por não apresentar os dados de uma forma muito esquemática, mas nem sempre foi fácil para nossos parceiros compreender que certas questões podem permanecer em aberto", explica Geiss.
A forma de apresentar as informações não foi a única dificuldade que o time designado para escrever o livro precisou enfrentar – as informações em si eram alvo de discussões. Os autores não se esforçaram para esconder suas diferenças, diz Geiss, mas para explicá-las.
"Para a França, tradicionalmente, os Estados Unidos são considerados um país todo-poderoso e uma espécie de rival. Mas as coisas não são assim para os alemães. Depois de 1945, os EUA deixaram de significar rivalidade. A opinião pública alemã sempre relembra as contribuições norte-americanas no programa de auxílio político-econômico. A reconstrução da Alemanha é associada à presença americana", diz Geiss.
O comunismo se mostrou outra questão delicada. Enquanto o movimento comunista teve importância política na França dos anos 50 e 60, ele é associado, na Alemanha, à ditadura, ao regime do Leste alemão e à expansão soviética.
Cerca de 80% do conteúdo do livro é idêntico em ambas as línguas, informa a assessoria de imprensa do Ministério de Educação, Ciência e Cultura de Mecklemburgo-Pomerânia Ocidental. A forma de tratamento dada aos EUA e à história do comunismo na RDA difere, assim como a apresentação da história colonial francesa e da Igreja cristã.
Confrontando a Segunda Guerra Mundial
O título do livro deixa evidente que seu conteúdo começa depois da Segunda Guerra Mundial, deixando de lado os capítulos mais delicados da história mundial. Dois "descendentes" já estão na fila de espera: um livro cobrindo desde o Congresso de Viena até o final da Segunda Guerra deve ser publicado entre 2007 e 2008 e outro, da Antigüidade até a Era Napoleônica, deve estar disponível já no próximo ano.
Histoire/Geschichte representa na França uma inovação no que diz respeito ao tratamento dado ao pós-guerra. "Esse tópico nunca foi ensinado na França", diz Frédéric Munier, professor da Universidade Henri 4º. "Agora o livro oferece uma porção de documentos e análises, o que permite que os alunos franceses entendam melhor sua própria história."
"Fontes primárias oferecem aos estudantes novos insights sobre si próprios e sobre seus vizinhos", diz Daniel Henry, um dos cinco autores franceses do livro e cita o exemplo do discurso do antigo presidente Richard von Weiszäcker no 40º aniversário do fim da Segunda Guerra.
Uma progressão natural
Para os estudantes, o livro apresenta uma grande vantagem: muitas fotos. E mesmo o fato de os alunos terem hoje esse livro à disposição é historicamente notável, considerando as circunstâncias dos conflitos entre Alemanha e França no século 20.
"Para os adolescentes de hoje em dia, pode parecer natural e interessante ter um texto franco-germânico de História", diz Munier, "mas a minha avó ainda está horrorizada com a idéia."