Papa compara muro de Trump ao de Berlim
29 de maio de 2019O papa Francisco comparou o muro que Donald Trump quer construir na fronteira dos Estados Unidos com o México ao muro de Berlim, que separou a Alemanha Oriental da Alemanha Ocidental de 1961 a 1989, durante a Guerra Fria.
"Nós já tivemos um muro, o de Berlim, e isso nos trouxe dor de cabeça e sofrimento suficientes", declarou o pontífice em entrevista à emissora de televisão mexicana Televisa transmitida na noite de terça-feira (28/05).
O papa disse, ainda, que teria o mesmo posicionamento se estivesse diante de Trump e não de uma emissora de televisão.
"Isso eu já disse em público. E também disse que quem constrói muros acaba prisioneiro dos muros que ergueu. Em vez disso, quem constrói pontes fraterniza, dá as mãos. Pode-se perfeitamente defender um território com uma ponte, não necessariamente com um muro. Estou falando de pontes políticas, culturais...Não vamos fazer uma ponte em todas a fronteiras, é impossível", declarou.
O pontífice disse que não se referia apenas aos muros do México, mas a todas as barreiras, como as dos conclaves espanhóis Ceuta e Melila com o Marrocos.
"O homem é o único animal que cai duas vezes no mesmo buraco. Estamos de volta ao mesmo, certo? A construção de muros, quando a verdadeira defesa é o diálogo, o crescimento, o acolhimento, a educação e a integração", afirmou o pontífice.
À Televisa, Francisco também disse que "separar pais e filhos vai contra o direito natural" e "é cruel". No ano passado, a separação de centenas de crianças de seus pais na fronteira dos EUA com o México, como resultado da política migratória de tolerância zero do governo Trump, causou indignação mundial.
Em 2016, em visita ao México, o papa celebrou uma missa em Ciudad Juárez, em um altar construído a apenas 80 metros da fronteira com os Estados Unidos. Em maio de 2017, o papa recebeu Trump no Vaticano. Na época, ele disse que "uma pessoa que só pensa em construir muros, onde quer que seja, e não construir pontes, não é cristã".
A entrevista de Francisco foi ao ar em meio a uma nova polêmica envolvendo a fronteira do México com os EUA. Financiado com doações de partidários de Trump, o grupo de veteranos Patriotas Constitucionais dos Estados Unidos iniciou no fim de semana a construção do primeiro muro "privado". São 800 metros de barras de aço no ponto onde se encontram os estados do Texas e Novo México, em frente à cidade mexicana de Ciudad Juárez, um dos acessos mais utilizados por milhares de migrantes, principalmente centro-americanos.
"Isso não é Europa, são os Estados Unidos, nós protegemos nossas fronteiras", disse Jeff Allen, que se identifica como coproprietário do território americano onde a cerca está sendo construída. "Estou recebendo muita ajuda para construir o muro, é assim que a América diz ao Congresso que ele está falhando. Vamos lutar por nós mesmos", acrescentou.
Três muros de aço ao lado de Ciudad Juárez foram construídas pelo governo dos EUA desde 2016 e, juntas, somam cerca de 40 quilômetros.
Em defesa das mulheres
Na entrevista, Francisco também falou sobre feminicídio, narcotráfico e abusos cometidos por clérigos.
"Caso a mulher obtenha um cargo importante, com grande influência, então ficamos sabendo de casos de mulheres fantásticas. Porém no imaginário coletivo diz-se: olha, é mulher e conseguiu! Conseguiu ganhar o prêmio Nobel! Inacreditável. Vê-se o gênio literário que se expressa nestas coisas. E a mulher em segundo lugar. E do segundo lugar passar a objeto de escravidão não precisa muito”, disse o pontífice.
Francisco também defendeu que um mundo sem mulheres não funciona. "Não porque é a mulher que tem os filhos, deixemos de lado a procriação. Uma casa sem uma mulher não funciona. Há uma palavra que está para sair do dicionário, porque causa medo em todos: a ternura. É patrimônio da mulher. Porém, daqui ao feminicídio, à escravidão, o passo é breve", afirmou, acrescentando que "é evidente que a mulher continua em segundo plano e a expressão de surpresa quando uma mulher tem sucesso indica isso muito bem".
LE/afp/ots
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