Os candidatos ao Prêmio Alemão do Livro
11 de setembro de 2014Os jornalistas, críticos e livreiros que compõem o júri do 10° Prêmio Alemão do Livro pesquisaram e discutiram durante meses. No total, as editoras submeteram 167 títulos da Alemanha, Áustria e Suíça. No último dia 13 de agosto foi anunciada uma lista ampla de 20 livros selecionados para concorrer ao prêmio.
A partir dessa lista, os jurados escolheram agora seis títulos para a lista final, que são apresentados aqui em ordem alfabética do sobrenome do autor.
Thomas Hettche: "Pfaueninsel" (Ilha dos pavões)
"A jovem rainha simplesmente ficou um instante parada e esperou que seus olhos se acostumassem à penumbra da floresta. Ainda há pouco ela havia brincado com a bola no prado ensolarado, aquele jogo inglês com um martelinho de madeira, tão de agrado do rei."
O que soa como o início de um conto de fadas é o começo de um romance histórico turbulento, no qual têm espaço também uma trágica história de amor e uma boa dose de crítica à civilização. Os olhos da bela princesa prussiana Luise mal haviam se acostumado à luz escassa quando ela percebe, sob a vegetação da Ilha do Pavão, nos arredores de Berlim, o feio anão Christian. Um monstro, como lhe escapa dos lábios.
Uma palavra como uma flecha, que também envenena a vida de Marie, irmã de Christian, e que, na fábula de Thomas Hettche, evolui para o canto de cisne de um mundo no qual ainda havia espaço para desvios e irregularidades. Um vento triste sopra pela Arcádia prussiana, um vento triste sopra deste comovente livro.
Thomas Hettche, Pfaueninsel. Editora Kiepenheuer & Petrovich
Angelika Klüssendorf: "April" (Abril)
"A jovem toca a campainha da porta de um apartamento no térreo. Na plaqueta está escrito, em letras rebuscadas, Srta. Jungnickel. Um pássaro canta, dois gorjeios curtos, então volta o silêncio."
Ela se chama April, por causa da música da banda Deep Purple. Com cem marcos da Alemanha Oriental no bolso e alojada num quarto escuro na casa da mal-humorada senhorita Jungnickel, a jovem foi entregue à vida adulta – saindo dos orfanatos aos quais sobreviveu nos últimos anos, enfrentando todo tipo de golpes, castigos e humilhações.
No perturbador Das Mädchen (A menina), lançado há três anos e que também foi indicado ao Prêmio Alemão do Livro, em 2011, Angelika Klüssendorf conta com palavras afiadas a história dessa machucada alma de criança. April é a sua continuação, uma montanha-russa através de uma vida machucada, narrada de forma intensa e com o mesmo cuidado que o romance antecessor.
Angelika Klüssendorf, April. Editora Kiepenheuer & Witsch
G. Leutenegger: "Panischer Frühling" (Primavera de pânico)
"Naquela manhã de abril, quando o silêncio dominou de repente os céus de Londres, fui para a Trafalgar Square. A praça ainda estava na sombra, e apenas no alto de sua coluna, numa solidão inacessível, Lord Nelson já estava ao sol."
Abril de 2010. As nuvens de cinza do vulcão Eyjafjallajökul paralisaram o tráfego aéreo em grande parte da Europa. O céu parecia bem diferente, o mundo ficou mais silencioso. E a narradora no romance Panischer Frühling, uma mulher na segunda metade da vida, cai num estado terrível de medo. Em pânico, ela vagueia pela cidade vibrante, em busca de segurança.
Ela encontra refúgio no passado, nas lembranças que vêm à tona de forma eruptiva e nas conversas com o seu conhecido Jonathan, um estranho vendedor de jornais na Ponte de Londres. Um livro deslumbrante, melancólico e emocionante.
Gertrud Leutenegger, Panischer Frühling. Editora Suhrkamp.
Thomas Melle: "3000 Euro" (3.000 euros)
"Mesmo que não pareça, há um homem lá dentro. Sob os remendos e os farrapos, nada se movia. Os transeuntes passavam ao largo daquele amontoado, como se ele não estivesse lá."
Anton dormia. E ele gosta de dormir um sono pesado. Pois isso é tudo o que ele ainda possui. Algumas vezes, Anton aparece no caixa onde trabalha Denise, trocando vales por pizza congelada barata. Um dia, Anton foi estudante de Direito. Mas agora ele está endividado, em 3.000 euros. Por isso, enfrenta os tribunais. Denise ganhou 3.000 euros como protagonista de um filme pornô. Desde então, ela sofre perante os olhares masculinos. Qualquer um pode reconhecê-la.
De forma agressiva, Thomas Melle conta a história de duas pessoas que saíram da ordem burguesa. E para lá não voltam mais, porque ninguém acredita nas suas potencialidades. Não existe um final feliz, o leitor tem de desvencilhar-se sozinho desses abismos do nosso mundo de consumo.
Thomas Melle, 3000 Euro. Editora Rowohlt Berlin.
Lutz Seiler: "Kruso"
"Desde que saiu, Ed se encontrava num estado de vigilância excessiva, que o impedia de dormir no trem."
O premiado poeta Lutz Seiler escreveu o seu primeiro romance – Kruso, uma parábola polifônica sobre o fim da Alemanha Oriental, uma ode à literatura e um apelo pela análise crítica do conceito de liberdade. Uma espécie de reverso das "Robinsonadas" – gênero da literatura semelhante à ficção Robinson Crusoe, de Daniel Defoe – alocado na distante ilha do Mar Báltico Hiddensee, no restaurante Zum Klausner, onde dinheiro não tem a menor importância, ainda que se trabalhe até cair.
Uma magia da linguagem, que gira em torna da amizade incomum de duas almas feridas – Ed e Kruso. Tão realista quanto fantástico e embebido de mitos. Que romance de estreia!
Lutz Seiler, Kruso. Editora Suhrkamp
H. Steinfest: "Der Allesforscher" (O pesquisador de tudo, em tradução livre)
"O começo de um livro sofre de um grande problema: falta música. Que sorte tem o filme cujo início é apoiado por uma abertura sonora que promete o que posteriormente é cumprido ou não, mas que de qualquer forma atrai imediatamente o espectador."
Heinrich Steinfels desafia maravilhosamente o problema. Ele escreve de uma maneira que soa nos ouvidos e começa sua história narrada em primeira pessoa com um estrondo: em sua viagem de negócios em Taiwan, Sixten Braun é praticamente assassinado pelas entranhas de uma baleia que explodiu. Por sorte, ele sobreviveu, e esse é o motivo pelo qual, em breve, um misterioso jovem chamado Simon lhe é impingido como suposto filho.
Isso dá início a um maravilhoso relacionamento entre pai e filho e proporciona a Heinrich Steinfels uma trama, em torno da qual ele pode inventar a sua história com toda a imaginação. Por que o romance se chama Der Allesforscher (O pesquisador de tudo, em tradução livre)? Porque Simon é uma espécie de essência de todas as crianças. E crianças, com sua curiosidade ilimitada, possuem um forte desejo de pesquisar.
Heinrich Steinfest, Der Allesforscher. Editora Piper