Opinião: Uma outra Alemanha
20 de outubro de 2015Em frente à ópera Semperoper, em Dresden, um telão eletrônico exibe a mensagem: "Não somos palco para a xenofobia." E, por esse motivo, a fachada do prédio – que normalmente é um dos símbolos mais iluminados da cidade – permanece escura na noite desta segunda-feira (19/10). Um palco escuro para uma outra Alemanha.
Para o primeiro aniversário dos "Patriotas europeus contra a islamização do Ocidente" (Pegida), os organizadores convocaram uma manifestação no largo Theaterplatz, em frente à Semperoper. O número estimado de participantes é de 15 mil, talvez até 20 mil. E o líder Lutz Bachmann convidou populistas de direita europeus. O que se segue são três horas de escuridão. Uma escuridão alemã.
O primeiro grito da noite, ainda antes do início oficial, é "fora Merkel". O mais frequente é "resistência". Convidado de honra da noite, apresentado com orgulho por Bachmann, é o turco-alemão Akif Pirinçci. E as suas observações são – é necessário dizê-lo – demagógicas, repugnantes, obscenas. Nelas, políticos são "gauleiter [chefe de distrito durante o regime nazista] que agem contra o próprio povo". Refugiados são chamados de invasores. Logo ele fala que "infelizmente os campos de concentração não estão funcionando".
Pirinçci cita o porta-voz de uma comunidade muçulmana em Erfurt e diz que ele tem "tanto que ver com a cultura alemã como um cu com a fabricação de perfumes". E em seguida divaga sobre a tomada de poder pelos estrangeiros na Alemanha, e também sobre as mulheres alemãs, "depois de eles as terem agarrado e bombeado para dentro delas o leite muçulmano".
A coisa vai além. Por exemplo, sobre a "porca imprensa do sistema, toda ela verde-esquerdista". Sobre os verdes serem um partido de "fodedores de crianças". Sobre muros de proteção e executores de campos de concentração. Agora parece que basta. Essas são, portanto, as palavras do convidado de honra, que proferiu o discurso mais longo da noite. Bachmann havia dito antes que tinha orgulho dele.
Sim, não há apenas extremistas de direita no Theaterplatz. Há também pessoas com crianças, casais mais velhos, cidadãos de Dresden. Não, pedidos de "chega" ou "basta" não são ouvidos durante o discurso de Pirinçci. Quem está aqui, nesta noite, não quer uma outra Alemanha – ele já vive numa outra Alemanha. Uma Alemanha que não é a minha.
Mas também sente-se respeito nesta noite. Por pessoas como a jovem que, antes da manifestação do Pegida, durante muito tempo ficou parada com um cartaz escrito "Refugiados são bem-vindos" e ouviu todo tipo de insultos. Pelos policiais que, quanto mais a noite avança, mais dificuldades têm para separar extremistas de direita e hooligans dos manifestantes de esquerda. E às vezes é necessária a atuação da polícia montada, que se espreme entre os dois lados. Agressivos são ambos.
Respeito também por "aqueles lá em cima", por políticos alemães de ponta, como Angela Merkel, Thomas de Maizière, Heiko Maas ou Katrin Göring-Eckardt, que são xingados de uma forma repugnante. Ou pelo responsável pela ordem pública em Dresden, que Bachmann cita nominalmente, falando também o nome do cargo, e a quem responsabiliza pelas dificuldades com a manifestação contrária.
Os políticos e a Justiça precisam agir. O ministro do Interior, Thomas de Maizière, havia falado já antes desta segunda-feira sobre "extremistas de direita convictos" no núcleo duro do Pegida. E é permitido que eles se manifestem dessa maneira? Quem tem o poder de oferecer outras opções àqueles que, nesta noite, aplaudem, gritam e depois partem para a briga? Quem vai ao encontro das famílias que acompanham o movimento? Gosta-se de falar em "política e sociedade civil", mas em Dresden, na Saxônia, essas foram e são palavras vazias. E a chanceler federal, no seu discurso de ano novo, já havia alertado com veemência sobre o perigo dos populistas.
O grupo social em torno do Pegida se transforma num desafio sombrio, além da questão dos refugiados. Apenas um indício: vários jornalistas foram xingados ou fisicamente agredidos esta noite. E um repórter da DW, depois de ter sido identificado como jornalista, foi subitamente empurrado para dentro da multidão e agredido, e só por sorte conseguiu escapar de uma situação perigosa.
Nesta noite de segunda-feira, a Semperoper se transformou num "palco para a xenofobia" e muito mais. Dresden parece dilacerada. E não brilha mais.