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Religião

Sínodo deve impulsionar reflexão sobre a essência da Igreja

6 de outubro de 2019

Para a população indígena na Amazônia e, portanto, também para a floresta, a Igreja Católica desempenha um papel importante. Francisco deve atender à recomendação de permitir sacerdotes casados, opina Christoph Strack.

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Papa Francisco recebeu Raoni no final de maio no Vaticano
Papa Francisco recebeu Raoni no final de maio no VaticanoFoto: imago/Vatican Media/CPP/IPA/Catholic Press

"A realidade é mais importante do que a ideia." Essa foi uma das principais frases da primeira encíclica do papa Francisco, publicada no final de 2013. Intitulada de "Evangelii gaudium" (Alegria do Evangelho), a carta soava como um novo começo, uma tentativa de pensar em pessoas concretas, em suas necessidades e esperanças. Dificilmente outra frase poderia explicar melhor a força que impulsiona o papa latino-americano nessas três semanas do Sínodo para a Amazônia, que começa neste domingo (06/10).

Ao contrário de dogmáticos e ideólogos distantes, seja qual for sua "cor teológica", Francisco se preocupa com a situação das pessoas na vasta região amazônica e com os povos indígenas cuja existência está ameaçada. E, neste caso, o papa também se preocupa com o "pulmão verde" da Terra, com as queimadas e a destruição ambiental, com os crimes contra a criação.

Os dramáticos incêndios florestais na Amazônia abalaram pessoas em todo o mundo. A mata continua queimando, mas a atenção da mídia se volta agora para outros assuntos. Francisco sabia da catástrofe, e não a esquece agora também. Durante o sínodo, ele recordará a situação repetidamente à comunidade mundial, e esperamos que seja um lembrete drástico.

O primeiro papa que se nomeou em homenagem a São Francisco é um papa verde – para além da cor política. E seu coração se abre quando pode mostrar seu afeto por pessoas simples e sensatas, também movidas por essas preocupações.

Francisco é solidário com os marginalizados. No caso da Amazônia, são os povos originários, os indígenas que estão sob pressão e sofrem em vários dos nove países da região amazônica. Como a terra é sagrada para eles, são um espinho atravessado na garganta das empresas multinacionais e dos latifundiários. E, hoje, a Igreja se posiciona de maneira mais decidida do que antes.

Um dos grandes cardeais da América Latina, o brasileiro Cláudio Hummes – sacerdote há mais de 60 anos e com mais experiência pastoral do que muitos dos críticos do papa em seus idílicos destinos romanos – não se cansa de avisar que cerca de 80% das comunidades na região amazônica recebem visitas irregulares de sacerdotes (isso significa só algumas vezes por ano).

Em tempos de fortalecimento de igrejas fundamentalistas, isso enfraquece as comunidades e os fiéis. Porque a Igreja vive, em sua essência, da celebração conjunta da Eucaristia, e essa Eucaristia liga a Igreja ao sacerdócio.

Hummes também recorda que homens e mulheres da Igreja já foram assassinados na Amazônia e temem por suas vidas. É uma situação mais que dramática.

Espera-se que o sínodo – e mais do que isso ele não pode proporcionar – recomende ao papa a admissão ao sacerdócio de "homens casados de fé comprovada". Essa questão é explicitamente mencionada no documento de trabalho do sínodo (e é por essa razão que os opositores antiquados de Francisco estão gritando "heresia" e "apostasia").

É de se esperar que o papa siga essa recomendação e não recue novamente, pois, como dito, trata-se da vida espiritual de pessoas e comunidades ameaçadas existencialmente. Francisco poderia dar esse passo, pois a ordenação de homens casados não viola nenhum dogma. A permissão para que eles exerçam o sacerdócio cabe apenas ao papa.

Será que tal passo na região amazônica teria um impacto na teoria e na prática na Alemanha? "A realidade é mais importante do que a ideia", disse Francisco. A ideia de mudar o sacerdócio existe na Alemanha há muito tempo, mas a realidade é diferente. Assim, as dúvidas são apropriadas.

O que impressiona em Roma nos dias de hoje é com que veemência os críticos e provavelmente odiadores do papa declaram estado de emergência. Alguns dos círculos conservadores de direita no meio americano, para quem o "trumpismo" é o novo evangelho, expressam puro ódio mesmo quando os bispos também falam em "heresia" (pelo qual alguém poderia ter sido queimado no passado) ou quando tuiteiros desejam que este papa morra logo.

Mas a Igreja na Alemanha e na Europa somente continuará existindo se passar por uma transformação, pouco a pouco. Se o sacerdócio é clerical e de fato continua sendo um ofício de poder, ele está morto nessas regiões e está arrastando a Igreja para baixo.

O Sínodo para a Amazônia pode e deve impulsionar a reflexão sobre a essência da Igreja – no Vaticano e também na Alemanha. E só assim poderá haver evolução. Mas, até lá, é um caminho muito, mas muito longo. 

Por fim, a Igreja sob este papa está lutando agora contra conflitos que o Concílio Vaticano II (1962-1965) pôs em marcha com sua abertura ao mundo e que, desde então, têm sido reprimidos ou combatidos a partir de cima. São conflitos difíceis, mas necessários. E seu pano de fundo é: "A realidade é mais importante do que a ideia."

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Christoph Strack Repórter, escritor e correspondente sênior para assuntos religiosos@Strack_C