Opinião: O Mali interessa a todos!
18 de janeiro de 2013Finalmente a União Europeia chegou a um consenso: 250 instrutores irão treinar o exército malinês, capacitando-o para a luta contra os radicais islâmicos do país. O bloco europeu precisou de meses para tomar essa decisão. Enquanto isso, os islamitas, com a sharia (a lei tradicional islâmica) nas mãos, espalhavam medo e terror nas aldeias do norte do Mali.
Assassinatos, mutilações, execuções, estupros e saques: a tudo isso os habitantes têm sido submetidos nos últimos meses. E isso num país tolerante, até então considerado modelo de progresso democrático.
Era uma violência que não podia mais ser combatida pela política. Os franceses reconheceram isso e agiram, enquanto o resto da Europa estava ocupada com processos de decisão e consigo mesma. E a opinião pública da França apoia essa operação sancionada pelas Nações Unidas e pelos vizinhos europeus, sem reservas!
E a Alemanha? Em ano de eleições, a política prefere evitar o tema. Teme-se um debate amplo na mídia e entre a opinião pública. Também por isso a Alemanha age de maneira contida, não tendo até agora feito mais do que enviar dois aviões de transporte ao Mali. Uma mobilização maior necessitaria da aprovação do Bundestag (câmara baixa do Parlamento), e, no mais tardar nesse momento, o tema estaria na boca da imprensa e do público.
Mas: talvez não haja como evitar esse debate. Talvez ele devesse ser enfrentado com mais coragem aqui na Alemanha. Quase um quarto de século após a reunificação do país, em tempos de conflitos assimétricos com efeitos globais, a presença da Alemanha, em termos de política de segurança, faz-se necessária também na África.
Porém, sempre que se trata desse continente vizinho, tudo se torna difícil para nós. Faltam-nos informações. No noticiário alemão, o Mali não passa de um país qualquer no Sahel. No entanto, ele tem potencial para se tornar um barril de pólvora regional. Se o Mali entrar em colapso, um incêndio se alastrará por todo o Sahel, uma região que a Alemanha deveria finalmente enxergar como sua vizinha imediata.
País de grande área, o Mali faz fronteira com sete outros países, sendo grande parte deles politicamente frágil e assolada por problemas semelhantes: pobreza, carência de instituições estatais, grupos terroristas, crime organizado.
Cabe enfatizar dois pontos: os riscos de uma mobilização são grandes – sobretudo no que diz respeito à operação terrestre das tropas francesas e aos 3.300 soldados da Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental (Cedeao). Porém, os riscos resultantes da falta de uma ação firme, agora, são muito mais sérios. É o que mostra a tomada de reféns num campo de petróleo no sul da Argélia, conduzida por terroristas da Al Qaeda no Magrebe Islâmico, que exigem o fim da missão militar francesa.
A Europa vai esperar para ver o tolerante Mali se transformar num Estado fundamentalista islâmico? Acredita-se mesmo que aguardando, hesitando e ignorando, o problema se resolverá? Os responsáveis europeus pela política externa e pelo serviços secretos no exterior têm uma visão diferente: a médio prazo pode se desenvolver na África um cinturão de terrorismo islâmico, indo do sul da Argélia e da Mauritânia até o norte da Nigéria, passando pelo Mali e pelo Níger.
Até o momento, os grupos locais não operam sob uma estrutura de organização comum e estão pouco conectados entre si. Mas isso pode mudar se lhes for dado espaço. Cabe privá-los de possibilidades de retirada, cortar as ligações tanto entre os grupos quanto destes com suas fontes financeiras.
É precisamente isso que a atual intervenção militar poderá proporcionar. E por isso também a Alemanha deveria se engajar de forma mais intensa. O Mali interessa a todos, os atuais acontecimentos no país não são um problema africano!
É necessário um engajamento corajoso e sustentado, que dê segurança às pessoas, evite catástrofes humanitárias e, em seguida, restabeleça a normalidade política. Senão persistirá o perigo de que os grupos terroristas do Sahel se unam às correntes radicais islâmicas na costa leste do continente, no Chifre da África e no Quênia – com consequências devastadoras para a Europa e para a segurança global.
Autoria: Ute Schaeffer (av)
Revisão: Luisa Frey / Alexandre Schossler