O breve vídeo em que, junto a um ringue de luta livre, Donald Trump subjuga um homem de terno cuja cabeça foi substituída pelo logo da emissora de TV CNN, não é apenas mal feito, também a sua mensagem é tosca.
Dessa forma, o presidente dos Estados Unidos literalmente combate o que ele e muitos de seus adeptos denominam a mídia das notícias falsas, ou seja, organizações jornalísticas tradicionais como a CNN ou os jornais New York Times e Washington Post.
Desde o começo de sua campanha eleitoral, Trump tem esbravejado não só contra os veículos de comunicação estabelecidos, mas realmente contra toda organização jornalística que ele ache que o esteja tratando injustamente. A intenção é instigar seu núcleo de apoiadores, que detestam pelo menos tanto quanto o seu presidente aquilo que veem como a mídia das fake news.
O clipe postado no Twitter, em que ele é visto atacando fisicamente um dos principais membros do establishment da mídia tradicional, é repulsivo e indigno de um presidente. Por outro lado, o incidente não surpreende, dado o controverso uso que Trump faz do Twitter, gerando manchetes quase diárias, assim como sua profunda hostilidade para com a imprensa.
Em geral – e isso provavelmente também vai acontecer com o tuíte do vídeo de luta –, passado um dia ou dois de clamor público em torno do incidente, o debate se dissolve sem quaisquer consequências, apenas para se reiniciar no próximo "ultraje do dia" gerado por outro tuíte presidencial.
Para que fique absolutamente claro: o abuso do Twitter por Donald Trump, como instrumento para insultar, assediar e atacar seus oponentes – seja a mídia, políticos ou qualquer um que discorde dele – é desprezível e indesculpável.
Ao mesmo tempo, segundo certos analistas, essa prática no Twitter pode às vezes ser também estratégica, por desviar a atenção de outros temas que o público e a mídia poderiam estar discutindo.
Neste caso, em vez de se debaterem os esforços aparentemente estagnados dos parlamentares republicanos para aprovar a reforma do sistema de saúde – com consequências óbvias e imediatas para milhões de americanos –, o foco está na perene guerra de Trump contra a mídia – a qual, embora incômoda, terá pouco impacto direto para a maioria da população.
Muito mais preocupante do que o grosseiro tuíte de Trump de um clipe de luta livre, é o vídeo de recrutamento produzido em nível profissional e divulgado recentemente pela Associação Nacional de Rifles (NRA) dos EUA, uma ferrenha defensora do presidente republicano.
No elegante clipe, empregando a retórica antagonizante do "nós contra eles", um narrador pinta a imagem de uma nação supostamente ameaçada por adeptos do ex-presidente Barack Obama e outros adversários de Trump. E conclui que "a única maneira de dar fim a isso, a única maneira de salvar o nosso país e a nossa liberdade, é combater essa violência de mentiras com um punho fechado de verdade".
O vídeo viralizou, já tendo sido assistido mais de 6 milhões de vezes desde que a NRA o postou no Facebook, em junho. Seus críticos o classificam como incendiário, por ficar a apenas um passo de encorajar explicitamente a violência contra os opositores do presidente.
O fato de o maior lobby armamentista do país emitir esse tipo de mensagem proposital, em meio a um clima político já explosivo, é possivelmente um sinal mais alarmante de uma nação dividida do que Trump tuitar um vídeo de si "dando uma surra" na mídia.