Opinião: Feira entre política e entretenimento
23 de outubro de 2016É sempre uma questão de percepção. Quem esteve presente à abertura da 68ª Feira do Livro de Frankfurt, quem escutou os apelos e discursos sobre a liberdade de expressão e, possivelmente, visitou nos dias posteriores os pódios de discussão sobre a Turquia e a Síria pode chegar à conclusão de que o evento livreiro seria um local de encontros para combatentes da liberdade.
Isso pode ser visto dessa forma. E há também muitos textos e livros que abordam a guerra e a expatriação e relatam sobre o sofrimento humano numa ditadura, tanto romances quanto livros não ficcionais.
Um interlocutor bastante requisitado nos últimos dias é o jornalista turco Can Dündar, autor recém-exilado e que se movimenta pelos pavilhões da feira sempre acompanhado de guarda-costas.
Também tem despertado grande interesse o livro Nujeen – Fuga para a Liberdade (em tradução livre), da adolescente refugiada de 17 anos Nujeen Mustafa, de Aleppo. Na obra, ela conta – junto à jornalista Christina Lamb – as suas recentes vivências de fuga para a Alemanha numa cadeira de rodas.
Por outro lado, um escritor como Abbas Maroufi, que vive já há 20 anos exilado na Alemanha, chama muito menos atenção. Nos anos 1990, ele foi condenado no Irã a chibatadas, prisão e proibição de publicação e pôde, em 1996, deixar o seu país também com a ajuda de Günter Grass.
Um autor como Dündar está agora em todas as bocas, mas muitos aqui na Alemanha já "se acostumaram" com um escritor exilado como Abbas Maroufi.
É claro que é importante e correto que, em sua cobertura da feira, programas de TV e jornais falem agora sobre Dündar e a Turquia. Também a ganhadora deste ano do Prêmio da Paz do Comércio Livreiro Alemão, a editora Carolin Emcke, dedica-se à escrita sobre a guerra e a exclusão.
Por outro lado, é possível perceber a Feira do Livro de Frankfurt de uma forma totalmente diferente. Não é preciso fazer muito esforço. A feira é, de fato, um grande e confuso supermercado, no qual o objeto livro ainda desempenha o papel principal, mas tem que compartilhá-lo agora com alguns outros atores.
Da mesma forma que, nos últimos anos, as grandes livrarias das cidades alemãs se transformaram em coloridas lojas com os mais diversos produtos, a Feira de Frankfurt também mudou. Quando é orgulhosamente anunciado, por parte dos organizadores, que neste ano, novamente, estão presentes mais de 7 mil expositores, trata-se apenas de uma afirmação sobre quantidade.
Passeando pelos pavilhões da feira, pode acontecer que, por vezes, não se veja um livro em centenas de metros. Barracas de comida "gourmet" e uma rica variedade de brinquedos, objetos de arte, agendas e bichinhos de pelúcias em todas as cores e formas, itens de design, artigos de papelaria, diversas iniciativas, como também organizações privadas e governamentais estão presentes na feira. Em Frankfurt, a tendência para os estandes nonbook aumenta vertiginosamente.
E mesmo quando se chega aos estandes das editoras com livros de verdade, é grande a surpresa diante de tudo que ali é ofertado. Guias e mais guias, literatura esotérica em todas as formas, livros de viagens e comida – entre duas capas de livro se encaixa praticamente tudo. Aqueles que podem se dar ao luxo de pagar as taxas extremamente elevadas da feira reservam um estande ou até mesmo uma área toda do evento. Há muito, no entanto, que esse não é o caso de muitas editoras literárias e de ciências humanas – elas ficam longe da Feira do Livro de Frankfurt.
Quando se olha de longe para a maior "feira do livro do mundo", é bom sempre ter isso em mente. Romances e livros de não ficção ainda desempenham um papel importante. Há alguns eventos sobre questões políticas e sociais da atualidade. Mas, no todo, a Feira do Livro de Frankfurt se iguala a uma enorme mercearia com uma grande variedade de oferta. Como dito – tudo é uma questão de percepção.