Algumas centenas de milhares de pessoas foram às ruas de Barcelona neste fim de semana, depois que Mariano Rajoy anunciou o próximo passo deste pôquer político. O primeiro-ministro espanhol vai suspender a autonomia da região e destituir o governo catalão.
Ele dificilmente poderia fazer outra coisa qualquer, diante da hesitação do chefe do governo regional da Catalunha, Carles Puigdemont. Independentemente de todos os equívocos políticos que Rajoy e seu governo cometeram no contexto dessa disputa, nenhum país do mundo reagiria indiferente a tal situação.
Parte da população da Catalunha está se entregando, atualmente, aos desejos dos sentimentos revolucionários. A agitação de bandeiras, os cânticos e slogans insurgentes criam um senso de comunidade e orgulho. Há uma espécie de atmosfera de festa de independência, na qual se alegram jovens e velhos, casais burgueses e rebeldes universitários.
Um porta-voz do governo em Barcelona já disse que agora é preciso decidir com razão e convicção, mas não com sentimento, sobre o procedimento futuro. Essa advertência chega um pouco atrasada, depois que Puigdemont e seus apoiadores fizeram tudo o que puderam para incitar os ânimos e as emoções nos últimos dois anos.
Há paralelos com o Brexit. O entusiasmo pela independência catalã é alimentado em parte da população por uma campanha de desinformação maciça. Seus apoiadores nutrem ilusões sobre o futuro político de uma "República da Catalunha" e suas possibilidades econômicas, que são simplesmente chocantes. Muitos não querem nem saber de tudo isso. Pois iria somente quebrar o clima.
Assim, muitos dos independentistas ainda acreditam que continuariam membros da União Europeia (UE), que a vida iria prosseguir como antes, que as exportações catalãs iriam florescer e que a Europa iria ajudá-los de alguma forma. Se alguém disser o contrário, é considerado um estraga-prazeres. Assim como ainda hoje os defensores do Brexit criticam duramente todos aqueles que advertem das consequências da saída da UE.
Alguém deve ter dado às pessoas na Catalunha essas informações falsas, às quais se atêm. Foram os movimentos de independência, que pregam o entusiasmo cego e excluem a visão da realidade. Mas Puigdemont também ajudou. Ele se deixou levar pelas hordas que ele não pode controlar. E há ainda a emissora regional TV3, que se tornou um veículo de propaganda da independência.
Esta semana forçará todos os atores deste drama a adentrar um campo político minado, o que tornará difícil para ambos os lados evitar explosões descontroladas. Porque, quando a autonomia for suspensa, a situação pode tornar-se crítica.
Em Madri, Rajoy terá que colocar em cena conhecedores da região, políticos que achem o caminho entre a necessidade legal e a provocação evitável. Será muito difícil administrar a região semiautônoma à distância, sem provocar os catalães mais do que o necessário. Esse barril de pólvora pode explodir rapidamente.
No entanto, Puigdemont e seus seguidores devem provar se são capazes de decidir com a cabeça em vez de outras partes do corpo. O melhor seria que, após a sua destituição, Puigdemont desse lugar a um líder menos radical, capaz de negociar com Madri. Talvez, no entanto, ele não se importe com o fato de desmantelar a sua região, caso queira perecer em glória e se tornar um mártir do nacionalismo.
Os próximos dias irão mostrar para onde vai a Catalunha. Muito leva a crer que haverá um desgaste, uma crise prolongada que pode pôr à prova a democracia espanhola e colocar sua economia em risco durante anos. Para a Catalunha, no entanto, o preço político e econômico do sonho de independência aumentará a cada mês.
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