O início do ano trouxe duas notícias sobre o futuro da energia nuclear que parecem vir de dois mundos diferentes: enquanto a Alemanha desativou três de suas últimas seis centrais de energia nuclear, a Comissão Europeia divulgou um plano segundo o qual investimentos em usinas nucleares e de gás devem ser classificadas como "verdes" em circunstâncias específicas.
Na Alemanha, o abandono da produção de energia nuclear, decidido em 2011, vem acontecendo sem muito alarde. Diferentemente das décadas anteriores, o desligamento de usinas não é mais motivo para discussões violentas e sim para uma simples notícia.
Sugestão de Paris
Ao mesmo tempo, Bruxelas sente a pressão exercida pela França, onde funcionam 58 centrais nucleares e o fornecimento de energia tem como base a energia atômica. O presidente Emmanuel Macron foi astuto ao aproveitar o vácuo temporário de poder na Alemanha para impor uma valorização da energia nuclear. E as chances alemãs de mudar esse quadro não são nada grandes.
Isso traz dificuldades consideráveis especialmente para o Partido Verde, que integra o novo governo alemão. A política energética começa o ano com uma valorização da energia nuclear, que, para os verdes e seus eleitores, equivale a uma traição política.
Há anos, defensores das usinas nucleares vêm fazendo lobby pelo funcionamento supostamente sustentável das centrais, por ele ser livre de emissões de gases de efeito estufa. Fato é que, diferentemente das usinas de carvão, as usinas nucleares em funcionamento não emitem dióxido de carbono na atmosfera.
Contaminação nuclear
Mas também é fato que há emissão de gases de efeito estufa na extração de urânio, por exemplo. E não é nada sustentável o fato de que, após catástrofes em centrais nucleares como em Tchernobil, em 1986, e Fukushima, em 2011, regiões inteiras fiquem inabitáveis durante longos períodos e que os custos para a superação das catástrofes acabam, na maioria das vezes, sendo transferidos para a sociedade, e não para a indústria.
Além disso, o debate sobre energia nuclear em Bruxelas esqueceu completamente que todos os países que produzem ou produziram energia nuclear têm diante de si a hercúlea tarefa de descartar o lixo atômico. A busca por um depósito definitivo para o lixo nuclear na Alemanha é uma tarefa de gerações – sem falar na execução efetiva do descarte, com custos na casa dos bilhões.
Será que a energia nuclear é sustentável? Tendo a dizer que não. A construção de novas usinas nucleares também é tão cara que o conceito da preservação de recursos simplesmente não cabe nesse contexto.
Derrota para os verdes
Quando o tema é gás, as coisas são diferentes. A Alemanha tem objetivos ambiciosos com a saída da energia nuclear e da energia a carvão, que quer adiantar de 2038 para 2030. Para conseguir isso, o país terá de depender de gás como tecnologia de transição por muito tempo se não quiser importar energia elétrica, especialmente gerada por usinas nucleares francesas.
Nesse contexto, os verdes poderão amargar a próxima derrota se o chanceler federal alemão, Olaf Scholz, impuser seu apoio ao gasoduto russo Nord Stream 2. E parece que é o que vai acontecer.
Pode-se falar, então, num renascimento da energia nuclear? Dificilmente. Basicamente, a duração do funcionamento de centrais antigas nos países que produzem energia nuclear será prolongada. Planos de construção de novas usinas costumam fracassar diante dos imensos custos.
Mas a fome de energia do mundo é enorme e deverá voltar a aumentar depois do coronavírus. Especialmente a China está apostando em todas as formas de produção de energia – paralelamente à energia renovável, há a aposta nas energias fósseis e na nuclear.
No longo prazo, porém, os países querem apostar em energias renováveis, mesmo havendo forte lobby para as formas antigas de se gerar energia. Depois da decisão de Bruxelas, está valendo também a premissa de esperar para ver quantos investidores realmente querem apostar em formas ultrapassadas de geração de energia.
A maior parte dos fundos retirou suas aplicações da energia a carvão, prejudicial ao meio ambiente. É possível que sintam pouca vontade de manter viva, durante mais alguns anos, uma técnica altamente arriscada do passado.
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Jens Thurau é jornalista da DW. O texto reflete a opinião pessoal do autor, não necessariamente da DW.