Depois de quatro anos de crise política e econômica, os brasileiros tiveram a chance neste domingo (07/10) de virar uma página na história do país. O resultado das urnas mostra, porém, que eles preferiram aprofundar a crise e levar para o segundo turno da eleição presidencial os dois candidatos mais rejeitados do país.
O populista de direita Jair Bolsonaro (PSL) recebeu mais de 46% dos votos e por pouco não levou a Presidência já no primeiro turno. Em segundo lugar, Fernando Haddad (PT), indicado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, somou 29% dos votos. A julgar por esses resultados, o populismo de direita sairá vitorioso no dia 28 de outubro.
O resultado deste domingo é fruto de uma eleição de mal-informados. As pesquisas de intenção de votos erraram em várias previsões. Os analistas subestimaram Bolsonaro e superestimaram os partidos do establishment e suas métricas ultrapassadas, como tempo de TV e alianças políticas. Grande parte dos eleitores, por sua vez, confiou nas redes sociais, principalmente em memes de Whatsapp, como fonte de informação. As opiniões moderadas e o debate programático foram atropelados por uma avalanche de notícias falsas e fanatismo.
Não é que os brasileiros não tivessem escolha. Outros candidatos na corrida presidencial teriam possibilidade de conduzir o país por águas menos turbulentas. Mas a vontade popular escolheu o embate entre polos opostos. O radicalismo foi a opção democrática da maioria.
Essa escolha diz muito sobre as contradições dos brasileiros. Ao mesmo tempo que querem combater a corrupção, flertam com o autoritarismo justamente no momento em que o combate à corrupção mais avança, investiga e pune poderosos. Ao mesmo tempo que querem superar a recessão econômica, escolhem políticos que terão imensos problemas para governar. Se escandalizam com a estatística de 60 mil homicídios por ano no país, mas ignoram que a vasta maioria dos mortos são homens negros de baixa renda, os mesmos que serão assassinados sistematicamente, com apoio da população, se a polícia receber carta branca do Estado para matar.
O Brasil chegou a esse ponto por uma combinação de fatores que vêm fermentando na sociedade pelo menos desde 2013, quando milhões de pessoas foram às ruas insatisfeitas com o sistema e, desde então, seguem estabanadas tomando decisões que apenas pioram a própria situação.
Ao não conseguir dar uma resposta a reivindicações populares difusas, os políticos tradicionais perderam a confiança da população. A centro direita democrática se enredou em alianças para viabilizar o impeachment de Dilma Rousseff, embarcou no governo impopular de Michel Temer e não conseguiu dar a volta para produzir um candidato viável que atendesse aos anseios do eleitorado conservador. Mesmo depois de assistir a fenômenos como o Brexit, Donald Trump e a onda populista na Europa, não conseguiu se organizar para frear a extrema direita.
A centro esquerda, por sua vez, rachou após o PT querer apostar a todo custo na figura do ex-presidente Lula, político mais amado e odiado do país. Preso há seis meses por corrupção e lavagem de dinheiro, Lula diz que é vítima de lawfare, e sua candidatura virou estratégia de defesa processual. Para defender Lula, seu partido se recusou a abrir mão do protagonismo na eleição de 2018 e acabou prestando um desserviço à esquerda, já que grande parte do apoio a Bolsonaro é fruto apenas do ódio ao PT.
Assim, a inépcia da centro esquerda e da centro direita jogaram os eleitores nos braços de populistas autoritários, racistas, homofóbicos e misóginos. Com suas soluções simples para problemas complexos, eles conquistaram um eleitorado que não tem paciência para nada que exija mais reflexão do que um post de rede social que reafirme seus próprios preconceitos. Pois muitos dos 46% que votaram em Bolsonaro neste domingo são, sim, racistas, homofóbicos e misóginos como seu candidato. Outra parte se perdeu na neurose da ameaça comunista, que não existe.
E quando uma parcela tão grande da população embarca na lógica do "não sei, não quero saber e tenho raiva de quem sabe", que chances têm os democratas contra os populistas?
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