Angela Merkel parece estar libertada. Desde que transmitiu a presidência do seu partido, a União Democrata Cristã (CDU), para Annegret Kramp-Karrenbauer, também conhecida como AKK, em dezembro do ano passado, é visível como ela está apreciando seu cargo de chanceler federal da Alemanha. Livre de amarras intrapartidárias, ela agora governa menos para dentro e mais para fora. E, segundo demonstram as mais novas pesquisas de opinião, a maioria dos alemães quer vê-la no cargo pelo maior tempo possível.
Enquanto isso, AKK cuida das fileiras divididas no interior da CDU e aumenta a própria visibilidade. Tanto ela quanto Merkel ganharam tempo e margem de manobra para preparar uma transmissão de poder ordenada. De um ponto de vista estritamente teórico, essa "divisão de trabalho" poderá perdurar por bastante tempo – e, oficialmente, também é preciso que seja assim.
Mas a realidade política é outra. Não vai mais demorar muito para que a chanceler entregue completamente o poder.
Nesse contexto, não é apenas a evolução da política interna alemã que é importante – além das eleições para o Parlamento Europeu, em maio, haverá vários pleitos estaduais fundamentais este ano. Se a CDU registrar outra queda violenta no número de votos – e, segundo prognósticos atuais, esse cenário não é improvável – pode ser que haja turbulências.
O caminho de emancipação de AKK também impressiona: em toda oportunidade que tem, a candidata ideal de Merkel se diferencia da chanceler. Ela dialoga diretamente com integrantes conservadores frustrados da CDU, adota um curso nitidamente mais restritivo no âmbito da política de migração e faz piadas politicamente incorretas.
No último fim de semana (10/03), não foi a chanceler, mas aquela que se vê como sua sucessora que respondeu ao apelo do presidente francês, Emmanuel Macron, por uma reforma da União Europeia. Com isso, AKK reivindicou, de forma inequívoca, a participação também em temas de política externa, e emitiu um sinal claro – principalmente para o exterior. Somente esse passo sugere que a troca – seja como acontecer e funcionar – pode estar bastante próxima.
É especialmente uma coisa que pode adiá-la: ruidosos pedidos de renúncia de Angela Merkel. Ela não quer e não vai deixar o cargo sob pressão. Ainda que o momento exato da despedida continue incerto, a chanceler governa somente a longo prazo, segundo ela mesmo já disse.
Sim, ela deixou a liderança do partido sob pressão. E daí? Todos os seus antecessores, sem exceção, continuaram colados na cadeira de chanceler mesmo sob pressão, até que os eleitores ou o Parlamento os retiraram do poder.
Em vez disso, como pragmática, foi a própria Merkel que definiu sua saída de forma soberana. Isso é algo completamente novo na máquina política alemã, anteriormente dominada por homens. Talvez por isso alguns não consigam enquadrar exatamente os acontecimentos.
O que também é verdade é que a chanceler está levando o momento de sua partida até o limite. O que não é prova de leviandade, mas sim de consciência de poder e de responsabilidade. Merkel não joga a toalha quando os outros pedem, mas quer escolher o momento da saída, quando servir tanto a ela quanto à estabilidade na Alemanha. Num ano em que o partido da chanceler precisará se afirmar várias vezes contra populistas, pode-se prever alguns momentos para a retirada. Mas, alguma vez, essa chanceler já demonstrou ser previsível?
Por isso, ainda poderá demorar algumas semanas ou meses até que Angela Merkel dê o próximo passo. Provavelmente, ela surpreenderá novamente com o momento concreto. Um conselho a todos os impacientes: aproveitem a calmaria antes da tempestade. É que nem a troca, nem tudo o que vem depois dela, deverão transcorrer tão calmamente quanto o mandato da chanceler.
Rosalia Romaniec chefia a redação de Política da DW
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