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Opinião: A Catalunha e a catástrofe anunciada

Gabriel González
27 de outubro de 2017

Tanto Madri como Barcelona são culpados por situação ter chegado a este ponto. UE não pode continuar se esquivando. É hora de agir com algo mais do que palavras, opina o jornalista Gabriel González.

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Spanien "Esteladas" und spanische Flaggen in Barcelona
Foto: picture-alliance/AP Photo/E. Morenatti

Dois trens estão em rota de colisão na Espanha, a toda velocidade, e ninguém parece capaz de detê-los: nas últimas semanas a mídia explorou até a última gota essa imagem da teimosia e obstinação com que se tem tratado a crise em torno da autonomia catalã, tanto em Madri como em Barcelona.

Agora os trens acabaram por bater de frente, com força total. A Catalunha proclamou sua independência, e o Senado espanhol aplicou pela primeira vez o artigo 155 da Constituição, que prevê a deposição do governo catalão e a retirada dos direitos de autonomia.

Gabriel González
Gabriel González é jornalista da redação espanhola da DW

Este é, sem dúvida, um dia histórico para a Espanha; ou, formulando-se de forma mais neutra, um dia que representa uma cesura profunda. Quatro vezes na história da região proclamou-se algo parecido com uma "República Catalã" ou um "Estado Catalão". A primeira foi no século 17, durante a Guerra dos Segadores; depois na Primeira República Espanhola, em 1873; e então mais duas vezes na Segunda República, às vésperas da Guerra Civil, em 1931 e 1934.

Em todos esses antecedentes, não se tratou de uma declaração de independência total, mas de proclamações de um Estado catalão independente, no contexto de uma Espanha de caráter federal. A maioria dessas "independências" da Catalunha não durou mais do que uns poucos dias.

Isso torna ainda maior a perplexidade diante da atual declaração de independência, pela primeira vez completa, e faz perguntar como isso foi possível. Por que justamente agora, no ano de 2017, no quadro de uma Espanha democrática, de Estado de Direito, que concede direitos de autonomia abrangentes aos catalães e lhes garante bem-estar e paz, no seio da União Europeia (UE)?

Para responder a isso é preciso olhar primeiramente para a Espanha – mas não exclusivamente. É um atestado de assustadora falta de imaginação o modo como o conservador Partido Popular (PP), que governa em Madri, tendo o rígido Mariano Rajoy à frente, tentou atravessar essa crise ímpar para a Espanha apenas pela letra da lei, sem qualquer senso de empatia ou sensibilidade diplomática.

Rajoy não está à altura de seu cargo e contribuiu significativamente para o agravamento da crise, o mais tardar desde 2010, quando, impulsionado por ele, o Tribunal Constitucional derrubou o estatuto de autonomia da Catalunha, atualizado de 2006.

Está claro que, na procura por causas e responsabilidades, é preciso olhar também para Barcelona. O político regional Lluis Rabell advertiu recentemente, em alusão ao referendo da Escócia: "Cuidemos para não adormecer com o sonho da Escócia e acordarmos na Irlanda do Norte." Nos próximos dias vai-se ver se os propagandistas populistas de uma independência unilateral e ilegal transformarão a Catalunha numa Irlanda do Norte mediterrânea. Algo que ninguém quer, mas que há motivos para temer.

Quando se chegar a esse ponto, até mesmo o político mais sonolento da UE perceberá que não se trata mais de um problema exclusivamente espanhol. Uma nova espécie de "gripe espanhola", na forma de declarações de independência unilaterais, poderá acometer também outras nações europeias.

A UE não pode se esquivar permanentemente, como no caso da Escócia e, agora, da Catalunha. Ela precisa finalmente providenciar uma "caixa de primeiros socorros", a fim de contribuir construtivamente para a solução do problema quando, como no caso da Espanha, o governo central estiver totalmente sobrecarregado.