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Liberdade de imprensa à la Bolsonaro

31 de outubro de 2018

O futuro presidente do Brasil diz respeitar a liberdade de opinião, mas no mesmo fôlego ameaça a mídia crítica. A luta em defesa do Estado democrático de direito apenas começou, opina a jornalista Astrid Prange.

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Passeata pró-Bolsonaro no segundo turno das eleições, 28/10/2018
Foto: Getty Images/AFP/C. de Souza

"Chega de mentira, chega de fake news. Realmente, agora estamos numa outra época. Eu quero governar para todos." Em suas primeiras entrevistas em seguida à vitória eleitoral, o futuro presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, se pronunciou nitidamente pela liberdade de imprensa e de opinião.

Essas são as boas notícias. Mas com isso estarão descartados todos os temores de que, após as eleições, a quarta maior democracia do mundo possa estar gradativamente se despedindo do Estado democrático de direito?

Bolsonaro tem razão: o Brasil está numa nova época, na qual se redefine a relação entre o poder e a mídia. Pois até então as campanhas eleitorais no maior país da América do Sul se decidiam na televisão. Os partidos com a propaganda eleitoral mais longa e o melhor desempenho nos duelos televisivos eram os que se davam melhor nos pleitos presidenciais e legislativos.

Desta vez, porém, tudo foi diferente. Durante a campanha, o candidato só participou de um único debate na TV. Sua presença televisiva se resumiu a entrevistas exclusivas à TV Record do fundador da Igreja Universal do Reino de Deus, Edir Macedo, entre cujos espectadores estão muitos eleitores de Bolsonaro.

As extensas entrevistas à emissora não foram apenas um sinal para os bolsonaristas, como também uma afronta perante a superpoderosa concorrência da campeã de mercado TV Globo. E isso não é tudo: também com a mídia impressa, até agora Bolsonaro tem mantido uma relação pouco amistosa. Por várias vezes ele tachou como "fake news" o noticiário dos jornais e revistas, e transferiu sua campanha para Facebook, Twitter e Whatsapp.

Sobretudo nos grupos fechados do Whatsapp, as notícias falsas jorraram em grande quantidade das nuvens digitais. Lá, milhões de usuários ficaram sabendo, por exemplo, que as urnaseletrônicas seriam supostamente suscetíveis a fraude; e que o oponente Fernando Haddad, do PT, pretenderia educar para a homossexualidade até alunos de escola primária de seis anos de idade.

Embora o Tribunal Superior Eleitoral tenha proibido expressamente a difusão dessas notícias falsas, não havia mais como extirpar a imputação da órbita digital. E tampouco das cabeças de milhões de brasileiros. Parece que nem próprio Bolsonaro conseguiu escapar dessa órbita. Pois, no mesmo fôlego em que, após a vitória, declarava a liberdade de opinião como "sagrada" e dizia que a oposição era "bem-vinda", ele profetizou que o maior jornal brasileiro, a Folha de São Paulo, deixaria de existir "por si mesmo".

Na linguagem do futuro presidente, tais ameaças são envolvidas em algodão verbal: "Não quero que [a Folha] acabe. Mas, no que depender de mim, imprensa que se comportar dessa maneira indigna não terá recursos do governo federal", afirmou numa entrevista à TV Globo.

Portanto não haverá mais anúncios do novo governo brasileiro na mídia de cunho crítico. Na mesma entrevista, Bolsonaro acusou a Folha  mais uma vez de divulgar notícias falsas sobre a campanha dele. O noticiário da TV Record, em contrapartida, ele classificou como imparcial.

A noção de liberdade de imprensa à la Bolsonaro mostra que a polarização continua, após o resultado das urnas, assim como a intimidação dos veículos malquistos. Ele venceu a primeira prova de força, a segunda apenas começou – assim como a luta para defender o Estado democrático de direito.

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