"O vírus não quer necessariamente matar a humanidade"
17 de janeiro de 2006A urgência no combate à gripe aviária fica patente na realização da conferência internacional de doadores em Pequim, com participantes de 89 países. O maior temor é que o vírus causador da doença mute e se torne transmissível de pessoa a pessoa.
Na Turquia, onde já houve quatro mortes de pessoas infectadas por aves, a Organização Mundial de Saúde confirmou um caso de mutação do H5N1. A DW-WORLD perguntou a um virólogo o que isso significa.
DW-WORLD: Até que ponto a mutação do vírus H5N1 já constatada pela Organização Mundial da Saúde é perigosa?
Dr. Christian Drosten: A constatação do fato, desde que a mutação se manifeste num vírus isolado, não teria em si grande significado. Mutações isoladas não significam necessariamente que o vírus tenha se tornado mais perigoso. Os biólogos falam sempre da diferença entre o genótipo e o fenótipo. Quando ocorre uma mutação no genoma, isso não significa que haja um efeito funcional, ou seja, que ela implique em transmissibilidade.
O que isso quer dizer?
O mais importante é observar sempre como a epidemia está transcorrrendo. O que se vê na Turquia no momento é o mesmo que se viu em Hong Kong há três anos. Só se infectam as pessoas que têm contato direto. Naquela época não houve um alastramento dos casos, e há razões para isso. Mas às vezes surgem mutações que são definitivamente prejudiciais. O vírus não quer necessariamente matar a humanidade. Ele só quer se aninhar num organismo qualquer – normalmente, numa galinha.
Então o vírus não tem interesse em se adaptar aos humanos?
O vírus não tem nenhum interesse em dar preferência ao ser humano em detrimento do frango. Existem populações de galináceos tão numerosas que o vírus se sente muito bem.
Ainda assim consta que a epidemia de 1918 irrompeu justamente por causa de uma mutação.
Não foi apenas uma mutação que causou a gripe, mas sim toda uma série de mutações, e mesmo assim não se sabe se isso bastou. Não se conhece exatamente o precursor do vírus da gripe de 1918.
Afinal, por que é que os vírus mutam?
Porque as enzimas que atuam na replicação dos vírus não são lá muito eficientes. Elas cometem muitos erros na reprodução física. E quase nenhum vírus tem enzimas com atividades corretoras. Então, a toda hora acontecem mutações, e a maioria delas é mortal para o vírus.
Há como prevenir mutações?
Por meio do mecanismo biológico, não há como prevenir mutações. O que se pode fazer é reprimir o processo no qual as mutações acontecem – justamente a replicação, quer dizer, a reprodução. No caso do H5N1, isso significa eliminar as massas de vírus replicantes matando as galinhas infectadas.
O Dr. Christian Drosten é diretor da seção de diagnóstico viral do Instituto Bernhard Nocht de Medicina Tropical de Hamburgo.