O que será do PT pós-impeachment?
4 de setembro de 2016A queda de Dilma Rousseff não encerra as dificuldades do PT. Apesar de não ter figurado sozinho na série de escândalos de corrupção que estouraram nos últimos dois anos, o partido foi a sigla que mais sofreu impacto. Hoje, tem vários nomes na cadeia e está ameaçado por um racha interno.
Mas são as eleições municipais que devem escancarar mais os desafios e o encolhimento do PT pós-impeachment. Em comparação com 2012, o número de candidatos a prefeito filiados ao partido caiu pela metade. Eram 1.829 em 2012. Desta vez, a sigla só vai lançar 992.
Entre os candidatos a vereador, a queda foi similar. Em 2012, o partido lançou quase 41 mil filiados ao cargo. Desta vez, são apenas 21,6 mil. Para efeito de comparação, o PMDB de Michel Temer, que também sofreu acusações de corrupção, vai contar com 2.360 candidatos a prefeito – praticamente o mesmo número de 2012.
A desidratação do partido não está ocorrendo só no número de candidaturas. O PT também vem perdendo quadros que já ocupam cargos. Cerca de um quarto dos 632 prefeitos eleitos pelo PT em 2012 deixaram a sigla, entre eles Luciano Cartaxo, prefeito de João Pessoa, que passou para o PSD. Hoje o partido só governa três capitais. Em 2004, o número chegou a nove.
Ao se desligar do partido, Cartaxo disse que não queria ser penalizado localmente por "questões que acontecem em âmbito nacional". Hoje ele lidera a corrida à prefeitura com 52% das intenções de voto, um número bem melhor do que o de prefeitos ainda filiados ao PT que tentam se reeleger, como Fernando Haddad, que conta com 9% em São Paulo. Pesquisas mostram que o partido só deve manter o governo de uma capital, a pequena Rio Branco, e tem alguma chance de conquistar o Recife.
Entre os que permanecem, tem vigorado uma posição de se distanciar da imagem do partido. Essa crise de identidade é visível em várias campanhas. Diversos candidatos estão escondendo símbolos da sigla, como a estrela e a cor vermelha. A campanha de Haddad recebeu críticas da direção do partido por estampar uma estrela minúscula em seus cartazes eleitorais. Em Maceió e São José dos Campos (SP), os candidatos resolveram esconder o vermelho de sua propaganda política.
Antigo vice-líder do governo Dilma na Câmara e presidente do diretório paranaense do PT, o deputado Enio Verri admite que o cenário é pessimista. Segundo ele, a tendência é que o partido saia com metade do tamanho atual depois das eleições. Ainda de acordo com Verri, o momento também é apropriado para uma autocrítica.
"Nos sempre questionamos tudo, crescemos sendo diferentes, mas no governo passamos a ter o mesmo comportamento de outras legendas, abrindo mão de alguns valores. Não podemos mais fugir desse aspecto", afirma.
Brigas internas
Só que essa autocrítica deve depender de lutas internas. No momento, o partido também está ameaçado por disputas entre as alas que comandaram o PT na última década e setores reformistas, que acusam a velha guarda de ter desmoralizado a sigla com escândalos de corrupção.
Entre os reformistas está o ex-governador Tarso Genro, da tendência Mensagem ao Partido, que nos últimos meses vem propondo uma refundação do PT. O gaúcho não esconde sua insatisfação com o grupo que comanda o PT, encabeçado por Rui Falcão.
Recentemente, Tarso acusou a direção nacional de abandonar Dilma quando os caciques rejeitaram a proposta de novas eleições, que vinha sendo uma bandeira da ex-presidente. "Omitiram todos os erros sem um pio. Agora que Dilma aponta, corretamente, querer responder com a soberania popular, direção do PT diz não", disse Tarso. Na prática, a posição de direção nacional sinalizou um abandono de Dilma.
Outros setores mais à esquerda também não esconderam sua insatisfação com o apoio da direção nacional à candidatura do democrata Rodrigo Maia à Presidência da Câmara, acusando os caciques de insistirem no jogo político que levou o PT à atual crise. A ala reformista até lançou um movimento interno chamado "Muda PT".
"O projeto do PT continua válido, mas o partido precisa passar por uma fase de debates e discutir como renovar seus quadros", afirma Dawid Bartelt, diretor da Fundação Heinrich-Böll no Brasil, ligada ao Partido Verde alemão.
O cientista político Rolf Rauschenbach, da Universidade de St. Gallen, na Suíça, concorda. "O impeachment marca o início de uma terceira fase para o PT, depois de um longo período inicial de oposição e 13 anos no governo. A legenda, que antes tinha um programa e apelo popular, hoje não parece muito diferente de outros partidos que são meros veículos para seus caciques. A sigla traiu a própria origem. Eles precisam reformular o programa e trabalhar pela renovação do quadro de lideranças se não quiserem ser jogados em uma vala comum. Isso é uma coisa que vale até para o PSDB", opina.