O que o Irã busca com o enriquecimento de urânio?
13 de setembro de 2022O programa nuclear iraniano tem finalidades militares? Isso é dado a entender num relatório da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) divulgado no início de setembro em Viena. O documento aponta que o Irã continuou a enriquecer urânio para muito além do limite estabelecido no acordo nuclear de 2015. Em agosto, disporia de um estoque estimado em 3.940 quilos – 19 vezes mais do que o acordado.
A AIEA afirma não poder "garantir que o programa nuclear iraniano seja exclusivamente pacífico". O relatório ressalta que não houve progresso em relação à existência de material nuclear em locais não declarados. O chefe da agência, Rafael Grossi, considera a situação preocupante, e exigiu que o Irã "cumpra as obrigações legais" e coopere o mais rápido possível.
Em outro relatório, a agência lamentou a decisão de Teerã, anunciada em junho, de remover 27 câmeras de vigilância que permitiam a inspetores da AIEA monitorar as atividades nucleares. A agência afirmou que a remoção "afeta negativamente" a capacidade de garantir a finalidade pacífica do programa nuclear.
Embora o país tenha restringido o acesso da AIEA, esta avalia que o Irã continuou acumulando urânio enriquecido nos últimos meses. Segundo fontes diplomáticas de Viena, com base nos atuais progressos o país asiático necessitaria de "três ou quatro semanas" para alcançar a quantidade necessária a uma bomba atômica.
Ainda está longe da bomba atômica
A estimativa não significa, contudo, que o Irã teria uma bomba atômica nesse prazo. De acordo com cientista político Mohammadbagher Forough, do Instituto Alemão para Estudos Globais e Regionais (Giga), a quantidade de urânio enriquecido é suficiente para construir uma única bomba, e não uma série completa.
"Militarmente, apenas uma bomba não faz sentido. Os Estados nucleares não apostam numa bomba única, pois com isso não é possível conduzir nenhuma guerra. É insuficiente, quando se parte do princípio que outros países possuem muito mais, e os efeitos de usá-las seriam muito mais graves", argumenta Forough.
O especialista acrescenta que Teerã está longe de ter uma bomba atômica também por outras razões, como, por exemplo, ainda possuir a tecnologia de detonação necessária. "A história dos Estados nucleares mostrou que são necessários anos para a construção desse armamento. A AIEA descreveu a situação como séria, mas não se deve concluir que o Irã está prestes a ter uma bomba nuclear."
Ainda assim o cientista político Oliver Meier, do Instituto para Pesquisa sobre Paz e Segurança Política de Hamburgo, considera preocupante o fato de o Irã possuir cada vez mais urânio enriquecido. Ele lembra que o país chegou a possuir um reator nuclear onde era possível produzir plutônio.
Teerã faz pressão política
Embora aparentemente ainda não possua a tecnologia necessária para a construção de bomba nuclear, o Irã continua a enriquecer urânio. Na avaliação de Forough, com essa estratégia Teerã busca, acima de tudo, aumentar a pressão política.
Para o país, as condições estabelecidas no acordo nuclear perderam a validade quando o governo de Donald Trump o rescindiu unilateralmente, em 2018. "Assim, o enriquecimento de urânio é sobretudo um meio para conseguir que os Estados Unidos e outros atores assinem um acordo na medida do possível negociado em Viena."
Segundo o especialista, com a aproximação de eleições legislativas nos EUA e a possibilidade de o governo democrata de Joe Biden perder a maioria no Congresso, a assinatura de um acordo fica mais improvável, daí a pressão iraniana. O especialista acrescenta que para Teerã o mais importante é acabar com as sanções.
Meier avalia que o próprio Irã tem atrapalhado o progresso das negociações, e que o diálogo fica mais complicado quando as inspeções da AIEA são dificultadas. Por isso a própria agência afirmou que o pacto precisa de medidas adicionais para melhorar o monitoramento do programa nuclear iraniano. "Há muitas questões em aberto, e é importante esclarecê-las rapidamente."