O mundo deve se preocupar com a manobra militar da China?
11 de abril de 2023Pela segunda vez em menos de um ano, a China realizou um grande exercício militar em torno de Taiwan. Em uma clara demonstração de poderio bélico, dezenas de aeronaves chinesas cruzaram a linha mediana do Estreito de Taiwan no sábado (08/04), enquanto caças e navios de guerra simularam "ataques" a alvos cruciais na ilha de Taiwan e em águas circundantes.
A imprensa estatal chinesa afirmou que o Exército de Libertação Popular da China (ELP) mantém "a situação de cerco à ilha". O Ministério da Defesa de Taiwan confirmou nesta segunda-feira que um grupo de porta-aviões chinês participou dos exercícios militares.
A situação preocupou especialistas locais diante da possibilidade de a China lançar agora um ataque a Taiwan pelo leste, ameaçando a capacidade da ilha autogovernada e democrática de manter sua força militar.
Especialistas militares avaliam que, com os exercícios recentes, o ELP quer mostrar que tem poder de fogo para destruir alvos cruciais em diferentes partes do Estreito de Taiwan.
O exercício de três dias foi uma resposta a uma reunião entre a presidente de Taiwan, Tsai Ing-wen, e o presidente da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos, Kevin McCarthy, no estado americano da Califórnia, algo que irritou Pequim.
Alerta chinês
O recente exercício militar foi mais breve do que o realizado em agosto do ano passado, depois da visita da então presidente da Câmara dos EUA, Nancy Pelosi, a Taiwan. "Para reduzir o impacto da manobra na região, a China planejou um exercício de três dias, em vez de uma semana como agosto do ano passado", avalia Tzu-yun Su, analista do Instituto para Pesquisa em Defesa Nacional e Segurança em Taiwan (INDSR).
Para Amanda Hsiao, analista sênior sobre China na ONG International Crisis Group, Pequim acredita que as demonstrações de força militar são necessárias para "dissuadir os EUA e Taiwan de se engajarem em mais intercâmbios e cooperações de alto nível no futuro".
Tanto Taiwan quanto os EUA condenaram no sábado os exercícios militares chineses. A presidente taiwanesa prometeu ainda trabalhar com Washington e outros países diante da expansão autoritária. O Departamento de Estado americano pediu comedimento.
Além da tentativa de dissuadir uma maior aproximação entre Taipei e Washington, alguns analistas acreditam que a China está tentando demonstrar os vários tipos de ação que pode promover contra Taiwan quase "diariamente".
Segundo Ben Lewis, um analista independente de segurança baseado nos EUA, Pequim respondeu inicialmente ao encontro entre Tsai e McCarthy com ações menos provocativas, como inspeções de navios no Estreito de Taiwan, antes de realizar um exercício militar na região depois que o presidente francês, Emmanuel Macron, e a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, deixaram a capital chinesa.
"É um exemplo claro do espectro de opções disponíveis a Pequim para pressionar Taiwan", destaca Lewis.
O porta-voz do ELP, Shi Yin, descreveu o exercício militar recente – que contou com uma ampla gama de operações – como "um alerta sério contra a conspiração entre forças separatistas que desejam a independência de Taiwan e forças externas e contra suas atividades provocadoras".
Risco de acidentes e isolamento
Segundo Hsiao, com o grande número de aeronaves chinesas cruzando a linha mediana do Estreito de Taiwan, haverá um aumento dos encontros entre militares chineses e taiwaneses, o que poderia elevar o risco de "uma colisão não intencional".
"Devido à atmosfera de desconfiança e à falta de canais de comunicação no estreito para lidar com acidentes militares, existe o potencial de uma escalada após um acidente", acrescenta a especialista.
O Ministério da Defesa de Taiwan afirmou estar monitorando as atividades da unidade do ELP responsável pelo sistema de mísseis terrestres da China, e enfatizou que responderá ao exercício militares chinês de "forma calma e serena".
Enquanto Pequim reitera sua objeção a qualquer relação oficial entre Taiwan e EUA, alguns especialistas afirmam que a tendência crescente da China de usar suas capacidades militares para alcançar objetivos políticos pode criar um precedente perigoso na região do Indo-Pacífico.
"[O presidente chinês] Xi Jinping está apresentando a Taiwan uma escolha dicotômica: que eles desejam que Taiwan seja unificada à China pacificamente ou Pequim invadirá a ilha e a anexará", argumenta Lewis.
Para o analista, um sinal preocupante é que a China pode decidir realizar um grande exercício militar ao redor da ilha sempre que um presidente de Taiwan se encontrar com autoridades do alto escalão dos EUA. "É um precedente muito preocupante para eles estabelecerem."
Reação dos Estados Unidos
Segundo Tzu-yun Su, a resposta agressiva de Pequim ao encontro nos EUA reflete sua atitude de "lobo guerreiro". "A impressão desfavorável sobre a China pode levar os Estados Unidos a aumentarem os esforços para conter a China militarmente", afirmou o analista, acrescentando que, com Japão e Filipinas se tornando parceiros estratégicos de Washington na região do Indo-Pacífico, Pequim pode ficar mais isolada estrategicamente depois dos exercícios.
Numa entrevista à emissora americana Fox News, o presidente do Comitê do Exterior da Câmara dos EUA, Michael McCaul, afirmou que a "fanfarronice" da China apenas "consolidará" a determinação de Washington contra Pequim. "Não tem efeito de dissuasão sobre nós", comentou.
Para Ben Lewis, o Congresso americano pode ajudar a desenvolver o apoio público a Taiwan e garantir que os encontros com o lado taiwanês sejam produtivos. "O Congresso deveria determinar quais são as necessidades de Taiwan, usar o dinheiro que eles já destinaram na Lei de Autorização de Defesa Nacional de 2023 e ajudar a informar o Executivo americano sobre as necessidades do governo de Taiwan. Isso beneficiará bastante tanto Taiwan quanto os EUA", avalia.