O empresariado brasileiro apostou mal em Bolsonaro?
14 de agosto de 2019O acordo entre o empresariado e o governo de Jair Bolsonaro é o seguinte: enquanto a equipe econômica governamental aplicar as reformas necessárias, investidores e empresários ignoram ou toleram seu curso populista de direita.
Tomando como base minhas experiências na economia e indústria relativas ao apoio ao presidente, eu diria que vale a seguinte fórmula: um terço dos interlocutores do setor ignora o que vem de Brasília e se concentra nos assuntos do dia; um terço defende até as declarações e comportamentos mais extremos do presidente; e um terço se envergonha de Bolsonaro.
Contudo, mesmo os que se envergonham de sua política, ressalvam: "No fim das contas, o governo Bolsonaro decreta as reformas pelas quais esperamos há quase duas décadas, sem as quais o Brasil não será competitivo." Eles se referem à reforma da Previdência, que enfim contém o crescimento do déficit público; às privatizações – por exemplo, no setor energético e nos aeroportos – longamente esperadas e possibilitando novos investimentos, pois o Estado está falido.
A referência é igualmente ao fechamento do acordo entre o Mercosul e a União Europeia, após 20 anos de negociações, e que abrirá a economia fechada do Brasil; à reforma trabalhista, que o governo segue impulsionando; e, por fim, ele negocia atualmente sobre uma reforma tributária, também urgente para baixar os altos custos do Brasil.
De fato, em oito meses o governo Bolsonaro pôs em andamento diversas reformas há muito esperadas. No entanto a estratégia do empresariado de neutralidade diante dele é arriscada. Cresceu o risco de o presidente, com seu curso errático, colocar em questão o sucesso das próprias reformas.
Por um lado, isso se deve a ele personalizar cada vez mais decisões que são fundamentais para a economia, decidindo exclusivamente em interesse próprio e de seu clã familiar. Ele coloca um colega de escola de seus filhos na presidência do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES); proíbe que a Petrobras aumente os preços do combustível; critica as agências reguladoras de serviços públicos e ameaça esvaziá-las.
Bolsonaro antagoniza parceiros comerciais importantes do Brasil, desde a China, passando pelo Oriente Médio, até possivelmente o futuro governo da Argentina – o único mercado em que os produtos industriais brasileiros ainda são até certo ponto competitivos. Sua política para a Amazônia é um flanco aberto para os lobbies econômicos europeus que trabalham contra uma abertura de mercado na América do Sul.
Seria possível continuar essa lista. O comportamento dirigista de Bolsonaro não é nada de novo em questões econômicas, porém ele se tornou mais agressivo, ofensivo e irracional, aumentando o potencial perturbador para a economia.
A probabilidade agora é – e esse é o grande risco que vejo – que as intervenções do presidente aumentem também no empresariado. Pois a economia brasileira míngua em sua presidência. Depois de dois anos de recessão e dois de estagnação, a economia não pega impulso; o PIB caiu 0,2% no primeiro trimestre de 2019, e a previsão é de nova contração no segundo.
Os motivos para tal são conhecidos: os investidores hesitam em investir enquanto suas capacidades não estão esgotadas; os consumidores seguem altamente endividados e temem perder seus postos de trabalho (se têm um emprego); a guerra comercial no mercado mundial puxa para baixo os preços de produtos agropecuários e matérias-primas. São baixas as perspectivas de que esse cenário negativo vá se alterar, no curto prazo.
Tudo isso aumenta o perigo de que Bolsonaro vá também se ocupar da economia, um setor de que ele, segundo tem afirmado até agora, nada entende. Contudo, se sua tão elogiada equipe não conseguir produzir nem um pouquinho de crescimento, é apenas uma questão de tempo até o "Capitão" tomar o assunto nas próprias mãos.
Se Bolsonaro seguir o lema "Tenho que resolver tudo sozinho, nada anda sem mim", seus torcedores na família e nas redes sociais vão festejá-lo. E aí empresários e investidores perceberiam que fizeram um acordo perigoso, e que talvez tenham apostado no cavalo errado. Vamos torcer para que esse cenário não se concretize.
Há mais de 25 anos o jornalista Alexander Busch é correspondente de América do Sul do grupo editorial Handelsblatt (que publica o semanário Wirtschaftswoche e o diário Handelsblatt) e do jornal Neue Zürcher Zeitung. Nascido em 1963, cresceu na Venezuela e estudou economia e política em Colônia e em Buenos Aires. Busch vive e trabalha em São Paulo e Salvador. É autor de vários livros sobre o Brasil.
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