Novo governo promete revolução climática na Alemanha
27 de novembro de 2021O governo que vai suceder Angela Merkel na Alemanha será uma aliança chefiada pela centro-esquerda, com o social-democrata Olaf Scholz como chanceler federal, em parceria com liberais e verdes. A gestão terá uma política climática ambiciosa no topo de sua agenda.
A aliança é formada pelos partidos Social-Democrata (SPD), Verde e Liberal Democrático (SPD). Sua plataforma de governo promete manter a Alemanha rumo à meta de "1,5 grau Celsius”, cifra que representa a temperatura máxima em que a Terra se aqueceria frente aos níveis pré-industriais.
Os planos do novo governo incluem a eliminação gradual da energia do carvão até 2030, oito anos antes da atual meta; fazer com que 80% da energia elétrica consumida venha de energias renováveis dentro de uma década; e levar 15 milhões de veículos elétricos às ruas alemãs até 2030. Também propõe a eliminação gradual do gás como energia até 2040.
Um novo "superministério do clima e economia” seria encabeçado pelo político Robert Habeck, do Partido Verde, e daria a força burocrática necessária para que essas medidas ambiciosas sejam implementadas.
Um acordo climático
Em meio à decepção com os resultados da COP26, grupos ambientalistas e analistas climáticos saudaram inicialmente as novas medidas do futuro governo da Alemanha.
"O texto dá um importante impulso à política climática e à conservação da natureza", disse em comunicado a ONG Friends of the Earth. "Nós saudamos expressamente este progresso em comparação com o governo anterior". Ainda assim, advertiu a ONG, as metas climáticas não garantem sozinhas um caminho para a meta de 1,5 grau Celsius.
Charles Moore, do instituto Ember, sediado em Londres, diz que o aumento das energias renováveis para alimentar 80% da rede energética da Alemanha até 2030 é um "compromisso realmente ousado" - especialmente quando associado à promessa de colocar milhões de carros elétricos nas ruas até o final da década.
"É um voto de confiança em nosso futuro elétrico e na descarbonização de nosso sistema energético", afirma.
Moore ajudou a elaborar um relatório de 2020 detalhando afracassada transição energética da Alemanha, que falhou devido a uma forte dependência do carvão. Mas a nova agenda climática o deixa mais otimista.
"Minhas preocupações com o carvão na Alemanha diminuíram muito", disse ele após o anúncio do programa de governo. Ele acredita que o acordo climático está de acordo com a prescrição da Agência Internacional de Energia (AIE) de que o aumento da capacidade das energias renováveis é a maneira mais rápida, mais barata e mais eficiente de reduzir as emissões de gases de efeito estufa.
Ambientalistas veem progresso
A coalizão de governo afirma que suas políticas colocarão a Alemanha no caminho da meta de 1,5 grau Celsius, mas ambientalistas duvidam. A ONG Friends of the Earth "vê isso com grande ceticismo", em parte devido à falta de "caminhos de expansão anual" específicos para energia solar e eólica. A ONG diz ainda que a meta de alcançar a neutralidade climática até 2045 "é tardia demais para apenas 1,5 grau Celsius".
Ativistas do movimento Fridays for Future haviam exigido que um compromisso de 1,5 fosse central para as negociações da coalizão governamental alemã. Mas, ao final, também ficaram desiludidos com o resultado.
"Medido perante o fracasso que foi a grande coalizão, estamos vendo progresso", escreveu o Fridays for Future na Alemanha, referindo-se ao último governo Angela Merkel. "Medido perante a realidade da crise climática, este programa do governo não será suficiente".
Há também a preocupação de que o compromisso de eliminação progressiva do carvão em 2030 não seja obrigatório - a palavra "idealmente" foi inserida no programa de governo - e que a data de eliminação progressiva do gás natural sinalize uma tentativa de transição do petróleo e do carvão para um novo "assassino fóssil".
O gás é controverso como fonte "mais limpa” que faria a ponte enquanto as fontes de energia verde, como a solar e a eólica, ainda estão se estabelecendo. Essa data de 2030, segundo o Fridays fro Future, viria dez anos tarde demais para a meta de manter o aquecimento global a 1,5 frente aos níveis pré-industriais.
"A coalizão quer construir novas usinas de gás e afirma que o gás é criticamente necessário para a transição", diz Deborah Ramalope, da Climate Analytics, uma instituição global de pesquisa da mudança climática. "Isso não é verdade e poderia levar à inércia e manutenção de combustíveis fósseis".
Ramalope, que é cientista ambientalista, também está preocupada com o fato de que a linguagem da eliminação progressiva do carvão seja demasiadamente vaga, em vez de "um compromisso concreto".
"Transformação profunda"
Ela acrescenta que a descarbonização do setor energético seria melhor servida por uma eliminação progressiva do carvão até 2029, de acordo com uma análise da Climate Analytics. Seu modelo também mostra que a Alemanha poderia aumentar sua participação de energias renováveis no mix energético para quase 90% até 2030, em vez de apenas 80%.
Segundo ela, uma meta de 65% de redução de emissões até 2030 abaixo dos níveis de 1990, por sua vez, "está próxima, mas não é compatível com 1,5 grau". Para isso, cerca de 70% seriam necessários.
Já uma meta de 65% de redução de emissões até 2030 abaixo dos níveis de 1990 "está próxima", explica Ramalope, "mas não compatível com 1,5C". Cerca de 70%, segundo ela, seriam necessários.
Para Charles Mooren, do instituto Ember, o compromisso de "idealmente" eliminar o carvão até 2030 foi "decepcionante", pois perdeu-se uma oportunidade de "enviar uma mensagem internacional mais forte sobre o carvão".
No entanto, os analistas dizem que as novas medidas climáticas, tanto em termos de carvão quanto de gás, são plenamente alcançáveis.
Ramalope diz que uma "transformação profunda" rumo a "uma economia energética limpa, dinâmica e resiliente, dominada por energias renováveis" está, em princípio, em andamento na Alemanha.
"Agora eles precisam entregar o que prometeram", comenta ela.