"Ninguém acreditava que os réus do mensalão seriam condenados à prisão"
13 de novembro de 2012O julgamento do mensalão é considerado um acontecimento histórico para o Brasil. Ao todo, 25 dos 37 acusados foram condenados. O coordenador do escritório brasileiro da fundação alemã Konrad Adenauer, ligada ao partido União Democrata Cristã (CDU), diz ter observado a satisfação dos brasileiros com a decisão do Supremo Tribunal Federal.
DW Brasil: Qual foi o impacto do julgamento e das condenações do mensalão na opinião pública?
Felix Dane: Ainda vai se falar muito sobre esse processo. Nós o acompanhamos com muita atenção, pois, sem dúvida, este foi um dos processos relacionados a escândalos de corrupção mais importantes da história do país. No início, nenhum brasileiro acreditava na condenação dos réus, ou pelo menos não acreditava que eles seriam condenados à prisão. Para os brasileiros, o resultado do julgamento foi fantástico, pois mostra que o aparelho jurídico não faz parte da corrupção, indica que medidas sérias estão sendo tomadas e, principalmente, que os políticos, ou melhor, os poderosos do país não são mais intocáveis. E isso é o que mais causou surpresa na população. Eu percebo isso quando converso, por exemplo, com motoristas de táxi ou vendedores de coco na praia. Essa decisão deverá modificar a política e a forma como a política tem sido feita no Brasil.
Qual é a postura da elite e da imprensa sobre esse julgamento?
Quando saíram os primeiros pareceres do julgamento, a revista Veja estampou sua capa com uma imagem de fogos de artifício. Essa foi uma maneira de parabenizar o Supremo Tribunal Federal e o sistema judiciário pela decisão que, segundo a revista, finalmente foi tomada. A Veja é uma revista influente e é lida por grande parte da elite econômica e intelectual. É claro que há opiniões controversas sobre essa decisão. Entretanto, a euforia é tão grande que ninguém tem coragem de dizer que não concorda com a decisão do Supremo.
Quais foram as particularidades do mensalão?
Um fator interessante é que Dirceu era assessor privado do presidente Lula, e tanto a imagem como a aceitação pública de Lula sofreram danos bem pequenos, apesar do escândalo. Além disso, o Partido dos Trabalhadores (PT) alcançou bons resultados nas eleições municipais deste ano. Esse fato mostra que o povo soube distinguir entre o escândalo e os benefícios alcançados durante a gestão do PT – que tirou cerca de 40 milhões de pessoas da pobreza através dos seus programas na última década, por exemplo. E por isso tanto a imagem do PT quanto do Lula não sofrem as consequências do mensalão, apesar da maioria dos envolvidos serem integrantes do PT.
Outro aspecto a ser destacado é que o sistema comandado por Dirceu não utilizava dinheiro privado para a corrupção, mas público. Esse é um fator muito importante, pois quando dinheiro privado é utilizado nesses esquemas, a situação se torna bem mais complicada.
Em que sentido?
Seria mais difícil identificar quem, quando e onde foi subornado. Esquemas de corrupção que utilizam dinheiro público são identificados mais facilmente, pois em algum momento isso aparece, e assim você consegue descobrir com quem esse dinheiro foi parar.
Há quem diga que o mensalão teve fatores positivos, já que o dinheiro foi utilizado para aprovar projetos sociais que beneficiariam a população. Por que o senhor acha que os brasileiros pensam dessa maneira?
Eu acho que não. A maioria da população sabe que o mensalão foi um esquema de corrupção, e as pessoas já estão cansadas de corrupção. Para a maioria da população e da imprensa é importante saber que o julgamento deste processo marca claramente uma ruptura quando se trata de corrupção em grande escala. O mais importante é saber quem foi condenado e se eles realmente irão para a cadeia.
Esse comportamento indica então um aumento da consciência política entre os brasileiros?
No Brasil ainda há submissão à elite, existem também muitas diferenças regionais. Entretanto, os brasileiros sabem que o Brasil é um país com muita corrupção e todos querem que isso seja diferente. Por outro lado, o "jeitinho" faz parte da rotina dos brasileiros, e, se você observar bem, esse "jeitinho" também é uma forma de corrupção. Nesse sentido, a questão é controversa. Ninguém quer corrupção nos níveis mais altos, mas quando se trata de si mesmo, parece não ter tanto problema. Mas o povo quer acabar com a corrupção, e talvez esse seja o primeiro passo para desenvolver essa consciência.
Autor: Jan D. Walter (cn)
Revisão: Francis França