Na Cisjordânia, aumenta violência de colonos israelenses
14 de novembro de 2023As últimas semanas foram extremamente difíceis, diz Halima Khalil Abu Eid. Mãe de duas meninas, ela vive em Khirbet Susiya, um vilarejo no sul das colinas de Hebron, na Cisjordânia sob ocupação israelense. Há um mês, enquanto a família dormia, colonos israelenses invadiram a casa, bateram no marido dela e os ameaçaram com um ultimato. "Vocês têm que sair daqui. Se não saírem, vamos atirar em vocês. E vocês têm que destruir sua casa", relata Abu Eid, repetindo as palavras que ouviu naquela noite.
Desde a eclosão do atual conflito entre Israel e Hamas, relata a mulher, colonos israelenses têm aumentado a pressão sobre os moradores de Khirbet Susiya. "Eles estão revistando, destruindo e nos aterrorizando. Da última vez, também atacaram meu marido e o cunhado dele." Uma das filhas está vomitando de tanto medo, diz.
Khirbet Susiya testemunhou anos de ameaças por parte de colonos que vivem em assentamentos e fazendas próximas dali. Mas desde 7 de outubro, a Cisjordânia assistiu a um aumento "significativo" de episódios de deslocamento forçado e violência contra palestinos por parte de colonos, segundo o Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários (ENUCAH).
Em 7 de outubro, membros do Hamas – um grupo radical islâmico considerado uma organização terrorista por União Europeia e Estados Unidos – invadiram território israelense, matando ao menos 1.200 pessoas que viviam em comunidades próximas à Faixa de Gaza, no sul de Israel – a maioria civis –, e sequestrando outras 240, que continuam em cativeiro.
Israel reagiu com intensos bombardeios a alvos em Gaza e, mais tarde, com o envio de tropas por terra, como parte de sua campanha militar que visa derrotar o Hamas. Enquanto isso, continua a ser alvo de foguetes vindos de Gaza, mas também do Líbano e da Síria.
Segundo o Ministério da Saúde de Gaza, território controlado pelo Hamas, a ação israelense no enclave sitiado resultou na morte de mais de 11 mil palestinos.
Violência na Cisjordânia
O conflito Israel-Hamas também afeta palestinos que vivem na Cisjordânia ocupada. Segundo o ENUCAH, 168 palestinos foram mortos por forças israelenses no território, e outros oito, por colonos israelenses. No lado israelense, três cidadãos foram mortos em ataques perpetrados por palestinos.
Outras 1.149 pessoas de 15 comunidades rurais e beduínas foram deslocadas pelo conflito, obrigadas a fazer as malas ou a demolir as próprias casas e currais, ainda de acordo com as Nações Unidas. Alguns sequer puderam levar seus pertences consigo.
Assim como aconteceu em Khirbet Susiya, grupos de direitos humanos documentaram alguns incidentes nos quais colonos armados invadiram vilarejos palestinos e ameaçaram os moradores se eles não saíssem.
Khirbet Susiya é uma pequena comunidade de famílias palestinas espalhadas pela paisagem montanhosa. A maioria são agricultores e vivem do plantio e da criação de ovelhas. A casa simples de Abud Eid, suas lonas e currais pareciam quase pacíficos no dia em que a DW esteve lá; um gato cochilava sob o sol do meio-dia enquanto as galinhas ciscavam à vontade. Mas a ameaça de violência paira sobre tudo, como uma nuvem carregada. E afeta a existência das pessoas.
"Para onde deveríamos ir? O que eles querem de nós? Querem pegar nossas casas, sabemos disso por causa do passado. Para onde mais podemos ir? Esta é a nossa casa, este é o nosso lar, não podemos deixá-lo", lamenta Abu Eid.
Danos à infraestrutura e ameaças
Os moradores de Khirbet Susiya agora têm que escalar barreiras de terra que bloqueiam entradas e passagens do vilarejo.
"Foi em 16 de outubro que colonos uniformizados e soldados vieram aqui, com um trator blindado, conduzido por um colono que nós conhecemos. Bloquearam todas as vias de acesso a Susiya, e também danificaram duas cisternas de água", relata Nasser Nawaj'ah, pesquisador do grupo de direitos humanos israelense B'Tselem e morador do vilarejo. Ele elenca ainda outra cisterna danificada e canos de água serrados.
Alguns moradores agora dependem da presença de ativistas israelenses, que vigiam o local por 24 horas. Mas até mesmo esses ativistas foram atacados em diversos locais e assediados por colonos, alguns deles em uniforme militar.
Yehuda Shaul é um ativista israelense que atualmente tem passado boa parte do seu tempo no sul das colinas de Hebron para ajudar os palestinos. Ele é cofundador da ONG israelense Breaking the Silence (Rompendo o Silêncio) e agora atua por outra organização, a Ofek.
"Durante anos os militares não agiram para proteger os palestinos, mas desde o 7 de outubro, quando a guerra começou, temos uma realidade onde as equipes de resposta rápida dos assentamentos – os colonos daqui – foram recrutadas como reservistas, e agora estão uniformizadas, armadas e totalmente equipadas, com a autoridade de soldados", explica Shaul. "Os palestinos, basicamente, não têm mais nada para protegê-los."
As Forças de Defesa de Israel (IDF) afirmaram que têm como missão "manter a segurança de todos os moradores da área", bem como "agir para prevenir terrorismo e atividades que ponham os cidadãos do Estado de Israel em perigo". "Em caso de violações da lei por israelenses, o principal órgão responsável por dar andamento a essas denúncias é a polícia israelense."
A instituição diz ainda que soldados na região têm se deparado com episódios de violência contra palestinos ou suas propriedades. "Nesses casos, pedimos a esses soldados que ajam para fazer cessar a violação e, se necessário, reter ou deter os suspeitos até a chegada da polícia. [...] Nas situações em que soldados deixam de cumprir as ordens das IDF, os incidentes são cuidadosamente revisados, e ações disciplinares são implementadas."
Ataques a palestinos na Cisjordânia ocupada
Foram registrados mais de 240 ataques de colonos israelenses a palestinos na Cisjordânia desde 7 de outubro, segundo o ENUCAH. O órgão das Nações Unidas fala em aumento significativo, com uma média atual de sete casos por dia, quatro a mais do que o registrado antes do atual conflito.
Esses ataques resultaram no deslocamento e remoção de comunidades inteiras, a maioria na "Área C", que corresponde a cerca de 60% da Cisjordânia ocupada. A "Área C" foi criada em 1995, na esteira dos Acordos de Oslo, com o intento de ser gradualmente transferida ao controle palestino, mas continua sob controle militar e administrativo israelense.
A violência na região preocupa líderes internacionais. "Isso tem que parar. Eles precisam ser responsabilizados. Tem que parar agora", afirmou o presidente americano, Joe Biden. Em visita recente, a ministra alemã do Exterior, Annalena Baerbock, advertiu que a Cisjordânia "não deve ser arrastada para esse redemoinho de violência".
Para o ativista israelense Shaul, a comunidade internacional precisa agir urgentemente para alcançar uma solução política para a situação."Você não vai conseguir criar um Estado palestino a partir de 165 enclaves desconectados um do outro por assentamentos e uma 'Área C' dominada por colonos", afirma. "Não há dois Estados [um palestino e outro judeu] sem a 'Área C' para os palestinos."
Para alguns palestinos, a ajuda chegou tarde demais. Salah Abu Awad é um pastor de uma outra comunidade próxima dali. Ele foi forçado a deixar sua casa e propriedade no dia 15 de outubro, após ataques constantes de colonos e ameaças contra o povo do vilarejo. "Eles vinham toda sexta e sábado, destruindo coisas, ameaçando a gente. Eu cansei, eu saí."
Abu Awad já se mudou diversas vezes por causa de intimidação e assédio. Agora, onde ele está, não há pasto para suas ovelhas ou cabras, e ele não sabe mais o que fazer. "Sou pastor. Sem minhas ovelhas, não sou nada. O que é que vou fazer?", questiona o jovem. "Ninguém se importa conosco."